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"A perspectiva comunista nunca foi tão atual e realista", Daniela Cobet durante o encontro do Revolução Permanente na França

Daniela Cobet

"A perspectiva comunista nunca foi tão atual e realista", Daniela Cobet durante o encontro do Revolução Permanente na França

Daniela Cobet

No dia 6 de março, Daniela Cobet, membro da direção do Revolução Permanente (RP) na França, parte da mesma rede internacional do Esquerda Diário e organização irmã do Movimento Revolucionário de Trabalhadores (MRT) no Brasil, discutiu a atualidade da revolução diante das tendências militaristas e a importância de defender o comunismo como projeto de sociedade. Confira a transcrição de sua intervenção a seguir.

"Recolocar a revolução na ordem do dia." Se tantos de vocês responderam ao chamado para um encontro com este título, é porque, em princípio, vocês estão convencidos de que o mundo em que vivemos está longe de ser ideal.

O retorno da perspectiva da guerra

Ao quadro já sombrio de crises econômicas repetidas, de uma crise climática que ameaça a própria existência do planeta e da ascensão de forças reacionárias em todo o mundo, adiciona-se nos últimos tempos uma perspectiva que se pensava afastada há décadas: a da guerra.

Em primeiro lugar, porque estamos testemunhando em Gaza um verdadeiro genocídio, diante do qual não podemos gritar o suficiente: Palestina viverá, Palestina vencerá! Mas também porque nos últimos dois anos a invasão russa na Ucrânia trouxe a guerra de volta ao coração da Europa e mostra a cada dia que não se trata de um conflito como os outros, mas sim marca a abertura de uma nova etapa. Uma etapa na qual, com o enfraquecimento dos Estados Unidos como "polícia do mundo", os conflitos armados locais ou regionais devem se multiplicar, acarretando consequências cada vez mais graves.

É por isso que quando Macron persiste e insiste em sua retórica sobre o envio de tropas à Ucrânia, não devemos ver apenas irresponsabilidade. Nem devemos nos tranquilizar muito rapidamente com as distâncias tomadas por seus homólogos europeus. Se você precisa se convencer disso, do outro lado do Canal, o ministro britânico da Defesa, presumivelmente alguém que entende um pouco do assunto, declarou recentemente que não vivemos mais "em um mundo pós-guerra", mas "em um mundo pré-guerra".

Esse tipo de declaração ecoa em outros momentos da história. No início do século XX, diante da chegada da Primeira Guerra Mundial, Lênin, o revolucionário russo cujo centenário de morte comemoramos este ano, explicou que uma nova era do capitalismo se abria, caracterizada pela recorrência de crises, guerras e revoluções. Mais de um século depois, essa perspectiva histórica se atualiza hoje.

No entanto, ainda não estamos às portas de uma Terceira Guerra Mundial, mas é importante compreender que o imperialismo carrega em si o germe da guerra. Se o período da globalização permitiu algum alívio desde os anos 1970, isso agora atinge seus limites. E diante desse retorno do espectro da guerra, as soluções da ONU nos parecem amplamente insuficientes.

O caminho para a guerra não é inevitável

Mas também não é inelutável. Ele encontra um obstáculo resistente na consciência das jovens gerações, às vezes chamadas de "geração Z", amplamente representadas nesta sala. Os mesmos que nos últimos anos não deixaram de lembrar aos capitalistas sua responsabilidade na destruição do planeta e, portanto, em seu próprio futuro, os mesmos que se solidarizaram em massa com o povo palestino de Londres a Nova York, esses jovens não parecem hoje entusiasmados com a ideia de ir para o front em nome dos supostos "interesses da pátria".

Esta é uma preocupação para especialistas em questões militares, à medida que o mundo se prepara novamente para a guerra. Assim, dois especialistas do Instituto Naval Americano tentam se tranquilizar, dizendo que "os jovens soldados e os recrutas em potencial não sabem o que é a competição entre grandes potências. A geração Z pode lutar e o fará. Mas primeiro ela precisa entender por quê.”

O que queremos, precisamente, é o oposto: que essas jovens gerações entendam que a luta entre potências imperialistas não é a delas e que a única causa pela qual realmente vale a pena lutar é a de uma revolução que acabe com toda forma de exploração, opressão e destruição ambiental!

