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ESTADO DE EXCEÇÃO | O futuro do golpe jogado entre camarilhas parlamentares e o STF: arbitrariedades e ’estado de exceção’

O golpe em curso no Brasil toma muitas facetas e atores. Dois dos principais atores golpistas são o parlamento e o judiciário. Outro notório é a mídia com suas manipulações, escolhas de pauta, etc. Focaremos nos dois primeiros e como suas decisões estão configurando um verdadeiro estado de exceção no país. A decisão de Waldir Maranhão negada por Renan (que era aliado declarado de Dilma) abre nova conjuntura onde pesam os jogos parlamentares e a cada vez maior influência do "partido judiciário" nos rumos do país.

Leandro LanfrediRio de Janeiro | @leandrolanfrdi

terça-feira 10 de maio de 2016 | Edição do dia

Ao inimigo a lei, mas no tiroteio ninguém mais sabe quem é amigo, muito menos qual é a lei

Velho ditado brasileiro reza "aos amigos tudo, aos inimigos a lei", porém neste agressivo cenário político que combina-se com duros ajustes (e ainda mais duros prometidos por Temer), nenhum setor dos partidos da elite tem lá amizades muito duradouras e seguras, e todos tem algum juiz a curvar ou rasgar a Constituição em um verdadeiro estado de exceção não das botas militares mas das togas dos juízes e púlpitos parlamentares.

Renan, aliado declarado de Dilma ao menos até hoje deu seguimento ao golpe mesmo com a medida de Waldir Maranhão (PP-MA) na câmara. No jogo de caça ao butim do Palácio do Planalto amizade e lealdade não parecem ser algo que se negocie em contratos de longo prazo no país, ao sabor do dólar e sua montanha-russa.

Não faltam especulações sobre a quem a medida do maranhense atenderia, Cunha, o governador do PCdoB de seu estado, a si mesmo com promessa de cargo lá em suas terras. Especular na Brasília de hoje quem seriam seus verdadeiros "amigos" não é tarefa fácil. Independentemente, sua decisão abre nova conjuntura de incertezas no andamento do golpe e ela reforçará o papel do judiciário e seu estado de exceção.

Tenho uma interpretação da Constituição mas se não gostar posso te oferecer outra

O comediante americano Groucho Marx dizia: "tenho estes princípios, bem...se não gostar tenho outros". Este casuísmo oportunista cabe como luva nos discursos e votos parlamentares e do STF.

Todo o processo de impeachment foi construído usando intensa campanha midiática da Lava Jato que em si trouxe à baila métodos não convencionais ou diretamente ilegais, de escutas ilegais, a prisões sem julgamento e delações premiadas. Se fez com um setor dos poderosos a exceção que já se vive em morros e favelas com prisões sem julgamento, e outras medidas tomadas sobretudo contra a juventude negra. Mas o triunfo destas medidas e se mostrarem como normais com um ex-presidente, anuncia-se ainda mais duras medidas com os trabalhadores. Este é um dos motivos de princípio porque se opor a este golpe.

De posse da Lava Jato e sua investida ilegal e autoritária, o Supremo arvorou-se para rasgar a Constituição. Determinou que Lula, sem nunca sofrer condenação não poderia ser ministro. Toda oposição rejubilou. Quando o ministro do Supremo Marco Aurélio de Mello determinou que Cunha era obrigado a abrir impeachment também contra Temer, rasgava a Constituição, mas desta vez para aplauso petista e protesto opositor.

A votação de 17 de Abril por suas igrejas, divindades e herdeiros de suas casas grandes, além do reacionarismo mostrava a ilegalidade do ato, tratava-se de julgamento político "contra o ensino de gênero", "contra a ditadura comunista do PT", entre vários outros motivos dignos de nossa elite herdeira não só da escravidão mas da "Santa Inquisição". Pouco se falou sobre o tema em questão, as pedaladas fiscais.

O Supremo nada fez sobre esta ilegalidade. Seguiu avalizando o golpe.

Cunha ficou famoso por votar e revotar matérias até ganhar. Se não era rasgando a Constituição, era, digamos, lhe dando uma cara "amiga". Com a toga do Supremo foi vítima do mesmo casuísmo.

Poucos dias atrás tomou nova medida arbitrária, desta vez pra aplauso petista, tucano e peemedebista contra Cunha. Sem condenação, foi afastado de seu cargo como parlamentar algo não previsto na Constituição. Como disse o professor da USP e juiz do trabalho, Jorge Luiz Souto Maior sobre esta medida:

"Claro que não faço uma defesa de Cunha, mas acho que aplaudir uma decisão do Supremo que não tem base constitucional, que aniquila um mandato parlamentar sob o fundamento de preservar a democracia, que a própria decisão já admite que tenha sido arranhada pela atuação desse mesmo parlamentar, parece-me uma atitude que apenas reforça o Estado de exceção e que abre definitivamente a porta para que uma “caça às bruxas” se instaure por atuação do Supremo e das demais esferas do Judiciário, assim como das repartições públicas e privadas por aí… Ora, se fazem o que estão fazendo com uma Presidenta, se fazem o que fizeram com um Deputado Federal, o que não farão com os direitos civis, políticos e sociais do dito “cidadão comum”?

Agora, o novo presidente da Câmara propõe revogar a votação do impeachment. Intenso debate jurídico se abre se isto é válido juridicamente.

Qual lei vale? A que o Supremo quiser, quando ele quiser. Isto está provado e comprovado na história recente. Neste poder mais afastado do povo, aquele que sequer passa pelo voto está um ponto crucial do golpe e do estado de exceção.

