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Do Harlem ao Haiti: as cores de Jacob Lawrence e Toussaint Louverture

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Pintura

Do Harlem ao Haiti: as cores de Jacob Lawrence e Toussaint Louverture

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O espectro da revolução haitiana ronda os pesadelos da burguesia há séculos. A única revolução vitoriosa de escravos da história deixou uma marca tão profunda que não se pode falar de uma história do capitalismo sem falar sobre quando os negros tomaram o céu de assalto na ilha de São Domingos. [1] Nomes como Toussaint L’Ouverture e Dessalines ecoaram e ecoam na tradição da literatura oral e nas mais variadas formas de arte desde então. Um dos exemplos mais interessantes desse impacto se deu quando o então jovem pintor americano, Jacob Lawrence, dedicou 41 pinturas suas a retratar a vida de Toussaint L’Ouverture.

Jacob Lawrence nasceu em 1917 em Nova Jersey e uma série de questões o fizeram, aos 13 anos, se mudar com seus irmãos para o Harlem, em Nova York. O contexto em que Lawrence chega ao Harlem é de uma efervescência cultural profunda que à época foi chamada de Novo Movimento Negro mas ficou marcada na história como a Harlem Renaissance (Renascença do Harlem) que abrangia nomes como Langston Hughes, Billie Holliday, Nella Larsen, Claude McKay, W.E.B. Dubois, Ma Rainey, Louis Armstrong, Ethel Waters, Jessie Fauset, entre outros. Como um movimento artístico-político profundamente antirracista e de orgulho negro (além de expressivamente LGBT [2]), a Renascença do Harlem pautou discussões sobre o colorismo nos debates de raça, debates profundos sobre arte e intelectualidade negra e um resgate de grandes figuras da história da luta negra. Entre esses resgates estão as séries de pinturas de Jacob Lawrence – que teve forte influência da Renascença do Harlem através de seu contato com Claude McKay, Alain Locke e Aaron Douglas – dedicadas a contar a história de algumas dessas figuras como Toussaint L’Ouverture, Harriet Tubman e Frederick Douglas.

Em entrevista, Jacob Lawrence comenta o peso que a história dessas figuras tinha no seu contexto e como as conheceu:

Como crianças da comunidade do Harlem, nós crescemos ouvindo sobre esses grandes heróis e heroínas negras – Toussaint L’Ouverture, Harriet Tubman, Frederick Douglas e por aí vai. Imagino que isto estava acontecendo em comunidades negras ao redor do país. Nós ouvíamos essas histórias dos professores negros nas escolas e dos bibliotecários negros. Também ouvíamos essas histórias pelo que eu chamo de oradores de esquina. [3]

Rumo ao dia 20 de novembro, resgatar a história de Toussaint L’Ouverture e junto a isso a obra de Jacob Lawrence é de importância total. Aproveitemos então as pinturas:

