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O Alckmin das chacinas de Osasco e Pinheirinho agora dá os "parabéns" ao Hip Hop?

Ana Clara Vaz

O Alckmin das chacinas de Osasco e Pinheirinho agora dá os "parabéns" ao Hip Hop?

Ana Clara Vaz

Dia 11 de agosto foi aniversário de 50 anos do surgimento do Hip Hop. Um movimento cultural que surgiu nas periferias dos Estados Unidos e que reflete o contexto social e político destes locais, como a violência policial sofrida pelos moradores, majoritariamente negros.

No 11 de agosto deste ano, Alckmin gravou um vídeo em homenagem aos 50 anos do Hip Hop. Por que Geraldo Alckmin, em 2023, no ano do governo da frente ampla de Lula-Alckmin, após três recentes chacinas nas periferias de São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia e a morte do menino de 13 anos, Thiago, estaria parabenizando um movimento cultural que, nas suas próprias palavras, "segue forte, de uma forma genuína, como expressão política das periferias"?

Para responder a essa pergunta é importante resgatar a história do Hip Hop.
Com sementes que os ventos trouxeram da Jamaica, o início desse movimento tem forte influência das festas que rolavam naquele país com os paredões de amplificadores, com falas dos "mestres de cerimônia" que se referiam ao uso recreativo de drogas e à liberdade sexual, mas também ao cenário social e político de quem frequentava aquele espaço, marcado diretamente pela presença da polícia repressora. Inspirado por essa cultura dos amplificadores e das festas de rua, o DJ Cool Herc organiza um evento no dia 11 de agosto de 1973, no Bronx, na rua Sedwick and Cedar, com muita música, muito disco, muita dança e o gérmen do Hip Hop. Considera-se que a partir daí ele germinou.

Logo, surgiram os MC’s, que começam a rimar em cima dos beats dos DJ’s, trazendo em suas poesias retratos e reflexões sobre o cotidiano dos bairros mais pobres, de classe trabalhadora e maioria negra, dos EUA, marcado pela miséria, pelos empregos precários e pelo tráfico de drogas. Mas sublinhado também pela presença constante da truculência da polícia no dia a dia dos moradores, um dos únicos braços do estado que chegava até esses locais, o braço da repressão. O Hip Hop, como expressão desse contexto, vai também sofrer, por isso, a repressão do estado e, ao mesmo tempo e não contraditoriamente, se tornar um dos principais aglutinadores de denúncia e combate à polícia. Isso logo se expressa em músicas que ficaram muito conhecidas e até hoje o são, como "Fuck The Police", do grupo N.W.A.

No entanto, as rimas afiadas e combativas nunca estiveram retidas nessa primeira geração do rap, nem apenas nos EUA. Ela se reflete até hoje em obras como na música "Alright" do álbum "To Pimp a Butterfly", de Kendrick Lamar, que marcou os protestos do Black Lives Matter nos Estados Unidos. Daquela ponta a essa da América, no Brasil, vimos também desde seu princípio o tema da violência policial aparecer nos raps, como na música "Homens da Lei" de Thaíde e DJ Hum, responsáveis por consolidar o rap no Brasil. Ou, claro, nos grandes emblemas do rap nacional, os Racionais MC’s que têm uma vastidão de canetas que se dedicaram a mostrar o cotidiano das periferias muito marcado pela repressão da polícia e pelo encarceramento em massa, como na música "Negro Drama". Ainda, na segunda geração do rap nacional, Djonga expressa através da arte a presença da polícia, nas periferias, que ceifa a vida da juventude negra. Ou mesmo na terceira geração do rap BR, com a música #Retrato 4 - Da Silva, de VND, que aponta, com uma lírica impecável, as balas que são cuspidas pelo estado em corpos negros.

Ou seja, o rap está diretamente ligado ao combate e denúncia do braço repressor do Estado, e não dá para dissociar este caráter do Hip Hop, que, através do rap, tem suas manifestações mais explícitas. Mas é possível citar também como o graffiti e espaços que são palco vivo dos DJ’ e dançarinos do Hip Hop são, muitas vezes, repreendidos e criminalizados, como aconteceu com uma das maiores festas do movimento que existiram, o Freaknik que teve suas edições extinguidas pelas mãos da polícia de Campbell, nos anos 90.

Agora, se a história do Hip Hop não pode ser desassociada do seu caráter combativo em relação à polícia, Alckmin não pode ser lembrado sem que o ligue diretamente a uma figura entusiasta e perpetradora da violência policial.

