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DOSSIÊ 13 DE MAIO | 13 de Maio e a luta contra a polícia e sua repressão às revoltas negras e operárias

A polícia, responsável por escandalosas chacinas como a de Jacarezinho, é um destacamento armado do Estado e assim como ele, não é neutra, serve para proteger a propriedade privada e reprimir quem possa ir contra ela. No Brasil, por todo o peso negro dos trabalhadores, essa instituição sempre teve como objetivo reprimir, encarcerar e matar negros e negras. Neste 13 de maio, em que gritamos por justiça e contra Bolsonaro, retomamos um histórico dessa instituição racista para mostrar que nossa luta por justiça deve ser uma luta sem nenhuma ilusão na possibilidade de reformar a polícia.

Renato ShakurEstudante de ciências sociais da UFPE e doutorando em história da UFF

quinta-feira 13 de maio de 2021 | Edição do dia

imagem de Victor Cubaia

A instituição policial no Brasil surgiu através da Intendência Geral da Polícia (1808) e a Guarda Real de Polícia (1809) que deveriam garantir a ordem escravista, caçar negros fugitivos, controlar o trabalho urbano e reprimir revoltas e quilombos. Garantir a ordem escravista foi sua principal atribuição, isto é, manter as coisas em seu devido lugar. Negros escravizados trabalhando nas lavouras e cidade, senhores de escravos enriquecendo com o tráfico, o Império português enriquecendo submetendo a colônia as suas ordens e, é claro, reprimir a todo custo a resistência negra, as revoltas e as possíveis revoluções.

O medo do Haiti não era apenas o fantasma que assombrava as elites escravistas no Brasil, também eram ideias que davam forma mais acabada ao desejo de liberdade de milhões de negros escravizados. Quilombos, greves, paralisações e revoltas eram tão comuns que as elites a todo momento intensificaram a repressão e o controle sobre os negros, sejam eles escravizados, libertos ou nascidos livres.

Ao longo do século XIX, fortemente atravessado por revoltas, a elite escravista e uma serie de deputados passaram a identificar os negros como as “classes perigosas” do Império. Forma racista e classista de identificar nos trabalhadores degenerações morais, propensos aos crimes onde as teorias raciais e higienistas utilizavam o racismo para justificar a repressão sobre os negros.

Se estabelecia assim a “suspeição generalizada”, com o argumento de que todo cidadão é suspeito de algo até que se prove o contrário, os negros foram alvos dessa política de controle e repressão. A polícia nesse período levou à frente a “repressão à ociosidade", com o intuito de não permitir que negros se encontrassem fora de seu tempo de trabalho para organizarem fugas para os quilombos. A ordem escravista ia se mantendo justamente pelo papel que a polícia cumpriu no controle dessas “classes perigosas” que não possuíam nenhuma degeneração moral, ao contrário, mesmo sob forte repressão lutaram até conquistar o fim da escravidão.

Relembrar o 13 de Maio, sobretudo frente à chacina do Jacarezinho também nos faz refletir sobre o papel da polícia não só durante a escravidão, mas também no pós-abolição. Ao longo do século XX, ela reprimiu sindicatos e o movimento negro. Nos documentos da polícia política dos anos 30 e durante a ditadura militar, também pôde-se ver a perseguição e repressão contra trabalhadores e militantes organizados. Mas não somente a eles. O Movimento Negro Unificado denunciava a violência policial agitando que “não precisava ser militante” para ser assassinado pelo regime, a repressão se estendia a toda população negra.

A repressão contra os negros nas favelas seguiu durante o período da chamada redemocratização. E nos governos do PT vimos as favelas serem ocupadas pelas UPP’s e pelo exército. Foi justamente em junho de 2013 que a juventude saiu às ruas contra os ajustes que o PT vinha fazendo e também contra a violência policial, com a juventude negra e periférica gritando bem alto “Cadê Amarildo”, o pedreiro negro que foi torturado, morto e desaparecido e se tornou um símbolo do que significava a repressão das UPP’s no RJ.

