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EDITORIAL | Crise de Manaus: lutemos pela reestruturação da economia sob controle dos trabalhadores

Diana AssunçãoSão Paulo | @dianaassuncaoED

André Barbieri São Paulo | @AcierAndy

segunda-feira 1º de fevereiro de 2021 | Edição do dia

Foto: MICHAEL DANTAS / AFP

Neste início de fevereiro ocorrerão as votações para presidência da Câmara dos Deputados e do Senado que darão o tom da distribuição de forças entre Bolsonaro e a "oposição" golpista no poder legislativo. Por trás dessa disputa, está também o debate sobre a abertura de impeachment de Bolsonaro e a expectativa especialmente de que o candidato do MDB à presidência da Câmara Baleia Rossi possa levar adiante essa empreitada. Não é a toa, inclusive, que a Frente Brasil Popular e a Frente Povo Sem Medo organizara um dia de luta nacional justamente diante dessa votação como forma de pressão pelo impeachment, subordinando os trabalhadores a objetivos como eleger Baleia Rossi. O PT, entretanto, vai além em sua posição no Senado apoiando diretamente o candidato bolsonarista. Essa disputa pela administração das instituições políticas são a maior expressão do que continua sendo o regime do golpe institucional e da impossibilidade de enfrentar Bolsonaro sem enfrentar todos os setores golpistas que hoje tentam conter o descontentamento dos trabalhadores e da população diante da pandemia e do desemprego.

Regime do golpe este que, como viemos dizendo no Esquerda Diário, recebe inspiração (e instruções) diretas do Partido Democrata e da nova administração Biden. Vendo Bolsonaro debilitado pela derrota de Trump, a imprensa oficial e as figuras principais do golpismo institucional ordenam esforços para seguir desgastando o governo e, ao mesmo tempo, continuar e aprofundar a agenda de ajustes econômicos draconianos exigidos pelo imperialismo. Nisso, bolsonaristas (Arthur Lira, Rodrigo Pacheco) e agentes golpistas do Congresso (como Baleia Rossi, Maia etc), STF, etc estão em pleno acordo.

Quão vergonhosa é, portanto, a discussão interna no PSOL, que em suas alas disputantes (o MES de Sâmia Bonfim, de um lado, e a corrente majoritária de Ivan Valente e Juliano Medeiros, de outro), diverge apenas em quando apoiar Baleia Rossi na Câmara, se no primeiro ou segundo turno?

É neste momento político que Manaus, no Amazonas, continua sendo a expressão mais chocante da calamidade e consequências do regime do golpe institucional e do governo Bolsonaro em meio a pandemia. O dinheiro do governo federal destinado a Manaus para combater a crise sanitária não acompanhou o mesmo ritmo do avanço de casos e mortes. A cidade de Manaus foi a quinta capital brasileira no índice de letalidade pela doença em 2020, mas a 26ª no repasse de recursos proporcionais ao tamanho da população, colocando o sistema de saúde de Manaus em colapso rapidamente e instalando a crise de falta de oxigênio que teve consequências catastróficas para a região inclusive com a possibilidade de morte de 60 bebês prematuros.

Quando o número de mortes aumentou brutalmente na cidade e os pacientes começaram a morrer por falta de oxigênio, o presidente Jair Bolsonaro argumentou que o governo federal fez tudo o que podia em relação a recursos financeiros e apoio ainda que também chegou a dizer que não podia fazer nada. Também publicou uma imagem em suas redes sociais dizendo que repassou quase 9 bilhões de reais para o Estado do Amazonas e seus municípios, mas esse número representa todas as transferências da União, e não apenas os recursos destinados para o combate à covid-19. Algumas horas atrás declarou que a situação de Manaus não é responsabilidade do governo federal.

Enquanto isso, o Ministro da Saúde Eduardo Pazuello declarou que terá como prioridade desafogar o sistema de saúde do Amazonas com a transferência de pacientes para outras localidades mostrando a falência total das chamadas "autoridades" para resolver a situação em Manaus e região. O que ocorre aí é a consequência de um plano de ajustes duríssimo contra os trabalhadores e a população pobre que, como viemos denunciando no Esquerda Diário é responsabilidade não somente do governo Bolsonaro, e dos responsáveis diretos como o governador Wilson Lima (PSC) e o prefeito da capital David Almeida (Avante), mas também de todos os setores que foram parte de levar adiante o golpe institucional que tinha como objetivo fazer ataques mais duros do que o PT vinha fazendo. Esses setores tem nome: Rodrigo Maia e o Congresso Nacional, STF, governadores como João Doria e tantos outros. Por isso, a saída para os trabalhadores não pode ser ir a reboque desses setores como muitas vezes quer o próprio PSOL.

