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CARTA DE MICHEL TEMER | Carta de Temer: impeachment, fisiologismo e pressão por mais ajustes

A carta de Temer não é ainda uma carta de adesão ao impeachment mas para tentar colocar em xeque Dilma e o PT, qualquer passo em falso Temer e o PMDB assumirão o papel de vítimas e possivelmente se unificariam pelo impeachment. Uma aposta e uma chantagem em grande estilo? Uma preparação para o impeachment? O que esta carta mostra?

Leandro LanfrediRio de Janeiro | @leandrolanfrdi

terça-feira 8 de dezembro de 2015 | 11:47

Michel Temer é um político dos bastidores. Quando sai de seu habitual silêncio, sobretudo em tempos de crise política como os que vivemos suas mensagens são alvo de intensa análise e rebuliço nos palácios e redações. Foi assim quando declarou "que alguém tinha que unir o país" e agora com sua carta a Dilma Roussef. Como um ser político das profundezas analisar suas raras ações na luz do dia apontam movimentos profundos no regime político brasileiro e em um de seus principais sustentáculos, o PMDB partido que ele preside desde o longínquo 2001.

O vice-presidente vazou à imprensa sua carta "pessoal" a Dilma. Nela afirma do começo ao fim a desconfiança que Dilma, "seu entorno" e o PT nutrem sobre ele e o PMDB. Reafirma seu papel de político de bastidores afirmando-se de uma "natural discrição" à qual somou, diz ele, as exigências constitucionais de um vice-presidente, enumera o papel decisivo que ele teria tido para manter o PMDB unido e apoiando o governo Dilma bem como o papel dele e de Padilha (ministro que renunciou recentemente) para aprovar diversas medidas do ajuste fiscal. Feito isto elenca uma série de desavenças de Dilma e do PT com ele.

Adesão ao impeachment ou também abertura a uma chantagem em grande estilo?

Político discreto e dono de uma habilidade ímpar de unir o díspar Temer é um longevo presidente da federação de coronéis, caudilhos, corruptos, arrivistas, e garantidores de uma das chaves da estabilidade do país: o PMDB. Este partido herdeiro do bipartidarismo da ditadura controla, mesmo que muito encolhido com os anos, um quinto das prefeituras do país. São mais de mil. Praticamente sempre foi governo. Não foi governo formalmente em momentos do governo FHC e no primeiro mandato de Lula, mas nunca foi um partido opositor desde 1985. E mesmo certa independência "federal" nunca significou impossibilidade de "negócios" locais diversos, e vice-versa.

Todas as duas últimas décadas o país viu infinitos acordos distintos do PMDB com o PSDB e PT em planos regionais e federal. Este partido, com muito mais desfaçatez que o restante dos partidos do regime, troca de alianças conforme a habilidade de saciar sua fome. Cunha faz isto de forma caricata, Temer como um “lorde”, até esta carta.

Temer é um enxadrista. Joga calculadamente e espera o erro do adversário. Mas pode ter dado um passo mais arriscado do que o costumeiro. Começa sua carta com latim, mas poderia ter usado outra expressão latina "Alae Jacta Est" ("a sorte está lançada", frase que César teria dito ao cruzar o rio Rubicão com seu exército e pela primeira vez na história investir com o exército romano contra Roma, arriscando-se ser desterrado como ditador se perdesse ou coroado como o iniciador de uma nova era - a historia lhe reservou um pouco de ambos).

Temer cruzou seu Rubicão com esta carta.

Uma carta que em nenhum momento deixa claro nem a adesão ao impeachment nem a defesa de Dilma. Com uma habilidade singular de quem a 14 anos consegue unir interesses tão desencontrados preparou uma carta onde este partido louco por cargos, capitaneado pelo destemperado do Cunha parece um partido de anjos destratados pelo aliado PT. Porém, se Dilma ou o PT não lhe atacar vai ficar ele como um "ofensivo", com a vantagem de poder ser mal recebido mas não ter nada a temer, não tem seu pescoço a prêmio com impeachment, só tendo o que ganhar, a presidência ou mais espaço no governo, o que ele arrisca é seu lugar em seu partido.

A aposta de Temer é que, com esta "ofensiva epistolar", possa adotar a defensiva tática para sofrer ataques do PT e armar uma ofensiva estratégica. Porém, se o PT não agir corre o risco de mostrar-se fraco perante outros lobos cedentos por cargos em seu partido. E mais, pode fortalecer Dilma mostrando-a como vítima de mais um ataque e conspiração. Um risco que os próximos dias mostraram a validade da aposta.

A aposta de Temer é que qualquer ataque de Dilma ou do PT unirá mais o partido sob sua liderança e ameaçará uma ruptura maior e desenlaces, ou ameaças de desenlaces, no impeachment. “Vem, me ataque, que posso virar presidente da República”. É a frase que falta em sua carta. Porém, se não for atacado e outras figuras do PMDB surgirem ficará ainda mais como coadjuvante como vice-presidente. Algo, aparentemente, que não teme, a manutenção do status atual já é o "mínimo" que já tem garantido, porém suas posições no partido do fisiologismo podem ficar em xeque neste segundo cenário e assim determinar menos os rumos do partido em 2018, a verdadeira jogada que move as peças de seu partido.

