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Em defesa da teoria dos preços de Marx

Seiji Seron

Em defesa da teoria dos preços de Marx

Seiji Seron

O presente artigo versa um dos aspectos mais difíceis e controversos de O capital. Há um mito secular de que Marx foi incapaz de provar a existência de uma relação causal entre os valores das mercadorias e os seus respectivos preços. Até hoje, este mito é largamente difundido nos meios acadêmicos da área de economia, apesar de já ter sido desmentido por uma literatura que se avoluma desde a década de 1980. Este artigo intentará, na medida das possibilidades do autor, resumir a controvérsia a respeito da teoria dos preços de Marx de maneira acessível a quem quer que possua um conhecimento rudimentar da teoria econômica de Marx.

A fonte dos lucros é a mais-valia, ou mais-valor, resultante da exploração do trabalho assalariado. Assim, é preciso distinguir a força de trabalho dos demais elementos constitutivos do capital produtivo. Marx chama de “capital constante” as matérias-primas e os meios de produção, como máquinas, equipamentos, instalações, insumos energéticos e de qualquer outra natureza. Já o “capital variável” é a designação de Marx para o capital-dinheiro dispendido na aquisição de força de trabalho, ou seja, no pagamento de salários. O capital constante não gera valor novo, mas apenas transfere seu valor para o produto final. Por exemplo, uma máquina cuja vida útil é de 10 anos transfere, a cada ano, 1/10 do valor de si própria para as mercadorias em cuja produção esta máquina foi empregue no decorrer de um ano. Em contrapartida, a quantidade de mais-valia que um capital produz depende diretamente da quantidade de trabalho que este capital emprega. A razão entre as quantidades de mais-valia e de capital variável é taxa de mais-valia, ou taxa de exploração. Se tal razão é de 1:1, o tempo durante o qual o trabalhador produz o valor equivalente ao do salário que lhe será pago é igual ao tempo durante o qual este mesmo trabalhador produz mais-valia. Em outras palavras, a jornada de trabalho deste trabalhador divide-se ao meio: em uma metade, ele trabalha “para si mesmo”; na outra metade, trabalha “de graça” para o capitalista.

Já a razão entre o capital constante e o capital variável é o que Marx denomina “composição orgânica do capital”. Esta é, portanto, maior quanto maior for a proporção do capital investido em máquinas, etc., e quanto menor for a proporção do capital investido em força de trabalho. Em suma, o valor de qualquer mercadoria é igual a c + v + m, ou seja, ao valor do capital constante e do capital variável usados na produção da mercadoria, além do mais-valor consubstanciado nesta mercadoria. No entanto, um dos problemas que a economia política clássica não foi capaz de solucionar é o seguinte: por efeito da concorrência e da movimentação dos capitais entre os ramos e setores econômicos, a rentabilidade média dos vários capitais tende a se igualar, independentemente de qual seja a composição orgânica de cada capital. Se os valores das mercadorias são c + v + m e m depende de v, então, seria de se esperar não só que as taxas de lucro de cada capital fossem distintas, mas também que os setores mais lucrativos da economia fossem os menos mecanizados e os menos sofisticados tecnologicamente, ou seja, os de menor composição orgânica do capital. A realidade capitalista parece contrariar a teoria do valor-trabalho.

Porém, não é porque um capital produziu uma massa de mais-valia que esta massa será apropriada pelo próprio capital que a produziu. No livro III de O capital, Marx explica que a concorrência provoca uma redistribuição da massa total de mais-valia produzida pela sociedade entre todos os capitais desta sociedade. É como se houvesse um único capital, e todos os capitais individuais, todas as empresas individuais, fossem “sócios” deste único capital. A mais-valia total é repartida entre estes “sócios” na proporção do capital que cada um aportou à sociedade. A fração da mais-valia total apropriada por cada capital depende apenas da quantia investida pelo “sócio”, e não de como tal quantia foi investida, isto é, da composição orgânica de cada capital. Isto implica que, sob o capitalismo, os preços das mercadorias oscilam não em torno dos valores das respectivas mercadorias, mas sim em torno do que Marx denomina “preços de produção”. Estes são iguais ao valor do capital dispendido na produção destas mercadorias acrescido de um lucro médio, ou c + v + l, ao invés de c + v + m. No capítulo 9 do livro III de O capital, há um exemplo numérico da transformação dos valores em preços de produção:

ERRATA: O valor dos produtos do capital IV é 70, não 77, e o valor dos produtos do capital V é 20, não 37.

