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ANÁLISE
Como fica o governo Bolsonaro com a ruptura de Sergio Moro
Leandro Lanfredi
Rio de Janeiro | @leandrolanfrdi

A renúncia de Sérgio Moro produzindo graves acusações contra Bolsonaro parecia abrir uma conjuntura que poderia levar a queda de Bolsonaro. O respaldo militar ao presidente foi crucial para sua sustentação, e esta ação provocou realinhamentos no STF, no Congresso, nos governadores.

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Sexta-feira passada havia uma incerteza no ar se Bolsonaro seguiria na cadeira presidencial. A ruptura de Sergio Moro e da Lava Jato com o governo Bolsonaro está provocando um profundo realinhamento das forças golpistas. O bloco de sustentação ao governo Bolsonaro, que incluía os militares, a Lava Jato e parte do mercado financeiro está se alterando com a passagem da Lava Jato a oposição. O Congresso, e a casta política, o centrão, que não morrem de amores pelo presidente, também – e talvez muito menos – não se sentem cômodos em uma aliança com Moro que poderia fortalecer os poderes da decadente Lava Jato.

O apoio militar foi decisivo para o reacionário presidente. A alta cúpula das Forças Armadas, especialmente do Exército mostra que a opção de desfazer a aliança não é seu primeiro plano, o que poderia implicar em pressão pelo impeachment ou renúncia, e para que ela assumisse publicamente as rédeas do governo. Evidentemente essa orientação de alinhamento e respaldo pode se alterar, e bruscamente, em meio ao agravamento da pandemia e da crise econômica, mas o que a atual situação indica é um alinhamento mais estratégico entre os militares, com um aliado incômodo, mas ainda assim aliado, Bolsonaro. A fotografia atual mostra um comprometimento da cúpula militar, e sua ação, junto com a passagem de Moro para a oposição, está provocando realinhamentos em todos poderes e frações golpistas, com especial destaque para o STF e sua decisão de se colocar como fator político.

Na mesma sexta-feira passada vimos a imagem do presidente discursando com todos seus ministros, e portanto o infindável generalato da Esplanada, atrás de si. No dia seguinte vimos contundente tweet do General Ramos em seu apoio. Algumas cúpulas de igrejas evangélicas que tinham feito pronunciamentos equidistantes entre Moro e Bolsonaro voltaram a se pronunciar em defesa do presidente, numerosos partidos do centrão guardaram silêncio e quando foram se pronunciar o fizeram diminuindo a importância da crise política, como fez o PSD de Kassab, ou o mesmo que fez Rodrigo Maia depois de longuíssimo silêncio.

O peso que ganharam os militares como fator de poder está visível no número de ministérios e cargos de segundo escalão que ocupam, está presente em sua tutela a ministérios formalmente dirigidos por civis. Na recomposição e compra de apoio parlamentar a Bolsonaro está um general de “interlocutor” do centrão (general Ramos), na pressão de boa parte da burguesia para que Guedes deixe seu ultraliberalismo por um neoliberalismo adaptado às necessidades econômicas e de contenção social em meio a pandemia está outro general, Braga Netto, o mesmo que também tutela o ministério da saúde.

Toda gritaria entre militares e Paulo Guedes sobre o plano Pró-Brasil parece temporariamente acalmada. Mas só temporariamente. Guedes teve que engolir parcialmente seu programa de não aumento dos gastos públicos e por outro lado pode apresentar do lado de Braga Netto sua interpretação do vago Pró-Brasil. O general veste a carapuça de chefe de todos ministros, e com esta palavra “chefe” foi chamado por Guedes em entrevista de imprensa no dia 29/04. Nesta ocasião o Chicago Boy “traduziu” o powerpoint militar sem detalhes com as platitudes de investimento privado em saneamento, gás, petróleo e eletricidade. Em um mundo em crise, com petróleo negativo, Guedes promete bilhões em investimento privado em petróleo, por outro lado recebeu sinal verde pra garantir – com aval militar, com direito a entrevistas de Mourão e tudo – congelamentos de salários de servidores públicos.