Temer com esta jogada tenta não só enquadrar Dilma e o PT forçando-os a um jogo que tem que ser defender-se do impeachment contra o PMDB e o vice ou defender-se do impeachment, cedendo completamente ao mesmo. Também busca atingir um objetivo secundário com sua carta, enquadrar o PMDB do Rio que também terá que adotar uma escolha, com Dilma contra Temer e uma boa porção do PMDB ou com Temer. Nestas chantagens joga-se o impeachment e a sucessão de 2018.

Longe dos interesses dos trabalhadores e do povo estão jogando com as centenas de bilhões de reais dos cofres públicos não em torno de projetos políticos, mas da distribuição do botim desta guerra de “irmãos”, porque como a própria carta demonstra estão unidos em outra guerra. Nos ajustes fiscais, na guerra de descarregar nas costas dos trabalhadores a crise, estão todos bem unidos.

No lusco-fusco da crise política e econômica: mais PMDB e maior unidade pelos ajustes...

Em meio à crise econômica e a crise política não há mais atores centrais e “hegemônicos”. O PT se segura no governo depois do estelionato eleitoral e profundas e constantes crises de corrupção, o PSDB se prepara para angariar eleitoralmente o descontentamento e rupturas com Dilma e o PT, como já expressou em 2014, mas também não pode se impor plenamente e cada passo que dá não termina de ser um passo próprio mas um passo junto a Temer, junto a Cunha, etc, e para piorar não tem um projeto a oferecer que não a mesma receita amarga de ajustes.

Neste lusco-fusco onde não surge quem “unifique o país” como disse meses atrás o vice-presidente Michel Temer emerge da tríade PT-PSDB-PMDB que sustentam o regime do país o menos hegemônico dos três, o partido de Sarney, Cunha e do vice. E detrás de seu chamado de unidade que vieram uma série de declarações de entidades patronais como FIESP, bancos como Bradesco, Itaú todos em defesa da governabilidade, e ajustes.

Se, do ponto de vista político não há quem ofereça um projeto e unifique e organize setores da classe dominante e “coloque ordem” no parlamento há, no entanto, uma imensa unidade pelos ajustes. O próprio Temer destaca isto em mais de um ponto de sua carta indicando como ele se dispõe a ir mais fundo. Implementar seu “Plano de Ponte para o Futuro”. Para atacar direitos, reduzir gastos com saúde e educação e mesmo mexer na CLT e na Constituição contra a classe trabalhadora há uma importante unidade. Uma unidade que por hora, ainda é melhor para todos atores que seja conduzida pelo PT.

O PT que sofre o desgaste da crise econômico e todos podem se mostrar “bons moços” e ainda por cima o PT pode oferecer uma vantagem que nenhum outro partido do regime oferece: fazer isto controlando as ações do movimento de massas por via de seu controle sobre CUT, UNE, MST agora ampliada para englobar também o MTST e PSOL todos unidos “contra o retrocesso”, contra Cunha, e deixando de lado o combate ao governo Dilma e seus ajustes.

Em meio a tantas ameaças de ajustes, tanta chantagem e corrupção lutar por uma saída independente da classe trabalhadora

A carta de Temer visa fortalecer seu argumento a favor de ajustes mais profundos. Interesse este que é compartilhado por toda a burguesia e todos seus partidos, inclusive o PT. Podem divergir em como mexer nas aposentadorias e alguns detalhes mas se unificam, como já mostraram em todo o ano de 2015 para descarregar em nossas costas esta crise. Dilma corta o financiamento das universidades, Alckmin fecha escolas. No PMDB, Sartori e Pezão cortam salários do funcionalismo de seus estados. E bravatas à parte quando chega na hora de votar ajustes se unem, como bem mostra Temer que se gaba dos votos da oposição que conseguiu.

Tudo isto é exposto em meio a uma choradeira de um partido fisiológico em um regime carcomido por corrupção, negociatas, chantagens. Diversos pontos da carta de Temer versam sobre como tal indicado “a mim chegado” foi preterido. Mostra-se as entranhas deste regime, uma democracia que existe para garantir os interesses dos ricos e faz isto mantendo uma casta política a sua imagem e semelhança, corrupta e cheia de privilégios.

A luta dos secundaristas paulistas que conseguiu dobrar a intransigência de Alckmin, as diversas categorias que mostraram grande disposição de luta em greves contra aspectos dos ajustes, mostram como é possível e necessário desenvolver uma grande força política para se enfrentar com os ajustes que já existem e o aprofundamento que Temer, Dilma, Aécio planejam. É possível e necessário desenvolver uma terceira força política no país que erga esta disposição de luta das greves mas também avance no plano político, escapando da pressão para que a classe trabalhadora tenha que escolher entre um “mal menor ajustador e corrupto” ou uma “renovação” com os tucanos privatistas e os arqui-corruptos do PMDB.

O Esquerda Diário opina que uma saída independente seria impor com a força das mobilizações um Assembleia Constituinte Livre e Soberana que permitisse debater os grandes temas do país, desde acabar com os privilégios dos políticos impondo que todos ganhassem como uma professora e fossem revogáveis bem como debater as grandes questões sociais do país que os políticos se esforçam para esconder: saúde, educação, moradia, emprego, salário e como colocar os recursos naturais presa da privatização como a Vale e da corrupção como a Petrobras sob controle dos trabalhadores para garantir recursos para as necessidade de todo o povo.




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