Marx supõe que a taxa de mais-valia é de 100%, isto é, que a mais-valia é igual ao capital variável. O preço de custo das mercadorias é igual à soma do capital constante consumido na produção de cada mercadoria e do capital variável. O valor é igual ao preço de custo acrescido da mais-valia extraída por cada capital. Já o preço de produção é igual ao preço de custo acrescido de um lucro proporcional à taxa média de lucro. Esta taxa é determinada dividindo-se a mais-valia total pelo capital social total. No exemplo de Marx, o capital social total é 500, e a mais-valia total, 110. Logo, a taxa média de lucro é 22%. Multiplicando-se o capital investido pela taxa média de lucro, descobre-se o lucro auferido por cada capital. No exemplo, o tamanho dos cinco capitais é o mesmo: 100. Como 22% de 100 é 22, o preço de produção dos produtos de cada setor é igual ao preço de custo do respectivo produto mais 22. Por conseguinte, os preços desviam-se dos valores de maneira sistemática. Os preços das mercadorias produzidas por capitais cuja composição orgânica é maior que a composição orgânica do capital social médio serão superiores aos seus respectivos valores e vice-versa. No entanto, o processo de transformação dos valores em preços de produção não cria nem destrói nenhum valor, mas apenas transfere valor de um capital a outro, de modo que a soma dos valores é sempre igual à soma dos preços de produção, e a soma dos lucros é sempre igual à soma da mais-valia.

O “problema da transformação” e a solução do sistema único temporal

Ao redistribuir a massa total de mais-valia entre os capitais, a concorrência cria a ilusão de que os lucros dependem apenas da diferença entre o quanto o “mercado” permite que se cobre por uma mercadoria e o custo de produção desta mesma mercadoria, e de que tal diferença, portanto, independe totalmente daquela massa. Assim, Marx provou que a teoria do valor-trabalho é perfeitamente capaz de explicar o comportamento real da economia capitalista mesmo quando tal comportamento parece negar ou “inverter” as leis que o regem de fato. Obviamente, tal prova jamais poderia ser admitida pela burguesia. O mais bem-sucedido ataque contra a teoria do valor de Marx foi feito na primeira década do século XX por Ladislaus von Bortkiewicz, um economista russo de ascendência polonesa. Para Bortkiewicz, o procedimento por meio do qual Marx transformou os valores em preços de produção seria inconsistente porque apenas os valores dos produtos são transformados, mas não os dos insumos, ou seja, os do capital constante e do capital variável. Estes valores, presentes na primeira coluna da tabela acima, também teriam de ser transformados em preços de produção. Afinal, há capitais que produzem bens de produção, os quais são adquiridos por outros capitais e usados para produzir uma terceira mercadoria. O preço de um bem como produto final de um capital e como elemento constitutivo de outro capital deve ser, portanto, o mesmo.

A “correção” do erro de Marx seria efetuada, então, por meio de dois sistemas de equações simultâneas: um de valores e outro de preços de produção. Porém, a solução matemática destes sistemas impossibilita que as duas identidades fundamentais de Marx, a de valores totais e preços totais e a de mais-valia total e lucro total, ocorram ao mesmo tempo. Ademais, haveria uma discrepância entre a taxa média de lucro mensurada em valores e em preços. Consequentemente, esta última não seria mais a razão entre a mais-valia total e o capital social total, ou ∑m/(∑c+∑v). A crítica de Bortkiewicz adquiriu ainda mais força após 1960, ano da publicação de Produção de mercadorias por meio de mercadorias, de Pierro Sraffa. A princípio, o intuito deste economista italiano era contestar o mainstream econômico burguês em favor de uma abordagem teórica mais próxima daquela da economia política clássica, especificamente, da de David Ricardo. No entanto, tal publicação engendrou uma escola “neo-ricardiana” de economia, segundo a qual a teoria marxista do valor deveria ser descartada, já que a descrição das quantidades físicas de insumos e produtos da economia como um todo seria suficiente para o cálculo correto da taxa de lucro e dos preços das mercadorias. O modelo teórico de Sraffa exerceu grande influência, inclusive, entre os marxistas que continuaram tentando solucionar o “problema da transformação” dos valores em preços de produção a fim de defender a teoria de Marx das críticas de Bortkiewicz e dos neo-ricardianos. [1]