No entanto, a questão da guerra não diz respeito apenas aos jovens, longe disso. Em uma entrevista recente, um ex-ministro das Relações Exteriores defendia a ideia da entrada da França em uma "economia de guerra", especificando que se trata de nos fazer trabalhar mais para produzir mais, especialmente mais armamentos, para alimentar sua máquina assassina. E você sabe o que ele cita como obstáculo para esse objetivo? O movimento contra a reforma das aposentadorias! Eis um resumo de sua economia de guerra: mais exploração e menos direitos e liberdades para os trabalhadores e a juventude.

Mas é preciso admitir que, em um ponto, esse ex-ministro tem razão: o melhor obstáculo para a corrida rumo à guerra é a luta de classes, é a união entre os trabalhadores e a juventude contra o capitalismo! Pois uma coisa é certa: quando os burgueses têm medo da revolução, eles pensam duas vezes antes de ir para a guerra, especialmente quando isso implica armar uma parte significativa da população.

A atualidade da revolução

É verdade que, se voltarmos à fórmula de Lênin sobre a era imperialista, recentemente temos lidado mais com crises e guerras do que com revoluções. E os "intelectuais" a serviço da ordem dominante gostariam que isso não mudasse. Quando eles atacam Lênin, cem anos após sua morte, retratando-o como um ditador sanguinário, é a própria ideia da revolução que eles visam. Eles gostariam que nunca mais alguém acreditasse, como os bolcheviques acreditaram em 1917, que a vitória era possível, que os explorados e oprimidos poderiam derrubar tudo. E hoje, quando nunca foi tão urgente derrubar tudo, só podemos nos alegrar ao constatar, pela multidão neste encontro, que eles não conseguiram apagar completamente a ideia da revolução.

Mas Lênin não é apenas um símbolo da revolução; seu pensamento é a encarnação de uma bússola estratégica que provou seu valor na história e ainda tem muito a nos ensinar hoje. Diante da grande provação da guerra de 1914, por exemplo, o que o tornou singular, juntamente com outros revolucionários, foi sua oposição intransigente à guerra imperialista. Para isso, Lênin avançou a ideia, muito atual, de que diante das ameaças de guerra entre potências imperialistas, nosso principal inimigo está bem aqui. São os Bernard Arnault, os Bolloré, os Blandinière, o patrão da InVivo que está tentando demitir nosso camarada Christian, e é claro que também são os Macron e os Le Pen.

Isso significa hoje, por exemplo, no contexto das próximas eleições europeias, não cair na armadilha dos discursos soberanistas, como parte da esquerda faz. Em um mundo e uma Europa liderados pelos capitalistas, seja qual for sua nacionalidade, os trabalhadores nunca serão soberanos. Sua soberania só pode ser uma soberania de classe, e certamente não será com a família Peugeot, nem com Serge Dassault, mas sim com os proletários de todos os países, como diz uma canção da América Latina: "a classe trabalhadora é uma e sem fronteiras!"

Lukács, filósofo e militante húngaro, argumenta no excelente livro recentemente publicado pelas edições Communard.e.s que a força de Lênin também foi sempre considerar, apesar dos altos e baixos da luta de classes, que a revolução era uma perspectiva profundamente atual. Que era uma questão deles, e que o curso da história poderia ser alterado pelos trabalhadores, desde que se preparassem seriamente para isso. É com essa bússola que ele pacientemente forjou, inclusive nos períodos de pior reação, o partido e os militantes capazes de liderar o ataque ao céu realizado pelas massas russas em outubro de 1917.

No entanto, hoje é evidente que o século XX passou por aqui e deixou suas marcas. Para ilustrar, eu diria que, apesar das muitas reações positivas a este encontro nas redes sociais, ainda assim não escapamos de comentários do tipo "vão para o gulag" e outras referências ao stalinismo.

O fato de a primeira revolução operária e socialista vitoriosa ter permanecido isolada e depois ter degenerado em um regime burocrático foi por muito tempo o argumento central de todos os defensores do capitalismo como único horizonte possível. Isso por muito tempo serviu para invalidar a própria ideia da revolução, fazendo crer que todo processo desse tipo estava condenado de antemão a resultar em regimes ditos totalitários.