Judiciário: de árbitro a agente no Estado de Exceção

Dia a dia, sob apelo petista ou tucano (ou do PMDB) o Supremo é chamado a arbitrar nos conflitos. Tem feito mais que arbitrar, ergueu-se acima de todos outros poderes para rasgar a Constituição quando lhe convier, seja para ajudar o golpista Temer a desferir seus duros ataques ou para partir a novos cenários que a cassação de Cunha possa ser somente um prelúdio de uma "Mãos Limpas" ou ao menos um cara de atacar mais partidos (por exemplo Aécio dos tucanos mas deixando o núcleo paulista intacto) e partir a uma operação de maior ataque ao PT, prendendo Lula nos próximos dias como muitos especulam.

Avançando ou não nas "Mãos Limpas", o Supremo e todo o " partido judiciário", incluindo aqui o MPF e a PF são os claros vitoriosos de todo o embate.
O judiciário que tem parte de seus membros, sobretudo Moro treinado pelo Departamento de Estado americano se fortalecerá.

Cada vez mais se autonomizam de qualquer controle civil e são chamados não a suas missões constitucionais mas para legislar, governar (levantamos em outro artigo a hipótese remota mas não descartável do próprio Supremo se colocar na linha sucessória atacado Renan, a quem não faltam denúncias) e além de entrar no jogo político favorecer as multinacionais em detrimento das "global players" brasileiras seja em terras pátrias ou não (todo o foco da delação de Odebrecht é atingir não só Lula mas a relação das global players com o BNDES).

Essa análise sobre o papel muito maior que de árbitro desempenhado pelo judiciário, sobretudo o STF tem motivado intelectuais a se pronunciar, como por exemplo um professor da FGV-RJ no El País. Ele afirma:

"O Supremo age, cada vez mais, como um maestro. Ou seja, ele é cada vez mais um mediador de disputas e cada vez menos um árbitro pontual. Para quem acredita que o Supremo deve ser um árbitro pontual, fica claro que essa decisão de afastar o deputado não pode ser justificada com base no texto constitucional. Agora, quem olha para o STF como um maestro, a decisão parece ser uma tentativa de corrigir problemas profundos de outros poderes."

Entre negociatas de podres poderes, assistir?

O PT apostou ontem, aposta hoje suas fichas em parlamentares da direita. Temem mais a mobilização das massas e sua radicalização que tomarem um chute no traseiro do poder.

Desde está perspectiva podemos sair da montanha russa de conjunturas no país. Não para a calmaria de cemitério que a elite quer de nós. Mas a uma resposta contundente contra o golpe e os ajustes. Para isso é preciso deixar só de assistir. O primeiro passo é exigir ações de verdade da CUT para que com a força da maior central do país tentemos dar um basta no golpe e nos ajustes. Mesmo que neste dia 10 se organize algumas manifestações e paralisações isoladas pelo país, estará longe do que é necessário: radicalizar as lutas contra o golpe e os ajustes, e frear o avanço da direita alimentada pelo PT passa pelo combate de princípio contra o fortalecimento das instituições autoritárias do Estado como o Judiciário. Uma luta como essa só pode se dar se for organizada pela base com assembleias nos locais de trabalho e estudo, colocando à frente os setores em luta com suas demandas, e não com jornadas burocráticas.

Hoje está luta tem que se redobrado como luta contra o golpe e os ajustes que tem sido enfrentados por setores do funcionalismo e sobretudo a juventude. Há um "dia de paralisações chamado pela CUT, CTB, porém, como escreveu Diana Assunção "O dia de luta anunciado para 10/5 pelas direções da CUT e outras entidades até agora se tratou de uma farsa, que não foi organizado em nenhuma assembléia, seguindo a dinâmica de não fazer nenhum plano de luta contra o golpe e os ajustes que deveria se inspirar nas duras e decididas lutas levadas adiante por secundaristas no Rio e São Paulo."

"A CUT, a CTB, a UNE não construíram esta paralisação. Este novo cenário recoloca na ordem do dia a possibilidade de uma luta decidida contra o golpe e ajustes. Exigimos da CUT, CTB e UNE ações urgentes para a paralisação de amanhã e uma verdadeira luta contra o golpe e ajustes."

A direita se fortaleceu graças a anos de negociatas petistas, anos de combate não dado. O "partido judiciário" idem. Está democracia do suborno com suas leis e interpretações não tem saída que não mais corrupção, mais medidas arbitrárias do Supremo. Para os marxistas revolucionários é obrigatório concluir que nenhum combate à corrupção e à impunidade capitalistas pode vir pelas mãos do Judiciário e da Lava Jato, e de primeira ordem combater seu fortalecimento reacionário (ao contrário do que acreditam PSTU e PSOL, que aplaudem os ministros do STF e querem “Lava Jato” até o final). Por isso propomos uma Assembléia Constituinte que não deixe pedra sobre pedra deste regime, que imponha pela luta dos trabalhadores que todos os juízes sejam eleitos, revogáveis e recebam o mesmo salário de uma professora, e o mesmo para os políticos de alto escalão; que tire das mãos de juízes julgar seus amigos de caso de veraneio nos casos de corrupção e coloque em mãos de júris populares, um sistema que ataque os lucros dos empresários para que eles paguem pela crise, no marco da luta por um governo dos trabalhadores que rompa com o capitalismo e o imperialismo.

Uma saída como esta contra os políticos burgueses e seus privilégios, lá juízes e suas arbitrariedades teria que surgir da luta dos trabalhadores e não de suplicas a nossos algozes.

(Foto: José Cruz/Agência Brasil)




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