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[POEMA] USP: um sonho desencantado, uma energia vital recuperada

João Ferreira

[POEMA] USP: um sonho desencantado, uma energia vital recuperada

João Ferreira

Poema por João Ferreira, estudante de História da UEMG e militante da Faísca Revolucionária.

Ter acesso ao ensino superior é o sonho de muitos jovens brasileiros. Estudar nas ditas melhores universidades, como a USP, conhecida por ser a "melhor universidade da América Latina", é um sonho ainda mais perseguido e desejado, embora ainda mais complicado. Como se não bastasse o filtro social e racial do vestibular e a farsa da "meritocracia" no sistema capitalista, que impede o sonho de muitos jovens, principalmente o dos mais pobres, deslocando grande parte para o desemprego ou o subemprego, a própria USP não escapa às contradições de uma universidade que não prioriza o atendimento às necessidades humanas, a garantia de acesso ao conhecimento e ao desenvolvimento das potencialidades des estudantes, mas que faz parte da dinâmica capitalista de acumulação do capital e que, por isso, precariza as condições de trabalho des trabalhadores e professores e também as condições de ensino des alunes. Diante dessa situação, a greve da USP, que se estende desde o dia 14 de setembro de 2023, e se soma a outras anteriores como a de 2002, renova as energias de luta des estudantes e resgata um poderoso movimento estudantil que avança com suas demandas e suas palavras de ordem, enfrentando toda a perseguição da reitoria e das direções da universidade. Esse poema, portanto, foi escrito como forma de expressar toda solidariedade a es estudantes que estão na linha de frente contra o alto comando da USP e também contra o governo bolsonarista de Tarcísio de Freitas (Republicanos).

Quem não sonha
E não quer seguir um sonho?
Um ideal, uma vontade, um futuro
Sentir o corpo vibrar diante da conquista
Da realização concreta das aspirações da mente
Da materialização daquela imagem
Que se vislumbra no sonho e no despertar
Que se cria na mente e guia as ações
Imperiosa, inabalável, utópica
E utópica até que seja verdade
Quem não sonha
Em estudar na USP?
Na grande referência latino-americana
Que tanto brilha nos currículos de professores e pesquisadores
Na USP!
E ter os melhores professores
Estudar nos melhores cursos
Número 1 da América Latina!
Ter a USP no currículo
Ter a USP como sobrenome
Levar esse bendito nome a todos os espaços
“Vocês estão falando com um uspiano!”
É preciso antes que eu mereça
Ainda é um sonho
Mas o esforço é evidente
O mérito é reconhecido no esforço
No trabalho, nas longas horas que atingem a madrugada
O cansaço chega, mas a vitória também
Assim como a ansiedade e a depressão!
Tudo isso por uma prova?
Não, tudo isso por um sonho
O sonho de milhões de estudantes
Empenhados no mesmo objetivo
No mesmo sonho
Ter acesso à universidade
Mas a USP é o meu sonho
E o sonho de milhões também
Iremos ser postos à prova
À frente de uma prova durante horas
Combatendo a fome e o cansaço
Compensa seguir esse sonho nessas condições?
Meu futuro é incerto
Tudo isso por nada
Ou tudo isso compensa?
Mas eis que sou aprovado
Merecido! Disseram familiares e amigos
A USP agora é meu lugar
Mas o que me foi tudo, foi vários nadas a outrem
O que foi minha vaga, foram várias rejeições
Eis que se repete o ciclo vicioso e cruel do filtro social!
Mas e agora, como tudo vai ser?
Abandonei emprego, amigos e parentes
Nada é fácil, porque nem tudo são flores
A USP me recebe de braços abertos
É o primeiro passo de um sonho!
Nova realidade, novos amigos, novos colegas
Novos cheiros, novas culturas, novos amores
Ao lado de quem teve o mesmo destino que o meu
O mesmo sonho que o meu
Mas nem tudo são flores
Onde estão os professores?
Cadê aqueles antigos sabores?
Se tornaram um palco de horrores
Sem professores, sem liberdade
Então era tudo um delírio?
Um sonho encantado de um jovem estudante
Que não colheu os frutos de seu mérito?
Mas será que existe mérito?
Senão, numa outra história seria livramento?
A história não é o destino fatal
É um processo real
Oriundo de múltiplas determinações
Sou sujeito e objeto da história
Ou a história não passa de um sonho
Ou um infindável pesadelo?
E descubro uma realidade profunda e obscura
Que não aparecia nas propagandas nem nos jornais
Nem nos portais, nas redes sociais
Conheço o descaso e o desamparo
A desilusão e o desencanto
Estudo a história que muda, mas que agora se encerra
A pedagogia crítica que se conforma aos padrões
Uma pedagogia repleta de aspirações
Com meu futuro incerto pelas conspirações!
Posso ter no currículo cada detalhe
da graduação
E concomitante ser alvo da precarização
E dar aula de “como chegar ao milhão”
Sem tempo, sem um tostão!
Mas os cartazes demonstram indícios
Me despertam curiosidade
Me envolvem, me fazem querer ser
Renascer, rejuvenescer
Sinto células e tecidos surgindo novamente
Renascendo como fênix
Brotando como rosas na primavera
E percebo a raiva, a revolta
Dos bastidores
Surge uma falange
E uma infantaria de lutadores
Com nada a perder se não seus grilhões
Murmuram com cada palavra de demagogia
Do chefe da reitoria
E fazem de seus cursos seus bastiões!
De Letras à Pedagogia
Da História à Geografia
Intimidando os porta-vozes oficiais da reitoria!
Das assembleias, surgem as greves
Nas greves, a paralisação
Que cede lugar à arte, à dança e à canção
Para o insuportável lamento da direção
E ter mais professores é a principal razão
O que se expressa em cada ação
E para que o japonês e o coreano
Estejam vivos a cada ano
Com o idioma de cada nação
De cada língua, de cada idioma, de cada
expressão
E o futuro esteja garantido
E não haja obstáculos na educação
Nem filtro, nem importunação
E o conhecimento esteja em nossas mãos
Estudantes, professores e trabalhadores da USP
Sua base de sustentação
E para superar o projeto de precarização
Somente, com nossas forças, criar organização
Nos governos, nenhuma confiança
Na reitoria, nenhuma ilusão
Responderemos em cada ação!

Todo apoio à greve des estudantes da USP, pela contratação de professores, em defesa do DLO e contra o NEM! Nenhuma confiança na reitoria e nem nos governos! Por um comando de greve eleito de forma democrática para que oriente uma greve viva e combativa frente a todas as intimidações da reitoria e da direção da FFLHC!


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João Ferreira

Estudante de História da UEMG e militante da Juventude Faísca
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