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USP | "Chego atrasada e fico com fome": estudantes trabalhadores são prejudicados por horário novo na USP

“Chego na aula sempre com algum atraso e fico com fome”: essa é a realidade que centenas de estudantes da USP têm relatado pelo fato de alguns cursos terem adiantado o início das aulas do noturno para às 19 horas sem consultar os estudantes. Nas mais de 100 denúncias recebidas pelo nosso jornal, alunes também relatam dificuldades com as enormes filas dos restaurantes universitários e dos ônibus circulares. É preciso organizar a luta contra essa medida autoritária a partir de assembleias nos cursos.

domingo 10 de março | 22:55

Estudantes da USP de diversos cursos, em especial da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), têm relatado inúmeras dificuldades com o novo horário de aulas do noturno imposto pela reitoria e diretorias das unidades sem nenhuma consulta aos estudantes.

“Entrei na USP esse ano, através do Provão Paulista e fiquei muito mais que feliz quando fui aprovada (...). Como chego beirando às 19h00, não consigo jantar e, no momento, não tenho condições de comprar algum lanche entre uma aula e outra. Resumindo, fico com fome até mais ou menos 00:30 que é a hora que chego em casa geralmente. (...) Às vezes, repenso se fiz a melhor escolha, se realmente vai valer a pena (...). Pelo menos no meu caso, esses 30 minutos fazem toda a diferença.”, diz G. V., estudante do curso de Letras.

As aulas, que antes iniciavam às 19h30, neste semestre passaram a iniciar às 19 horas. O novo horário tem afetado em especial alunes que trabalham e que dependem de medidas de permanência estudantil, como os restaurantes universitários. Diversos relatos apontam também que as filas para os restaurantes estão enormes, fruto da falta de contratação de funcionários e da terceirização que precariza esses serviços.

“Infelizmente mais um obstáculo para a permanência do pobre dentro da USP, nós que trabalhamos estamos tendo extrema dificuldade de chegar na aula no horário certo e, para chegar, estamos sacrificando uma necessidade básica: nossa alimentação.”, afirma L., estudante do curso de História.

A alteração piora a situação de estudantes que já precisam se submeter a um ou mais trabalhos para complementar renda de estágios e empregos que estão cada vez mais mal remunerados, além do fato de que a reitoria não tem fornecido moradia estudantil digna e bolsas para toda a demanda de estudantes de baixa renda e beneficiados com a política de cotas que necessitam dessas medidas.

“Eu faço estágio até as 16h. Vendo doces na faculdade para complementar a renda (...). O tempo que eu levo pra sair do estágio, chegar em casa, pegar os doces, e ir pra faculdade (principalmente com o circular lento e poucos) já dá o horário das 19 horas que eu devo estar na aula, junto com os meus colegas e clientes.”, relata B., estudante do curso de Letras.

Tudo isso se soma a um incômodo generalizado sobre a situação dos ônibus circulares (que circulam na USP saindo do metrô Butantã), que são o principal meio de acesso à universidade que, por uma medida elitista, é toda rodeada de muros e conta com poucas linhas de transporte. “Os ônibus para a USP só passam de 40 em 40 minutos, de forma que para chegar às 19h, eu precisaria pegar o ônibus das 18h20”, afirma A., estudante do curso de História.

A alegação das diretorias de ensino que acataram a medida era de que o adiantamento de horário serviria para equiparar a carga horária dos cursos matutino/vespertino com os do noturno, algo que é bastante complexo por conta das diferentes realidades. Alguns afirmam que o novo horário serviria também para que os estudantes pudessem ser liberados mais cedo (às 22h30 em vez das 23 horas). Nos depoimentos recebidos, porém, estudantes têm desmentido essa questão, afirmando que a maioria dos professores já costumava liberar os alunos antes das 23 horas, e que, mesmo depois da medida, os professores que não cumpriam com isso anteriormente seguem segurando os alunos em aula até mais tarde.

(...) É inviável a tentativa de implementação da carga horária do matutino num curso do noturno, não bate! Além de questões óbvias, como horário e deslocamento, a realidade des alunes do noturno não são as mesmas do matutino. Desconsiderar isso é inviabilizar qualquer chance de vida acadêmica para nós. Estudar na USP não é melhor que sonhar?, aponta L., estudante do curso de Letras, referindo-se à atual campanha veiculada pela reitoria durante a recepção de calouros, que dizia que “Estudar na USP é melhor que sonhar”.

A resolução foi tomada pela reitoria e Unidades de Ensino sem nenhum diálogo nem com o conjunto dos estudantes, nem com os professores. “Nem os professores estão entendendo esse novo horário, meus quatro professores já expressaram isso abertamente em aula”, afirma estudante de Letras. Além disso, diversos ingressantes se matricularam na universidade sem ter conhecimento do novo horário e agora encontram dificuldades para permanecer. “Tem sido angustiante e eu só entrei na universidade porque o horário era possível (...). Não sei se aguento até o fim do curso”., afirma um calouro do curso de Letras.

A reitoria recorrentemente mostra seu descaso pelos trabalhadores da universidade, em especial os trabalhadores terceirizados que recebem menores salários e direitos, conforme tem denunciado o manifesto contra a terceirização e precarização do trabalho. Agora, mostra esse descaso também com os estudantes trabalhadores com essa medida. Além de tudo, a mudança também prejudica as atividades extracurriculares dos alunos que ocorriam no período “entre aulas”, como atividades atléticas ou grupos de estudos, além de prejudicar a organização do movimento estudantil que costumava fazer reuniões e assembleias das 18 horas às 19h30.

“Claramente essa medida foi tomada por quem não pega um ônibus pra chegar a universidade e nem precisa do bandejão pra se alimentar.”, aponta um estudante de Filosofia. Do alto de seu palacete, a reitoria, o Conselho Universitário e os diretores de Unidade decidem um horário para uma realidade que não vivenciam, afinal não pegam circular e não comem no bandejão. As decisões da universidade são sempre tomadas por uma cúpula de burocratas que desconhecem a realidade da USP, por isso a reivindicação do movimento estudantil, de trabalhadores e professores precisa ser para que a estrutura de poder da universidade não seja mais gerida por estes, mas sim pelos 3 setores da universidade (alunes, professores e trabalhadores).

Nós do Esquerda Diário e da Faísca Revolucionária nos colocamos à disposição dos estudantes para seguir ajudando a organizar a luta contra essa medida, por mais políticas de permanência estudantil, contra a precarização dos trabalhadores, dos bandejões e dos circulares, além de pautas que foram levantadas na última greve que precisam ser levadas até o final. Chamamos os centros acadêmicos e o Diretório Central dos Estudantes (DCE) a se posicionarem contrários a essa medida e fazerem assembleias de estudantes para pautarmos como nos organizarmos sobre essa situação.




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