Nº1: Colombo descobriu o Haiti em 6 de dezembro, 1492. A descoberta foi na primeira viagem de Colombo ao Novo Mundo. Ele é mostrado fincando a bandeira oficial da Espanha, sob a qual navegou. Os padres mostram a influência da Igreja sobre o povo.
Nº2: O maltrato dos soldados causou muitos problemas na ilha e causou a morte de Anacaona, a rainha nativa, 1503. Colombo deixou soldados em comando, que começaram a escravizar o povo. A rainha foi uma das líderes da insurreição que se seguiu.
Nº3: Espanha e França disputaram o Haiti constantemente, 1665-1691.
Nº4: Espanha e França concordaram em dividir o Haiti, 1691.
Nº5: O comércio de escravos atinge seu ápice no Haiti, 1730.
Nº6: O nascimento de Toussaint L’Ouverture, 20 de maio, 1743. Ambos os pais de Toussaint eram escravos.
Nº7: Quando criança, Toussaint ouviu o estalar do chicote do dono da plantação e o sangue correr dos corpos dos escravos.
Nº8: Em sua juventude sua aparente boa natureza o ganhou o posto de cocheiro para Bayou de Libertas, 1763. Seu trabalho como cocheiro o deu tempo para pensar sobre como lutar contra a escravidão. Durante esse período, aprendeu sozinho a ler e a escrever.
Nº9: Ele leu o Livro Anti-Escravidão de Reynold que previa um Emancipador Negro, cuja linguagem o inspirou, 1763-1776.
Nº10: A crueldade dos donos das plantações para com os escravos levou-os à revolta, 1776. Estas revoltas que continuaram surgindo de tempos em tempos, finalmente chegaram a um pico na rebelião
Nº11: A sociedade dos Amigos dos Negros foi formada na Inglaterra, 1778, os membros dirigentes sendo Price, Priestly, Sharp, Clarkson e Wilberforce.
Nº12: Jean Francois, o primeiro negro a rebelar-se no Haiti.
Nº13: Durante a rebelião de Jean Francois, Toussaint levou seu senhor e sua senhora à segurança.
Nº14: Os negros eram guiados por três chefes, Jean Francois, Biassou e Jeannot; Toussaint servindo como ajudante de campo de Biassou.
Nº15: Os Mulatos, enemigos de ambos os Negros e os Brancos, mas tolerados mais pelos Brancos, juntaram suas forças em batalha contra os Negros, 1793.
Nº16: Toussaint capturou Dondon, uma cidade no centro do Haiti, 1795.
Nº17: Toussaint capturou Marmelade, guardada por Vernet, um mulato, 1795.
Nº18: Toussaint capturou Ennery.
Nº19: Os Mulatos não tinham organização; os Ingleses mantirevam apenas um ponto ou dois na Ilha, enquanto os Negros formaram grandos bandos e massacraram cada Mulato e Branco que encontraram. Os Negros aprenderam o secredo de seu poder. Os Haitianos agora controlavam metade da ilha.
Nº20: O General Toussaint L’Ouverture, homem de estado e gênio militar, estimado pelos hispânicos, temido pelos ingleses, temido pelos franceses, odiado pelos donos das plantações e reverenciado pelos Negros.
Nº21: O General Toussaint L’Ouverture atacou os ingleses em Artibonite e lá capturou duas cidades.
Nº22: Estabelecendo-se em Saint-Marc, tomou posse de dois importantes postos.
Nº23: O General L’Ouverture coletou forças em Marmelade e em 9 de outubro de 1794, saiu com 500 homens para captrar San Miguel.
Nº24: O General L’Ouverture se reune com Leveaux em Dondon com seus principais ajudantes, Dessalines, Comandante de San Miguel, Duminil, Comandante de Plaisance, Desrouleaux, Ceveaux e Maurepas, Comandantes de batalhões, e prepara um ataque a Saint-Marc.
Nº25: O General Toussaint L’Ouverture derrota os ingleses em Saline.
Nº26: Em 24 de março, ele captura Mirebalois.
Nº27: Retornando à vida privada como o comandante e chefe do exército, ele providenciou que o país fosse bem cuidado e o Haiti retornou à prosperidade. Durante esse importante período, a escravidão foi abolida e a atenção voltada sobre as atividades agriculturais.
Nº28: A constituição foi preparada e apresentada para Toussaint no dia 19 de maio, 1800, por nove homens que ele havia escolhido, oito dos quais eram proprietários brancos e um mulato. O liberalismo de Toussaint o levou a escolher tal grupo para esboçar a constituição. Ele foi muito criticado por sua escolha, mas a constituição se provou viável.
Nº29: L’Ouverture fez uma triunfante marcha a San Domingo no dia 2 de janeiro, 1801, liderando 10.000 homens, e hasteou a bandeira da república francesa. Toussaint não desejava romper com os franceses, o grupo majoritário dentre os habitantes haitianos. Os próprios Negros falavam francês patoá.
Nº30: Napoleão Bonaparte começa a olhar o Haiti como um novo território a conquistar. A conquista inevitavelmente significava mais escravidão.
Nº31: As tropas de Napoleão sobre LeClerc chegam à costa do Haiti.
Nº32: Henri Christoph, ao invés de render-se a LeClerc, incendeia La Cape. Christoph, um dos ajudantes de Toussaint, espalha a notícia de que os franceses estavam em águas haitianas – que ele havia os segurado o máximo possível
Nº33: O General L’Ouverture, preparado para guerra com Napoleão, prepara Crete-a-Pierrot como um ponto de resistência. Toussaint levou suas tropas para as montanhas, decidindo pela guerra de guerrilha.
Nº34: Toussaint derrota as tropas de Napoleão em Ennery.
Nº35: Febre amarela irrompeu com grande violência, tendo um grandioso efeito moral e físico nos soldados franceses. Os franceses solicitaram um armistício com L’Ouverture.
Nº36: Durante o armistício Toussaint é enganado e preso por LeClerc. LeClerc levou Toussaint a acreditar que ele era sincero, acreditando que quando Toussaint estivesse fora de seu caminho, os negros se renderiam.
Nº37: Toussaint é levado a Paris e preso no calabouço de Castle Joux, 17 de agosto, 1802. Essa era a pior punição que Napoleão poderia tê-lo dado. Toussaint cismava.
Nº38: A tentativa de Napoleão de restaurar a escravidão falhou. Dessalines, chefe dos negros, derrotou LeClerc. Homens, mulheres e crianças negras se armaram por sua liberdade, novembro, 1802.
Nº39: A morte de Toussaint L’Ouverture na prisão de Le Joux, abril de 1803. Isto foi um ano depois. Ele morreu de fome, porque “não tinha vontade de comer”.
Nº40: A Declaração de Independência foi assinada em 1 de janeiro, 1804 – Dessalines, Clevaux e Henri Christophe. O povo venceu. Estes três homens fizeram uma nova constituição, escrevendo-a eles mesmos. Foram eles que haviam criticado Toussaint L’Ouverture por seu idealismo em permitir que os brancos tivessem esboçado a anterior. Bandeira haitiana aparece no esboço.
Nº41: Dessalines foi coroado Imperador, 4 de outubro, 1804

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FOOTNOTES

[2Uma parte considerável dos grandes nomes da Renascença do Harlem eram LGBTs, assumidos ou não. Entre eles principalmente Ma Rainey (destaque às diversas músicas em que cita seus relacionamentos com outras mulheres como “Prove it on me”), Langston Hughes, Claude McKay (ver “Claude McKay, Code Name Sasha: Queer Black Marxism and the Harlem Renaissance”), Bessie Smith, Ethel Waters, Gladys Bentley, etc.

[3Entrevista a Xavier Nicholas em 1992.
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Araçá

Estudante de Letras da UFRN e militante da Faísca Revolucionária
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