Mesmo estes marxistas, contudo, aceitavam o argumento de que Marx cometeu um erro ao não transformar os valores dos insumos, mas somente os dos produtos, em preços de produção. Tal argumento só será rejeitado a partir dos anos 1980, quando começam a ser publicados os trabalhos que culminariam na interpretação da transformação como um sistema único temporal. Alguns dos principais proponentes desta interpretação são Andrew Kliman, Alan Freeman, Guglielmo Carchedi, Eduardo Maldonado Filho e João Machado Borges Neto. Para estes intérpretes, a crítica bortkiewicziana ao procedimento marxista da transformação não procede porque, diferentemente do que alega Bortkiewicz, o capital constante e o capital variável não são contabilizados em valores, isto é, em horas de trabalho, mas sim em preços. Estes preços são os que os capitalistas efetivamente pagaram pela aquisição dos elementos constitutivos do capital, ou seja, dos insumos. Entretanto, um insumo só pode ser adquirido e usado na produção de uma mercadoria qualquer porque este mesmo insumo foi produzido em um período anterior. Portanto, é falsa a afirmação de Bortkiewicz de que o preço de um bem deve ser o mesmo como insumo e como produto. A transformação dos valores em preços de produção acontece de maneira temporal, e não simultânea. Os preços dos produtos de um período são os preços dos insumos do período subsequente. Os preços dos produtos deste segundo período serão os preços dos insumos de um terceiro, e assim por diante. [2]

Como ressalta Borges Neto, Bortkiewicz concebe o valor não como a forma social assumida pelos produtos do trabalho sob as relações de produção capitalistas, mas simplesmente como uma razão de intercambialidade aproximativa, hipotética, entre uma e outra mercadoria, que existe apenas como instrumento lógico para a determinação das verdadeiras proporções em que as mercadorias se trocam, ou seja, dos preços. [3] Esta concepção é dualista, na medida em que contrapõe o sistema de valores ao sistema de preços de produção, e torna ininteligível a maneira como o capital constante transfere valor às mercadorias em cuja produção é empregue. O que determina a quantidade de valor transferida pelo capital constante para o produto final não é o valor do capital constante, não é o tempo de trabalho dispendido na produção das máquinas, matérias-primas, etc., mas sim o preço pago pelo capitalista por tais insumos, preço este que pode não ser e, via de regra, não é diretamente proporcional à quantidade de trabalho necessária para produzi-los, seja por causa da redistribuição da mais-valia entre os capitais ocasionada pela concorrência, seja por causa de flutuações de curto prazo da oferta e da demanda. Interpretar a transformação dos valores em preços de produção como um sistema único, não-dualista, significa conceber tal transformação não como um processo puramente lógico, e sim como um processo real, como um processo de transformação da forma de manifestação do valor: de preços diretos, isto é, diretamente proporcionais ao tempo de trabalho socialmente necessário à produção de uma mercadoria, em preços de produção, que redistribuem periodicamente a massa total de mais-valia entre os capitais. [4]

Um modelo temporal da transformação dos valores em preços

Esta planilha Excel, elaborada pelo autor, contém um modelo da transformação dos valores em preços de produção estendido para 10 períodos. Tal modelo é muito semelhante ao que se apresenta na contribuição pioneira de Maldonado Filho à interpretação do sistema único temporal. [5] Há, contudo, duas diferenças entre os modelos. Uma é que Maldonado Filho supõe reprodução simples, ou seja, que toda a mais-valia é consumida improdutivamente e, portanto, não há acumulação. Já o modelo que se encontra na planilha supõe reprodução ampliada. Para fins de simplificação, admite-se ainda a hipótese irrealista de que os capitalistas não consomem, isto é, que a totalidade da mais-valia é acumulada. A outra diferença é que modelo da planilha divide a economia em dois departamentos, conforme os esquemas de reprodução do livro II de O capital. O Departamento I (DI) produz meios de produção, ou seja, os elementos constitutivos do capital constante; e o Departamento II (DII), os meios de subsistência dos trabalhadores, ou seja, os elementos constitutivos do capital variável. Supõe-se ainda que, a cada período, todo o capital constante é consumido e precisará ser reposto no período subsequente. [6]

Assim, os preços de produção são calculados conforme o procedimento de Marx, e as taxas de mais-valia de cada departamento são sempre iguais às respectivas taxas de mais-valia do primeiro período. Em cada período, a produção é totalmente adquirida, de modo que os produtos de cada período se tornam os insumos do período seguinte. A distribuição do capital social total de cada período entre os departamentos e entre c e v também se mantém na proporção do primeiro período. Se se admite que os preços dos insumos do primeiro período são preços diretos, então, o que a planilha designa como “valor” (coluna E) é, a partir do segundo período, a soma do valor transferido para o produto pelo capital constante e do valor adicionado pelo trabalho vivo, que se divide entre mais-valia e salários, isto é, capital variável. No primeiro período, o capital constante e o capital variável de cada departamento e as quantidades físicas de produto são dados. A partir do segundo período, as quantidades produzidas são determinadas comparando-se o valor de cada departamento com o valor do mesmo departamento no período anterior. Por conseguinte, a composição orgânica do capital mantém-se inalterada ao longo do tempo, já que as mudanças periódicas dos preços modificam a composição de valor do capital, mas não a composição técnica do capital, isto é, a proporção entre capital constante e variável medida em unidades físicas. [7]