A tensão entre ultraliberais e generais porta-vozes de um neoliberalismo adaptado às novas condições de pandemia (tal como notáveis tucanos em muitos jornalões) está marcada para se desenvolver quanto mais se aprofunde a crise econômica, e com ela a necessidade e preocupação de investimento estatal para diminuir a tensão social, o medo da luta de classes. Entre Guedes e militares há um certo armistício.
Os elementos de crise na forma estatal, com desafios que apontavam a ruptura da cadeia de comando entre união, estados e municípios se resolveu semanas atrás com a presença militar no comando. Acompanhado essa resolução houve uma pequena reviravolta política, enquanto no final de março Bolsonaro parecia totalmente isolado de todos governadores e até seu aliado Caiado (DEM) rompia com ele, quando governadores do PSL como Comandante Moisés de Santa Catarina pareciam enfrentados com a cúpula evangélica (especialmente com Malafaia), agora Bolsonaro consegue até ter um governador (ibaneis do DF) de tiracolo permanente para mostrar “institucionalidade” e boas relações com os estados. E do ponto de vista econômico uma mudança também pode operar debaixo da tutela militar, uma mudança que já estava anunciada com Mandetta, mas que vai operando dia a dia.

Foi possível uma solução intermediária entre o fim de todo isolamento social, como propugna Bolsonaro até hoje, e continuidade das quarentenas sem testes, nem leitos, nem respiradores, que impunham os governadores de todos estados. Agora temos uma situação em que a maioria dos estados, e especialmente as áreas mais ligadas à produção de commodities são liberadas mesmo em estados onde segue algum tipo de isolamento em suas capitais e regiões metropolitanas, como é o caso do Rio Grande do Sul e pode vir a ser o de São Paulo nas próximas semanas. Essa liberação lucro acima de tudo e todos já está levando a uma explosão de casos em Blumenau, Santa Catarina, terra que além de indústria em geral, indústria ligada ao agronegócio também abriga a sede dos negócios do reacionário Luciano Hang.

Mas nem todos batem continência na crise política. O judiciário, especialmente o STF, perfila-se para oferecer à burguesia seus serviços próprios de árbitro na condução da crise, abrindo novos flancos de crise.

O STF se prepara para disputar os rumos da crise política

A cada punhado de horas há um pronunciamento ou um veredito judicial do STF de grande importância. Esse ritmo de produção marca uma novidade das últimas semanas e que se acelerou com a renúncia de Moro e depois com o respaldo militar a Bolsonaro: o STF quer ele se tornar o arbitro. A mais alta cúpula da burocracia civil quer voltar a desempenhar o papel de primeiro violino do golpismo, papel que cumpriu em boa parte dos fatos políticos entre 2016 e 2018, mas isso agora a coloca num enfrentamento com os generais do governo, uma novidade potencialmente desestabilizadora.

Depois de numerosas decisões que enfraquecem o poder do Executivo Federal, portanto de Bolsonaro mas também de Braga Netto e dos militares, o STF deu aval a investigação contra Bolsonaro. Essa investigação que, a depender das ações de Aras pode levar a uma votação de afastamento do presidente. A primeira decisão do decano Celso de Mello tinha dado um prazo de 60 dias para que houvesse depoimento de Moro, ontem à noite ele acelerou fortemente os ritmos da denúncia, exigiu que fosse realizado em no máximo 5dias e o depoimento está ocorrendo agora neste sábado, 02/05. , à tarde.

A decisão de Celso de Mello não é fortuita. Ela acontece depois de evento em que Bolsonaro criticou decisão de Alexandre de Moraes em impedir a nomeação de Ramagem na PF, neste evento estavam presentes Gilmar Mendes e Toffoli. Bolsonaro interpretou que a existência de uma ala do STF que está disposta a dialogar com ele e com os militares como um aval para enfraquecer o STF, e escalou no tom das críticas na quinta-feira. A resposta togada foi rápida e contundente, diversas associações judiciais se pronunciaram em apoio de Moraes. Todos ministros do STF, inclusive Toffoli e Mendes, se pronunciaram em apoio, a justiça federal paulista determinou que Bolsonaro tem que mostrar seu exame de Covid, e mais importante, Celso de Mello retaliou colocando o depoimento de Moro para já, situando-o no centro da política nacional da próxima semana.