Por tudo isso viemos defendendo a necessidade de um enfrentamento muito maior a esse regime do golpe que não caia na fantasia do impeachment que tiraria Bolsonaro pra colocar em seu lugar o General Mourão. É preciso lutar por Fora Bolsonaro e Mourão e por uma nova Constituinte, livre e soberana, para enfrentar todas as instituições do golpe institucional algo que o PT nunca se dispôs a fazer. Isso só se dará em base a mobilização das massas, e especialmente dos trabalhadores, exigindo que as centrais sindicais parem de paralisia, parem de fazer reuniões de cúpula com dirigentes sem mobilizar na base e construam de fato uma mobilização para enfrentar todos os ataques pois é necessária a unidade mais ampla da classe trabalhadora sem nossos inimigos de classe, para dar uma resposta à crise econômica, sanitária e política desde um ponto de vista dos explorados. Por isso é urgente a realização de assembleias, reuniões de base e coordenações das lutas com um programa claro de enfrentamento a Bolsonaro e esse regime do golpe, e que coloque na ordem do dia a luta pelo fim das patentes e vacina para todos com urgência especial para Manaus. Mas que também lute contra todas as demissões e ataques, como na Ford com o fechamento das fábricas que colocarão milhares de famílias nas ruas. A única forma de dar uma resposta para a crise é colocando em movimento o sujeito que é a classe trabalhadora, de forma independente de todas as alas do regime golpista e impondo a frente única às direções dos sindicatos. A luta vitoriosa das terceirizadas da Faculdade de Odontologia da USP que barraram as demissões é um exemplo nesse sentido, bem como a paralisação do Banco do Brasil na sexta e a que começou hoje no Hospital Universitário da USP em defesa de vacina para todos que trabalham no hospital de forma emergencial, o que é um mínimo que o demagogo João Doria que se diz pela vida não garante. Inclusive, ele junto com Bruno Covas abrem as escolas sem qualquer plano sério de precaução contra o covid-19, que só poderia vir de protocolos elaborados e controlados pelos professores em conjunto com a comunidade escolar, em conjunto com os profissionais de saúde de cada região. Sem isso, essas aberturas vão significar uma expansão ainda maior da pandemia e aumentar o risco de a crise de Manaus de hoje expressar o que será a crise do país amanhã.

A esquerda precisa urgente parar de alimentar ilusões em saídas parlamentares e se aliando com golpistas como Baleia Rossi, como se isso pudesse dar qualquer saída para a crise. O PSOL, através de suas figuras parlamentares e Guilherme Boulos, bem como os sindicatos dirigidos pela esquerda, deveriam colocar seu peso em exigir das grandes centrais sindicais um plano de luta em resposta emergencial à Manaus, como parte de uma resposta global à crise econômica, sanitária e política. Sem isso, acontecerão movimentações dispersas em cada categoria e se abre espaço inclusive para setores patronais ou de direita desviarem a insatisfação que cresce na base de trabalhadores, da pequena burguesia e diversos setores populares, como se expressa num setor de caminhoneiros que levanta “Fora Doria, abertura Já”, e não a demanda progressista de redução do conjunto dos combustíveis que outras alas levantam e poderia ser parte de uma resposta operária e popular para a crise. O mesmo ocorre hoje na paralisação de ônibus no RJ, onde um setor da patronal tenta desviar a genuína luta contra o atraso de salários dos trabalhadores para uma paralisação com elementos de lockout patronal contra o governo.

Neste sentido frente a calamidade da situação em Manaus e a política destrutiva do governo Bolsonaro estamos diante de uma situação dramática: são eles ou nós. Enquanto os capitalistas seguem lucrando em meio a pandemia, enquanto escândalos como dos gastos com alimentação no Congresso Nacional vem a tona a população de Manaus se asfixia. É tarefa da classe trabalhadora se levantar contra essa barbárie. Em meio a organização da nossa luta contra todos os ataques lutemos para levantar a defesa de nossos irmãos e irmãs de classe em Manaus, de toda a população pobre que sofre as consequências da política desses governos e demonstremos que se fossem os trabalhadores que gerissem toda a economia da região as vidas ceifadas em Manaus teriam sobrevivido porque os trabalhadores controlando a economia iriam garantir os recursos e insumos necessários para enfrentar essa situação.

Que a disponibilização da vacina no Brasil tenha prioridade para Manaus e que seja com plano científico controlado pelos trabalhadores da saúde. Contratação imediata de mais trabalhadores da saúde com todas as condições de trabalho. Que toda empresa que demitir seja punida e que a empresa que fechar seja ocupada e colocada sob gestão operária produzindo os insumos necessários para enfrentar a crise. Que todo o plano de transferência de oxigênio para Manaus esteja coordenado pelos próprios trabalhadores. Confisco dos bens de todos os milionários em Manaus, como o empresário que escondeu 33 cilindros de oxigênio e que sejam revertidos imediatamente para a resolução da crise. Anulação imediata da emenda constitucional do teto de gastos. Retorno do auxílio emergencial para toda a região. Com essas medidas, controladas pelos trabalhadores, poderíamos demonstrar que a política catastrófica do governo federal e as consequências do golpe institucional precisam ser enfrentadas, também, em um sentido anticapitalista de enfrentamento com os lucros e esse sistema que somente nos relega miséria e desastres para a nossa classe. É nessa perspectiva que o Esquerda Diário e o MRT se colocam.

Essa posição no Brasil é inseparável da nossa concepção do internacionalismo marxista durante a pandemia. Como dizemos em nossa declaração internacional da Fração Trotskista, sobre a vacina e a crise mundial: "A luta por vacinas para todos e pela liberação de patentes é levantada como uma necessidade urgente em face da catástrofe da pandemia. Da mesma forma, é necessária a imediata intervenção estatal de todas as empresas farmacêuticas e laboratórios, para colocá-los sob o controle dos profissionais de saúde e servir a planos racionais de produção e distribuição de vacinas e testes, com vistas à nacionalização dessas empresas sob controle operário, junto com os recursos da saúde privada. [...] Perante o aumento das tendências nacionalistas reacionárias por parte dos Estados imperialistas e face à especulação brutal das multinacionais, desde a nossa perspectiva de luta internacionalista, anticapitalista e anti-imperialista, convocamos todas as organizações que se reivindicam defensoras da classe trabalhadora ou dos interesses populares, para impulsionar medidas urgentes de luta em comum, partindo da reivindicação da extinção de patentes e garantindo vacinas e outros medicamentos, equipamentos e recursos necessários ao combate à pandemia. Não há tempo a perder. Nossas vidas valem mais do que seus lucros."




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