Logo, a soma dos preços de produção dos produtos do DI no período t são idênticos à soma do capital constante dos dois departamentos no período t+1, e a mesma identidade existe, mutatis mutandis, entre os preços de produção do DII e o capital variável e entre as quantidades de produto de um período e as quantidades de insumos do período seguinte. Ademais, as duas identidades fundamentais da transformação marxista confirmam-se em todos os períodos: a soma dos valores dos insumos de um período é sempre igual à soma dos preços de produção do mesmo período, e a mais-valia total de um período é sempre igual aos lucros totais do mesmo período. Como todo o capital constante é consumido e toda a mais-valia é reinvestida a cada período, seria de se esperar que o preço de custo de cada departamento no período t coincidisse com o preço de produção do mesmo departamento no período t-1. Isto não acontece porque as premissas do modelo implicam que, a cada período, há um deslocamento parte do capital social total de um departamento para o outro. Em outras palavras, uma parcela dos lucros gerados em departamento é subsequentemente reinvestida no outro departamento. Esta transferência intersetorial de capital é necessária não só para que as taxas de lucro dos dois departamentos se igualem, mas também para que haja equilíbrio entre a oferta e a demanda de meios de produção e de meios de subsistência e não haja estoques invendáveis de produtos de qualquer um dos dois departamentos ao final de cada período.

A planilha está programada para que os números em vermelho possam ser alterados livremente, de maneira que todo o resto seja recalculado automaticamente a cada alteração de tais números. Consideremos os números que já estão na planilha (c1 = 4000; v1 = 1000; m1 = 1000; q1 = 50; c2 = 2000; v2 = 1000; m2 = 1000; q2 = 100). Do primeiro para o segundo período, ocorrem mudanças significativas da taxa média de lucro, dos preços unitários dos produtos e das composições de valor do capital, e um capital de $ 208,83 é transferido de DI para DII. Tanto estas transferências quanto as variações da taxa de lucro, dos preços unitários e das composições de valor do capital tornam-se cada vez menores após o segundo período. A partir do quinto período, a variação dos preços unitários cessa. No sexto período, cessa a variação da taxa de lucro. No oitavo, a composição de valor do capital se torna invariável. No último período, já não há mais transferências interdepartamentais de capital.

Evidentemente, esta é uma representação sobremodo idealizada da realidade. O equilíbrio de longo prazo que se estabelece no décimo período não é um resultado do real funcionamento da concorrência capitalista, e sim de suposições ad hoc do modelo, a saber, que toda a produção é sempre vendida e que não há qualquer mudança da técnica produtiva, ou seja, a composição técnica do capital é invariável. Estas suposições irreais visam explicitar que as variações dos preços das mercadorias apenas redistribuem o valor socialmente produzido e que, portanto, tais preços são uma expressão direta da quantidade de trabalho socialmente necessária à produção destas mesmas mercadorias, por mais que a concorrência “distorça” ou modifique parcialmente esta expressão. Na realidade, a economia capitalista está em permanente estado de desequilíbrio, e a movimentação do capital entre os ramos e setores da economia não é nem tão fluida, nem tão “clarividente” quanto o modelo sugere.

A guisa de conclusão: o sistema único temporal e a lei da queda tendencial da taxa de lucro

Além de cortar o nó górdio do “problema da transformação”, a interpretação do sistema único temporal também corrobora outro aspecto da teoria do valor de Marx duramente atacado pela burguesia: a lei da queda tendencial da taxa de lucro. Uma exposição sistemática desta lei, à qual Marx se refere como a mais importante da economia política, excederia substancialmente o escopo deste artigo. Em síntese, as crescentes dificuldades do capital de se valorizar são consequência do próprio desenvolvimento das forças produtivas sob o capitalismo, que acarreta uma elevação da composição orgânica do capital social médio. Se a taxa de lucro é a razão entre a mais-valia e o capital investido e se o tamanho da mais-valia depende do tamanho do capital variável, então, o aumento do capital constante em relação ao capital variável implica a queda da taxa de lucro, muito embora tal queda seja de natureza apenas tendencial, já que é contra-arrestada por uma série de fatores: o aumento da taxa de exploração, o barateamento das matérias-primas e dos meios de produção, entre outros.