Legislativo dividido por Bolsonaro, por Moro e por sede insaciável de cargos

No outro canto da Praça dos Três Poderes, vemos um legislativo também em movimentação buscando se adaptar a um governo que encontra respaldo militar e resiliência, até o momento, sempre bom frisar, em uma parcela da opinião pública. Rodrigo Maia que falava duro contra Bolsonaro semanas atrás adota um perfil baixo e de não confronto, deixando claro que não irá (por enquanto) colocar em pauta o impeachment, mirando sua relação com sua base do “centrão” e mesmo se não negocia com militares o “preço” de uma postura menos oposicionista a Bolsonaro. Alcolumbre, por sua vez, assume um papel de interlocutor aberto de Bolsonaro e de Guedes, e no varejo o bolsonarismo tenta comprar uma base de apoio em parcela do centrão.

Aliar-se com Moro não é a primeira opção de boa parte do centrão, e a lógica do inimigo do meu inimigo favorece, provisoriamente que seja, Bolsonaro. As “compras” miram garantir votos para barrar um eventual impeachment e tem como alvos o PR (com fortes ligações a cúpulas evangélicas), o PP de Maluf, PSD de Kassab, PTB de , Solidariedade de Paulinho da Força. Há que se ver o sucesso da compra de Bolsonaro, mediada pelo General Ramos nessa relação com o Congresso, e como essas relações podem evoluir e se sustentar conforme evolua a crise política, os impactos sociais da crise sanitária e econômica.

Rumo ao trágico pico da pandemia enquanto agrava-se a degradação institucional com mais e mais poder dos atores sem voto

Desde 2016 vemos mais e mais poder para forças sem voto, sejam elas os militares ocupando mais e mais lugares na esplanada, o bolsonarismo, ou o judiciário que tanto blindou e ajudou a que Bolsonaro chegasse ao poder em uma eleição manipulada para garantir a continuidade do golpe e sua agenda. Enquanto na crise política do governo Dilma havia evidente protagonismo judicial e da mídia, havia toda uma aparência de deputados reacionários tomando o protagonismo mesmo que fosse para atacar o sufrágio, agora não, os rumos colocam uma primazia ainda maior no generalato ou no STF.

Observar essa degradação do regime político que assume mais contornos “pre-bonapartistas” coloca ainda maior evidência no desproposito político de propugnar que Mourão seria um “mal menor”, que o topo das aspirações podemos ter em nosso ódio a Bolsonaro seria substitui-lo por um general também defensor do golpe militar de 1964, também defensor dos ataques aos trabalhadores de um Guedes ou Bolsonaro. É necessário vincular a luta pelo Fora Bolsonaro a também Mourão e os militares e a partir daí avançar a questionar todo o regime, cada vez mais degradado, em uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana que coloque no poder da população o debate sobre os rumos do país.

A luta independente dos atores golpistas, teve um passo inicial na construção de um primeiro de maio que denuncie que não há espaço para FHC, Witzel, Leite em nenhum ato de trabalhadores como fizeram as maiores centrais do país, tais como CUT, CTB, Força Sindical, seguindo a orientação de “frente ampla” proposta por Lula. Esta escandalosa posição foi criticada toda a semana pelo MRT e por este Esquerda Diário, e saudamos a iniciativa das entidades e sindicatos que romperam com esse ato, e realizaram um ato independente. Neste ato colocamos a necessidade de não só se contrapor a chamar inimigos nossos, mas avançar da luta contra Bolsonaro mas também contra Mourão e os militares, e batalharmos por ações unitárias também no plano das respostas emergências à pandemia, para impedir as demissões, garantir renda e outras reivindicações urgentes em meio ao agravamento das condições econômicas, sanitárias e políticas no país.

 
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