O desafio de atualizar a perspectiva comunista

Por isso, mesmo que tenhamos testemunhado nos últimos anos um ressurgimento da luta de classes, torna-se cada vez mais crucial reabilitar o projeto de uma sociedade comunista que tem muito pouco a ver com o que foi chamado de "socialismo real". Porque na ausência de um projeto emancipador, de um imaginário comunista, seremos infelizmente condenados a reproduzir continuamente o padrão em que a raiva das classes populares acaba sendo capitalizada no campo político por forças de extrema direita.

Ou então, se amanhã a relação de forças mudar, nos encontraremos sob novos governos chamados "de esquerda", mas que, à semelhança das experiências do Front Populaire nos anos 1930, desempenham o papel de conter a raiva, a preço de algumas concessões, para que não transborde dos limites do sistema capitalista.

No entanto, as coordenadas atuais não apenas permitem atualizar a perspectiva da revolução, mas também a do comunismo. Gostaria de tentar demonstrar isso com três ideias, que longe de serem uma ideologia ultrapassada pelas transformações do último século, a perspectiva comunista nunca foi tão atual e realista. Essas três ideias correspondem a três pilares importantes de uma sociedade comunista futura: a redução maciça da jornada de trabalho, a democracia operária e o planejamento da economia.

Por um lado, o desenvolvimento da indústria, da robótica e da inteligência artificial, se estiver ao serviço do bem comum e não dos lucros, permitiria hoje a completa eliminação do desemprego e uma redução maciça da jornada de trabalho, a um nível que não tem nada a ver com o da Rússia semi-feudal de 1917. Todo o tempo livre restante poderia então ser usado para outras atividades, sociais, esportivas, culturais, artísticas... Porque estamos cansados de perder nossas vidas para ganhá-las!

Por outro lado, a internet e as novas tecnologias de comunicação, que já mostraram sua utilidade para a organização de algumas mobilizações, poderiam ser utilizadas para formas de democracia direta, inspiradas nos conselhos ou sovietes que foram a base do poder revolucionário nos primeiros anos da revolução russa. Um sistema em que cada trabalhador pode participar das decisões que dizem respeito ao funcionamento da sociedade como um todo.

Finalmente, os métodos desenvolvidos por grandes multinacionais para gerenciar enormes fluxos logísticos e comerciais, se colocados a serviço de uma lógica não mercantil, também permitiriam um planejamento econômico democrático e mais eficiente, levando em consideração as restrições ambientais, mas também as necessidades e preferências dos cidadãos. Se hoje o Google ou a Amazon coletam nossos dados para nos segmentar com seus anúncios, amanhã esses recursos poderiam ser usados para um planejamento racional e democrático da economia, quase em tempo real, que permita o acesso a uma grande variedade de bens e serviços, muito longe da imagem do planejamento burocrático na URSS.

Porque não, ao contrário do mito liberal, o comunismo não é a supressão da individualidade de cada um, mas a possibilidade de desenvolver plenamente sua individualidade, em harmonia com a natureza e com a coletividade!

Ao mesmo tempo, como disse Marx, o comunismo não é apenas a sociedade futura pela qual lutamos, mas também é o movimento real que abole o capitalismo. E para que esse movimento se concretize, estamos convencidos, com Lênin, de que ele deve se encarnar em uma força política, em um partido, não no sentido dos partidos tradicionais, mas no sentido de um coletivo de militantes compartilhando um projeto emancipatório e uma estratégia, e determinados a pesar com todo seu peso para oferecer um futuro à humanidade que não seja o de novas carnificinas mundiais.

Um partido que considera que o fracasso das primeiras experiências revolucionárias não invalida toda perspectiva de emancipação e não nos condena a assistir passivamente à destruição do mundo pelos capitalistas. Uma organização de militantes conscientes que aprendem com as derrotas do passado e que consideram, cem anos após a morte de Lênin, que a revolução e a luta pelo comunismo são uma questão atual, são nossa questão. É a esse projeto, o projeto de um leninismo 2.0, que convidamos vocês a se juntarem ao lado da Revolução Permanente.


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