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OPINIÃO | Crise que não tem fim. 5 questões para entender (e intervir) na crise nacional

Em meio à sequência interminável de eventos da crise política nacional que se desenvolve e interage com importante crise econômica que vai ganhando crescentes contornos sociais é fácil se perder. Temer cai ou não? Profunda crise institucional do parlamento com o judiciário. Crise dentro do STF, denúncias, escândalos, gravações, ataque a previdência, à saúde, educação, manifestações....

Leandro LanfrediRio de Janeiro | @leandrolanfrdi

terça-feira 6 de dezembro de 2016 | Edição do dia

Nesse breve artigo, correndo o risco da simplificação, apontamos breves questões para olhar o bosque detrás das muitas árvores dessa crise chamada Brasil. A complexa crise brasileira é também parte de todo um cenário internacional que pode convulsiona-la mais, ou por outro lado, atenuar seus desenvolvimentos. É mais provável com a eleição de Trump e outras instabilidades internacionais que o cenário internacional siga atuando como desestabilizador, e não abordaremos essa interação nessa análise dos contornos principais da crise, seus atores e como é possível (e necessária) uma política independente.

1- A Lava Jato avança no rumo “Mãos Limpas”

Antes do golpe institucional a Lava Jato atuou em uma particular combinação de seletividade de alvos, arbitrariedade e avanços nos métodos repressivos, mas como parte de uma “frente” que envolvia também as principais alas do PMDB, o PSDB, a mídia a FIESP, e como se vê por informações do Departamento de Estado Americano, também de interesses imperialistas. Dentro do judiciário, com algumas vozes dissonantes uma vez ou outra, havia um relativo consenso na atuação de Moro e Companhia.

Consumado o impeachment essa frente se desfez. Se desde antes já havia elementos que apontavam a possibilidade de avançar a uma “Mãos Limpas”, ou seja, voltar-se contra mais partidos do regime para promover uma “renovação” que seja funcional a promover os ajustes e ataques que o empresariado e imperialismo desejam, isso implicaria em maior ou menor grau em longos anos de embate entre judiciário e a “casta política” e maior ou menor grau da combinação de milhares de condenações e quase nenhuma prisão, eventos que ocorreram na Itália da “Mãos Limpas” até a estabilização sob o mafioso Berlusconi e já em um cenário de alinhamento neoliberal e pró-União Europeia.

Para um avanço deste tipo a Lava Jato precisava ter uma política própria. Sinais que vimos em seu ativismo pelas Dez Medias contra a Corrupção que lhe dariam superpoderes arbitrários e repressivos e avançar para atacar mais partidos do regime. A delação da Odebrecht lhe dá, seguramente, munição para isso, os avanços sobre o PMDB também dão indícios disso, bem como seu apelo a opinião pública contra os políticos. Avançaria a Lava Jato também contra Temer a quem não faltam menções na operação, se o presidente não for o melhor condutor para os ajustes ele também entraria na linha de tiro?

Essa ação independente chacoalhou ainda mais o regime político, abrindo fissuras no STF (Gilmar Mendes X Marco Aurélio de Mello). A perda da presidência do Senado por Renan se manterá? A maioria pró-Lava Jato no STF se manterá?

Essa mudança de política por parte de Sérgio Moro, dos procuradores e por uma ala do STF (veremos seu tamanho) coloca novos desafios para denunciar seu papel arbitrário e pró-imperialista, pois agora a operação já é mais ampla e com objetivos maiores contra o regime politico. A Lava Jato e seus aliados institucionais (PR, setores do PSDB, setores do DEM) e de rua (VPR, MBL, etc) são agora um claro partido político, para simplificação chamemos de “partido da toga”.

2- Como estabilizar o regime?

Na ação independente por parte da Lava Jato saltou uma parcela do regime político em sua auto-preservação. Renan junto de dezenas de políticos, do PSDB, a quase totalidade do PT atuaram em prol de sua própria impunidade fazendo discursos contra a arbitrariedade do judiciário (contra eles e não contra os trabalhadores, movimentos sociais e nem falar os 40% da população carcerária, em sua maioria negros que nunca sequer foi julgada). Gilmar Mendes e ao menos Toffoli no Supremo atuam a favor desta ala que chamaremos, para simplificação de “partido da casta política”, um setor do regime que atua pela “anistia ampla geral e irrestrita da corrupção” e estabilidade pós-golpe a favor dos ajustes (a toga atua para mudar as “caras” do regime e assim conseguir ainda mais ajustes).

Em meio à crise política, editoriais da mídia alertaram como a ação dessas duas alas colocava em risco a preocupação principal: os ajustes. Tentaram que Moro costurasse um acordo com Renan, mas nem esse senador nem Gilmar Mendes aceitaram. Com as tropas em ação é difícil fazer os soldados pararem de apertar o gatilho. Como fica a situação de Temer se os ajustes não avançarem na intensidade e profundidade desejadas?

