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ESTUDOS ENTRE TRABALHADORES | Discussão ideológica e condições materiais para a criação socializada das crianças

segunda-feira 27 de julho de 2015 | 10:47

Na terceira reunião do grupo de estudos do livro “Mulher, Estado e revolução”, da autora Wendy Goldman, as metroviárias discutiram o segundo capítulo, intitulado: O primeiro retrocesso: besprizornost e a criação socializada da criança. Neste capítulo, o foco foi o embate ideológico e material para a criação das crianças. No decorrer deste, a autora evidencia as condições que levaram a este confronto e vai mostrando como a situação vai levando a retrocessos nas condições sociais das mulheres e, principalmente, das crianças

No início do capítulo a autora relata a conjuntura catastrófica que a região da futura URSS passava. Como consequência da 1º Guerra Mundial, guerra civil, fome e epidemias, o período de 1914-21 foi denominado como terremoto demográfico devido ao grande número de mortos.

A época antecessora da revolução russa foi marcada por: aumento dos preços, mulheres e crianças substituindo homens nas fábricas por salários mais baixos, aumento da criminalidade juvenil, da prostituição infantil e da fome. Mesmo após a tomada do poder pelos bolcheviques, pelo baixo desenvolvimento das forças produtivas e por consequência dos anos de guerra, tais condições não melhoram e as pessoas continuam a morrer nas cidades.

Em 1919 começam a ter reuniões para a discussão sobre a situação das crianças em tal conjuntura. Nestas reuniões destaca-se que as crianças deveriam ser a prioridade do Estado, como retrata a colocação de Elzarova, membro do I Congresso voltado para a situação das crianças: “Todas as crianças devem ser filhas do Estado”. Em contrapartida a suas propostas e de outros membros e participantes do congresso, Il’ina discute sobre a dura realidade que as crianças vêm passando. Em seu discurso argumenta que a abolição da família era impossível enquanto o Estado não assumisse a criação dos filhos. A situação se complicava porque pelos anos de guerra, fome e demais condições, aumentava muito o número de órfãos e o Estados não tinha estrutura para cuidar de todas essas crianças e jovens.
Os anos que sucederam a Revolução de 1917 foram marcados pela invasão da URSS por parte de 14 exércitos imperialistas, na tentativa de frear a revolução. Esse boicote dos países capitalistas, somados às décadas anteriores de espólio desses mesmos países sobre a Rússia, acabou piorando as condições na URSS, levando o número de crianças em lares para cuidados, em condições precárias, a aumentar regularmente, enquanto as crianças mais velhas se entregavam aos vícios e a prostituição.

Em 1921 uma severa seca piora a questão da fome na URSS e, juntamente com epidemias, levam a dados assustadores: 90-95% de morte de crianças menores de três anos e quase de um terço das crianças maiores de três, os bebes que sobreviviam se tornavam órfãos ou eram abandonados. A autora resume bem está situação: “Sob as condições de quase completo colapso econômico, centena de milhares de crianças requeriam abrigo, comida, atenção médica e cuidados imediatos.... Os golpes brutais da guerra e da fome rapidamente alcançaram o que os teóricos soviéticos haviam imaginado para um futuro mais distante”. Sob tais condições se dá o primeiro retrocesso ao código de 1918: cai por terra a proibição da adoção de crianças e o governo começa a acomodar crianças com famílias camponesas. Isso foi considerado um retrocesso porque o poder dos trabalhadores na URSS considerava que as crianças órfãs seriam melhor cuidadas pelo Estado, mas ao não dispor de estrutura para isso, o Estado liberou a adoção, mesmo sabendo que viver com uma família camponesa naquele momento significaria em muitos casos que essas crianças e jovens adotivos teriam que trabalhar gratuitamente para essas famílias camponesas.

Com a Nova Política Econômica (NEP), em 1921, que gera o renascimento do mercado comercial com o propósito de estimular o fornecimento de matéria-prima para as indústrias das cidades e foi necessária para evitar o desabastecimento generalizado e uma revolta rural, a autora observa reflexos negativos nas condições sociais das mulheres e crianças. Com a redução de gastos estatais e com arrecadações sem sucesso, diminui o apoio as instituições infantis que, mesmo com a proibição, muitos comitês executivos fecham as instituições e alocam os escassos recursos em empresas mais lucrativas. Desta forma, concretiza-se um ciclo vicioso que ataca mulheres e crianças: pela falta de creches a liberação das mulheres é severamente minada pois, com isso, elas são obrigadas a permanecerem amarradas a família e as mães solteiras, incapazes de se sustentar e de sustentar seus filhos, devido à falta de trabalho acabam deixando-os e estas crianças, por sua vez, acabam nas ruas se entregando ao crime como única opção de sobrevivência.

Em 1922, é introduzido um novo código criminal, no qual maiores de 16 anos começam a ser julgados nos tribunais de adultos, na tentativa de reduzir o trabalho das comissões que cuidavam de crianças e jovens, pois estas estavam sobrecarregadas. Entretanto, os meios punitivos ou de reabilitação eram limitados perante o cenário de falta de lares e tutores para alocação e sobrevivência, fazendo com que as comissões responsáveis processassem somente estatísticas e ejetando estas crianças e jovens novamente as ruas. Assim, este fenômeno de crianças abandonadas se torna crônico. As crianças se apegavam a liberdade e mobilidade, sendo vistas como uma forma de “recompensa” ao sofrimento passado.

O maior retrocesso na situação das crianças na URSS se dá quando Stalin assume o poder, em 1924. Os adolescentes são transferidos para parte rural para trabalhar na agricultura para se sustentarem, instituições pré-escolares passaram a ser pagas, a adoção de crianças por famílias camponesas torna-se legalizada e subsidiadas, com dinheiro e terra, mesmo sem o cuidado com o bem-estar delas. Assim, a família foi ressuscitada como a única solução para conter a situação das crianças, e, com isso, a ideia de socialização da criação das crianças é abandonada.

Na próxima reunião, que ocorrerá no dia 08/08 (sábado, às 16h), no Sindicato do Metroviários de São Paulo, discutiremos o terceiro capítulo (A lei e a vida colidem: união livre e população assalariada). Venham participar desta discussão conosco metroviárias e companheiras e/ou familiares de metroviários!

Veja também neste link (http://www.esquerdadiario.com.br/Metroviarias-se-reunem-para-discutir-o-livro-Mulher-Estado-e-Revolucao-de-Wendy-Goldman ) os principais debates feitos pelas metroviárias sobre o Capítulo 1 do livro da Wendy Goldman.




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