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OPINIÃO | Velório de Marisa Letícia: Lula acusa facínoras. Sinais políticos ditos e não ditos

Facínoras. Com esta dura expressão Lula se referiu aos que acusaram Marisa Letícia de crimes, e prometeu que o “lulinha paz e amor” iria batalhar muito. Com esse tom combativo e sua voz rouca embargada Lula terminou um emocionado discurso no velório de sua companheira. Hoje é um dia de emoções, qualquer internauta “médio” pode encontrar em sua timeline xingamentos de fascistas anônimos nas redes sociais, mas também, até mesmo na imprensa mais marrom, exaltações à concórdia e abraços de Lula e FHC. Para além das emoções, esse velório, o que foi dito e o que não foi dito, também é cheio de significados políticos e, a isso dedicamos primeiras opiniões.

Leandro LanfrediRio de Janeiro | @leandrolanfrdi

sábado 4 de fevereiro de 2017 | Edição do dia

A cerimônia realizada no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, berço político dele e do PT, tinha como principal público presente apoiadores do partido, sindicalistas e personalidades políticas ligadas aos movimentos sociais, sobretudo, mas não exclusivamente, aqueles ainda ligados ao PT. Estava anunciado que esse era o público do velório, mas chama a atenção de qualquer observador o movimento de “abertura” a golpistas no Sírio e o “fechamento” ali. Com exceção do governador Pezão do PMDB quase nenhuma outra figura para além dos partidos que denunciaram o golpe institucional estava ali presente.

Todo velório é momento de lembrar dos que se foram, amparar os mais tocados mas também de colocar o papo dos vivos em dia.

Muito mais quando se trata de uma ex-primeira dama e de um ex-presidente da República que foi e segue sendo uma das figuras políticas mais influentes do país, liderando pesquisas de opinião para futuras eleições.

A parte do “papo dos vivos” foi cuidadosamente separada em dois movimentos diversos, porém que parecem convergir politicamente. Um, no Sírio, onde cada interlocutor de Lula cuidou de vazar informação à imprensa e uma outra parte, de massa, que incluía emotivos abraços de cada presente no ex-presidente, e seu discurso visto por milhões de brasileiros.

Os vazamentos à imprensa das conversas no hospital cuidaram de mostrar duas mensagens políticas: Lula estaria disposto a sentar-se com golpistas; e, é preciso ter uma costura política que acalme os ânimos. Uma mensagem vazada parece indicar Lula disposto a dar dicas a Temer de quando e como realizar a reforma da previdência, outras não. Essas outras focam mais no âmbito de reestabelecer laços e diálogos cortados, oportunidades para construir pinguelas políticas para tertúlias sem alvos declarados.

O emotivo discurso no Sindicato dos Metalúrgicos tinha algumas mensagens políticas centrais. Aqueles que perseguiram Marisa Letícia são facínoras e serão combatidos. E referenciando-se em uma sua vida conjugal e familiar fez uma metáfora para um pacto político democrático, cada um ceder um pouco.

Os facínoras, não há quem não entenda como uma referência à Lava Jato e ao judiciário e, por ser parte da engrenagem político-midiático-judiciária dos últimos tempos também deveria se estender a algumas redações de jornais, revistas e televisões. Mas quem quiser interpretar esse alvo na fala de Lula é bom colocar as “barbas de molho”. A mídia nunca foi um alvo preferencial de Lula (quanto blogueiro progressista pequeno ou grande, muito ou pouco influente, tentou convencer da importância de alguma medida contra os oligopólios da mídia nos longos 13 anos de mandato petista) e agora torna-se ainda mais improvável justamente quando na grande mídia também há sinais de que é possível reconstruir pontes (veremos em breve se o movimento dos últimos dias se mantém e com quais objetivos).

A importante colunista da Folha, Mônica Bergamo, publicar no dia do velório que Lula foi intimado pela justiça no dia 17 (daqui a 13 dias) seria um sinal de que setores da mídia querem jogar a opinião pública contra a Lava Jato? Soa como uma provação pensada ou não que expõe mais uma vez a imperial e arbitrária soberba de auto-declarados e super-bem-remunerados pretorianos separadores do joio do trigo nacional. Estaria em curso um movimento pelo pacto? Na mídia mais alinhada ao PT está. Veremos brevemente se para as famílias Marinho, Frias, Civitas, Mesquita também.

Voltando ao dito e não dito pela grande imprensa. Quantas linhas e imagens dedicadas a conversa de Lula com Gilmar Mendes e FHC, e a curiosa e gritante ausência de relato (se existiu) qualquer ligação de Carmen Lucia, Janot e qualquer membro destacado da ala mais Lava Jato ou ao menos “independente” do “partido judiciário”. Daquele que aconselhou Renan no combate a Lava Jato, há extenso relato.

Gilmar Mendes parece, bom ressaltar o “parece”, não entrar no rol dos facínoras. Nem Temer. Nem FHC. Nem Renan “parece”. Seria possível costurar um pacto contra os facínoras da toga? Deixando outros facínoras de direitos dos trabalhadores, facínoras do sufrágio popular de lado? Seria essa mensagem entre o dito e não dito?

O dito e também o não dito em ambiente tão solene e emotivo como um velório deixa algumas poucas certezas e muitas inquietações.

As inquietações são inescapáveis quando na saída do sindicato rumo ao terminal Ferrazópolis do “trólebus” se vê imponente no horizonte a Volkswagen, símbolo do último ascenso da classe trabalhadora brasileira. E, no mesmíssimo caminho ao terminal, não se pode escapar de tantos operários transformados em camelôs e outros tantos com seus uniformes e sua “sorte” de seguir empregados voltando de sua labuta de sábado. Enquanto isso trama-se em outros lugares contra os direitos trabalhistas, contra as aposentadorias, corta-se da saúde e da educação, vende-se a Petrobrás, o pré-sal.

Dos pactos tantas vezes costurados, de Sarney a Collor a Maluf ao “centrão” e até mesmo aos banqueiros, o que obtivemos? A “Volks”, ali em frente, relembra do potencial de outro caminho, da "velha" luta de classes, que terá que se erguer contra velhos e novos obstáculos para barrar os desejos de muitos facínoras.


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Lula    Política



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