A farsa da “guerra às drogas” esteve presente durante os governos do PT, e se aprofundou com o golpe institucional de 2016 e suas medidas autoritárias e repressivas, e com o Bolsonaro e diante da crise capitalista chegou a uma nova escala de repressão e mortes, tendo a LSN como um pano de fundo para essa escalada autoritária. Com esse mentiroso discurso contra as drogas, legalizam operações como a do Jacarezinho e dizem que é “tudo bandido” como disseram Bolsonaro e Mourão saudando a polícia civil por ter feito um banho de sangue. Os demais setores do regime, como STF, Congresso e a Globo criticam os “excessos” das operações, mas é sobre esse mesmo discurso que legitimam e apoiam o massacre da polícia e que o judiciário mantém mais de 40% presos sem julgamento.

O Rio de Janeiro tem a expressão mais clara desse aumento da repressão, é impressionante que com Cláudio Castro, aliado de Bolsonaro, a violência policial dá um salto quando comparado a Witzel, o governador que dizia que ia “mirar na cabecinha” e já tinha feito até mesmo das escolas um alvo da polícia. Se comparado com os dois últimos meses do ano passado, houve um aumento de 161% no número de mortos pela polícia e 140% no número de feridos e já são 10 chacinas no Rio de Janeiro (recorde histórico), a enorme maioria pelas mãos da polícia.

São números que só nos mostra que se as vidas negras importam, é decisivo lutar contra essa instituição que é uma máquina de matar negros. Diferente do que alguns setores da esquerda, como o PSOL ou o PSTU ou até mesmo a “Coalizão negra por direitos” defende, a polícia é uma instituição que não se humaniza, e muito menos pode ser reformada ou controlada pela sociedade, pois quem controla ela é a burguesia e seus governos. Ela não apenas tem um caráter de classe, mas é profundamente racista no nosso país e em todos lugares onde os negros podem desafiar a ordem, como vemos nos Estados Unidos.

Mas se a polícia massacra os negros e trabalhadores ainda mais nos momentos de crise econômica é porque a burguesia sabe que as revoltas negras e as lutas dos trabalhadores também marcam a história desse país e é nela que buscamos nos apoiar no 13 de maio: quilombo dos Palmares, Conjuração Baiana, Revolta dos Malês, Balaiada, Revolta da Chibata, quantas e quantas insurreições, greves, quilombos. Os negros e trabalhadores do nosso país sempre lutaram e se rebelaram, e é com essa mobilização dos trabalhadores unificados com os negros, a única maneira de que o nosso grito por justiça possa virar realidade.

As lições do Black Lives Matter com a luta por Justiça a George Floyd devem ser tomadas também pelos que estão indo às ruas neste 13 de maio para dizer que basta morrer vítimas das balas das polícias, da fome, do desemprego e da covid. As mobilizações americanas abriram debates profundos sobre a polícia e a necessidade de sua abolição, além disso só foi através dela que foi possível conquistar a punição a Derek Chauvin, já que pela justiça americana e o Partido Democrata isso nunca seria possível.

Hoje, frente a uma das maiores chacinas do nosso país, é preciso retomar o sentido que o 13 de maio deve ter para nós, o de resgatar a enorme força negra e trabalhadora para exigir justiça pelas 28 vítimas do Jacarezinho e enfrentar Bolsonaro, Mourão e todo esse regime golpista que tem as mãos sujas de sangue, exigindo o fim das operações policiais nas favelas.

Neste 13 de maio, que nosso grito de justiça possa sacudir a paralisia das centrais sindicais brasileiras, como as que são dirigidas pelo PT e PCdoB, e possa assim exigir que mobilizem a nossa classe para impor uma investigação independente, com a participação de movimentos sociais, familiares, e sindicatos, porque não confiamos na polícia que sempre atuou para sufocar as revoltas negras e operárias. Também que possa a punição as policiais envolvidos, já que as chacinas significam impunidade. E com essa força avançar para que a luta pela abolição, e não pela ilusão de reforma, seja uma luta de toda a classe trabalhadora no seu enfrentamento ao Estado capitalista.




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