Geraldo Alckmin (PSB), foi governador do estado de São Paulo por cerca de 16 anos e em sua estadia nessa cadeira, acumulou um longo histórico de violência policial. Foi Alckmin que colocou 2000 policias para por em prática o despejo mais violento de São Paulo, em Pinheirinhos, deixando cerca de 500 feridos e outros vários moradores que relataram ter levado tiros de borracha.

Além disso, foi sob gestão Alckmin que a maior chacina de São Paulo aconteceu. Em 13 de agosto, completa 8 anos da Chacina de Osasco que deixou 17 mortos e 7 feridos. E a manifestação de Alckmin após esses massacres é parabenizar os policiais pelas operações bem sucedidas. Essa é a relação de Alckmin com a polícia: esta última como um braço direto da aplicação da política neoliberal e burguesa dele que não corresponde à convivência pacífica com os movimentos culturais que emanam das periferias, mas que, na verdade, ataca esses espaços e, portanto, esses movimentos.

Após esse resgate histórico do Hip Hop e da trajetória de Alckmin com a violência da polícia, é importante fazer mais uma pontuação, dessa vez, sobre o cenário atual.

Só recentemente neste ano, por três vezes nos deparamos com a face mais cruel e grotesca do estado burguês: uma chacina no estado de São Paulo, do bolsonarista Tarcísio, no do Rio de Janeiro, do governador de extrema direita Cláudio Castro, e na Bahia, sob mandato de Jerônimo do PT. Além do assassinato do menino Thiago, que tinha apenas 13 anos de idade, e da menininha Eloá de 5 anos, pelas mãos da polícia.

É em meio a esse recente cenário de chacinas e da frente ampla que dá sequência à implementação de ataques que são passados desde Temer e Bolsonaro, como a Reforma do Ensino Médio, Trabalhista e da Previdência, e os ataques que vieram do próprio governo do PT, como o Teto de Gastos e Reforma Tributária. Essas medidas, frutos de um projeto neoliberal, significam diretamente a precarização da vida da classe trabalhadora, que encontra postos de trabalho com cada vez menos direitos e jornadas mais longas, além da juventude que tem toda a sua potencialidade roubada pelo capitalismo que a quer jogar nos trabalhos uberizados e terceirizados. Mas sabemos que esses ataques recaem pesadamente sobre os ombros da população negra e periférica, que além de sofrer com o ônus da crise capitalista, sofre direta e rotineiramente com a brutalidade da polícia, nas periferias.

É em meio a isto que Alckmin grava um vídeo em homenagem ao Hip Hop, em meio a uma frente ampla que tenta apagar sua face mais brutal de reprodução da exploração e opressão do capitalismo, que tenta apagar os vestígios de sangue das mãos de Alckmin que matou dezenas de jovens negros pelas mãos de sua polícia assassina no estado de São Paulo, e pelo PT que assassina com a polícia de Jerônimo na Bahia. É nessa tentativa de querer nos fazer crer que o Brasil voltou a sorrir e que o governo está do lado do "povo" que Alckmin grava o vídeo em homenagem ao Hip Hop. Mas não nos esqueceremos das mortes que ele tem em suas mãos.

A direita e o PT se colocam unidas a nível nacional com a materialização do governo Lula-Alckimin para selar o pacto da conciliação. Inclusive, historicamente nos seus governos aplicaram métodos de repressão contra a classe trabalhadora e a população negra junto à polícia. Por isso, a frente ampla não é capaz de dar uma saída ou uma alternativa às mortes sistemáticas da população negra e periférica, ela não ataca a raiz do problema que é o estado burguês. A polícia é o braço repressor que possibilita dar sustentação ao estado capitalista e é o cão de guarda da burguesia. Seu fim e com ele o dos assassinatos dos negros só é possível com a derrubada do sistema capitalista que se vale das opressões para explorar e assassinar a população negra. Por isso, a luta deve ser independente e pela completa emancipação da sociedade, em que não tenhamos mais a exploração do homem pelo homem e um estado que assassina brutalmente em nome dos interesses de uma única classe, mas para que Thiagos, João Pedros, Agathas e Eloás possam viver plenamente seus anseios sem que uma bala atravesse seus sonhos.


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Ana Clara Vaz

Estudante de Ciências Sociais na Unicamp e militante da Faísca Revolucionária e do MRT
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