Em uma publicação de 1961, um economista “marxista” japonês, Nobuo Okishio, teria demonstrado matematicamente a impossibilidade de que a taxa de lucro caia como resultado de um aumento da produtividade do trabalho obtido por meio de uma ampliação do capital constante, pois tal aumento de produtividade tornaria os próprios elementos constitutivos deste capital mais baratos, de maneira que o montante de capital investido permaneceria inalterado a despeito de este capital assumir a forma física de uma quantidade maior de meios de produção. Novamente, o ataque a Marx fracassa na medida em que pressupõe a determinação simultânea dos preços dos insumos e dos produtos. Por mais que a nova técnica possa diminuir os preços dos elementos constitutivos do capital, a taxa de lucro depende do capital previamente investido e, portanto, dos preços de tais elementos antes de estes terem sido produzidos por meio da técnica mais eficiente. Logo, as principais críticas tanto à teoria dos preços de Marx quanto à lei da queda tendencial da taxa de lucro sustentam-se, em grande medida, na abstração do tempo.


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FOOTNOTES

[1Mercatante, Esteban. Historia de una (presunta) inconsistencia (Ideas de Izquerda, n. 18, abr. 2015). Lucarelli, Bill. Marx and Sraffa on the Theory of Value (Society of Heterodox Economists Working Paper, abr. 2007).

[2Freeman, Alan. Marx Without Equilibrium. (Capital and Class, n. 56, verão (boreal) de 1995). Borges Neto, João Machado. A transformação dos valores em preços de produção como redistribuição do valor. (III Encontro Nacional de Economia Política. Niterói: UFF, 1998).

[3Borges Neto, A transformação... cit. nota 3, supra. cf. também Rubin, Isaak Illich. A teoria marxista do valor. São Paulo: Brasiliense, 1980. Embora não seja isenta de alguns aspectos problemáticos, a obra de Rubin é crucial para um entendimento acurado da teoria do valor de Marx, bem como da verdadeira relação deste com Ricardo e a economia política clássica como um todo.

[4Maldonado Filho (Liberação e absorção de capital e a transformação do valor das mercadorias em preços de produção. Ensaios FEE, v. 2., n. 2, p. 73-88, 1981) apropriou a categoria de “preços diretos” de Anwar Shaikh, um célebre proponente da solução iterativa do “problema da transformação”. Tal solução assemelha-se a do sistema único temporal na medida em que considera os preços dos produtos, calculados à maneira de Marx, como preços dos insumos de uma nova “iteração”, ou estimativa, a fim de determinar por aproximações sucessivas os preços de produção “corretos”. Todavia, a solução iterativa compreende a transformação dos valores em preços de produção do mesmo modo que Bortkiewicz, isto é, como um processo simultâneo, e não temporal. Assim, as várias iterações seriam apenas etapas de um procedimento lógico-matemático o qual visa alcançar os mesmos resultados que os sistemas de equações simultâneas, e não etapas cronológicas de um processo real.

[5Maldonado Filho, Eduardo A. de L. Liberação e absorção... cit. nota 4, supra.

[6Eventuais equívocos deste modelo são, evidentemente, de responsabilidade única e exclusiva do autor do artigo. Ademais, a produção literária dos intérpretes do sistema único temporal é prolífica, e o acesso a uma parte não desprezível desta literatura é dificultada pelo fato de ter sido publicada em revistas que cobram pelo acesso a tais publicações. Por conseguinte, é bastante provável que o modelo elaborado pelo autor não seja inédito.

[7“A composição do capital tem de ser apreciada sob dois aspectos. Do ponto de vista do valor, é determinada pela proporção em que o capital se divide em constante, o valor dos meios de produção, e variável, o valor da força de trabalho, a soma global dos salários. Do ponto de vista da matéria que funciona no processo de produção, todo capital se decompõe em meios de produção e força de trabalho viva; essa composição é determinada pela relação entre a massa dos meios de produção empregados e a quantidade de trabalho necessária para eles serem empregados. Chamo a primeira de composição segundo o valor e a segunda de composição técnica. Há estreita correlação entre ambas. Para expressá-la, chamo a composição do capital segundo o valor, na medida em que é determinada pela composição técnica e reflete as modificações desta, de composição orgânica do capital” (Marx, Karl. O capital. Livro 1, volume 2. 33ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018. p. 723). Em outras palavras, a composição orgânica do capital é definida de maneira a abstrair os efeitos de variações dos preços dos elementos constitutivos do capital sobre a composição de valor do capital.
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Seiji Seron

Bacharel em Ciências Econômicas (PUC-SP), mestrando em Desenvolvimento Econômico (Unicamp)
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