Uma forma de estabilizar parcialmente o regime seria promovendo eleições. Um plano, B diz FHC se o “governo ponte de Temer não resistir”. E esse plano B pode conferir nova legitimidade ao governante saído das urnas, mas não garante uma pacificação do “partido da toga” nem que o “partido da casta” pare de atuar pelo fim da Lava Jato e das ameaças da toga. Ou seja a crise política que se tornou institucional não é de fácil resolução e promete novos capítulos.

3 - A economia gera insatisfação com Temer

Temer foi colocado no poder para realizar profundos ataques à classe trabalhadora. Estava com a PEC 55 em vésperas de implementação e com a Reforma da Previdência apresentada quando o confronto “toga”/”casta” explodiu. Agora não se sabe o que poderá ser votado nem quando. E os empresários já vinham lhe alertando que somente essas medidas eram insuficientes. Por dois motivos: essas medidas não geram crescimento da economia e dos lucros no curto prazo, e o descontentamento pode gerar algum nível de explosão social.

A insatisfação empresarial demanda privatizações, medidas de estímulo aos investimentos e avanço mais rápido contra os trabalhadores para aumentar mais rápido a taxa de lucro em meio a um cenário internacional que tende a piorar.

Temer está tentando cumprir seu lado de ataques com primor para ver se assim ainda se mantém útil a grande parte da elite. Tenta a todo custo mostrar serviço e fazer com que os tucanos, seus principais avalistas, não lhe abandonem.

Porém, por outro lado, não conseguir algum nível de crescimento econômico pode levar todo país a ter contornos mais “cariocas”. Manifestações de policiais se enfrentando com policiais, fechamento de restaurantes populares e outros programas sociais e um verdadeiro drama social com perigo de explodir (vai que o morro desce se perguntam).

4- Mas como o país não explode? O novo papel do PT

Com a pior crise econômica em oito décadas, com ataques históricos como a brutal reforma da previdência, desemprego crescente, e tamanha crise política como o país não explode?

A resposta reside na nova localização do PT e nos movimentos sociais que se alinham com sua direção. De implementador dos ajustes passou a vítima do golpe e sujeito da “resistência”.

Ao contrário de assumir a presidência do Senado e vetar a PEC 55 como prometeu nas redes sociais, o que o PT fez foi blindar Renan e tentar junto a ele buscar uma costura para a crise. Essa combinação de promessa de resistência e acordo de conciliação é justamente o papel que emprega nas manifestações contra a PEC e outros ataques. Paralisações isoladas e atos isolados de um “plano de guerra” capaz de parar a mão dos ataques. Os dias de paralisação ou jornadas em Brasília, tal como ocorrem hoje, são a continuidade via CUT, CTB, UNE da mesma política: resistência forte na retórica e tentativa de acordo, de conciliação.

O PT não organiza essa “resistência” pois trabalha no fio da navalha entre mostrar-se resistente e opositor aos ajustes e ao mesmo tempo mostrar para a elite que não são “irresponsáveis”. Tudo gira em torno dos cálculos eleitorais de 2018 ou de novas eleições. O impeachment ou novas eleições são duas caras da mesma moeda: oposição, porém responsável e ajudando a que o regime político tente se recompor tendo à frente um novo ajustador, e não que os trabalhadores e a juventude em luta questionem toda a podridão desse regime.

5- É possível e necessária uma saída independente

Dia a dia se mostra algum aspecto novo de podridão desse regime. A falta de resposta independente por parte dos trabalhadores, fortalece aqueles que trabalham para conciliar com a direita, como sempre busca o PT, ou até mesmo para saídas que apareçam como de fora do sistema partidário, como “gestores”, ou coisa que o valha, o que mostrou efetividade nas eleições municipais. Não faltam exemplos internacionais a ilustrar como na ausência de uma resposta radical, portanto anticapitalista e revolucionária dos trabalhadores o caminho para uma direita demagógico, xenofóbica, etc foi facilitado.

Em meio as disputas dos poderes os trabalhadores precisam erguer uma voz própria, não apoiar lados que não estão nem aí para o combate a corrupção ou aos abusos do judiciário; que não levantam um verdadeiro “plano de guerra” para impedir a PEC 55, os “planos de maldade” estaduais, nem a reforma da previdência. Precisamos impor com a força da mobilização uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana, que garanta que todos cargos políticos de juízes a senadores sejam eleitos e revogáveis, ganhem como uma professora, o confisco dos bens de corruptos e seu julgamento por júri popular. Para impormos uma Nova Constituinte é necessário em primeiro lugar que a CUT e CTB deem um basta a sua trégua a Temer, ao STF e ao Congresso que seguem aprovando ataques dia atrás dia mesmo com tanta crise política no país. É preciso um verdadeiro plano de luta e não medidas isoladas, é preciso organizar assembleias e mobilizações nos locais de trabalho para que os trabalhadores tomem em suas mãos o combate a PEC 55, à reforma da previdência e para dar uma saída própria nessa crise política.




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