Imagem de janeiro de 2020 mostra pia quebrada em banheiro de escola de Samambaia, no DF — Foto: TV Globo/Reprodução, disponível aqui
Recentes estudos científicos realizados pela Revista Science, apontaram que crianças têm uma carga viral de coronavírus semelhante à dos adultos. Os dados foram apresentados aos parlamentares da Comissão de Educação da Câmaranesta segunda-feira (29) pela coordenadora do Laboratório de Epidemiologia da Universidade Federal do Espírito Santo, Ethel Maciel.
O inquérito sociológico feito no Espírito Santo com 1693 crianças e jovens até 22 anos apontou que a incidência do vírus neste grupo é de 6% – bem próxima à da população adulta, que é 9% –, que 35,3% dos estudantes estavam assintomáticas e somente 26% tiveram febre.
Para a pesquisadora Ethel Maciel, os estudos mostram que a medida mais eficaz é o distanciamento seguido de barreiras técnicas como filtros de ar – através de máscaras eficazes, por exemplo. “A gente precisa mensurar o CO2 desta sala. Porque pode ser que numa sala eu possa colocar 30 e em outra eu não posso colocar nem 10. Isso varia dependendo da ventilação e do tamanho da sala”, afirmou Maciel.
Com base nesse estudo podemos demonstrar como os meios escolhidos pelos estados e municípios para viabilizar o retorno às aulas são bastante insuficientes, especialmente nas escolas públicas.
Um deles, a aferição da temperatura de crianças e adolescentes, é uma medida que se mostra bastante ineficaz diante da alta proporção de casos que têm desenvolvimento assintomático.
Outro fator tem se mostrado um grande limitante: as condições estruturais das escolas da rede pública de todo país. Já é sabido que em mais da metade das redes estaduais e municipais do país a ventilação das salas de aulas são consideradas inadequadas, segundo resultado do SAEB, tabulado pelo Pindograma para Folha de São Paulo, a avaliação federal da educação básica realizada pelo Ministério da Educação (MEC).
Segundo dados do Censo Escolar 2020, coletados pelo portal G1, coletados em março do ano passado, o déficit estrutural das escolas – uma realidade histórica, como sempre denunciamos no Esquerda Diário – chega a extremos como o fato de que, em 2019, 3,5 mil escolas públicas não tinham banheiros, o que representava 2,4% do total. Em 2020, esse já escandaloso dado aumentou para 4,3 mil, sendo 3,2% do total.
Outro elemento estrutural é a internet banda larga, que não chegava a 15 mil escolas urbanas em 2019 (18,1%) e, em 2020, não chegou para 17,2 mil (20,5%). Além disso, 35,8 mil escolas ainda hoje no Brasil não têm coleta de esgoto, o que equivale a 26,6% do total. Antes, eram 36,6 mil (27,1%).
O que se vê é uma profunda debilidade estrutural das escolas e inúmeros indícios científicos sobre seu potencial papel no aumento da contaminação, em um momento onde vivenciamos o Brasil bater 4 mil mortes diárias em decorrência da gestão irracional da pandemia e da crise política, econômica e social que vêm sendo descarregada nas costas da classe trabalhadora e de seus filhos, que precisam da escola pública. Neste contexto, apesar de os governos estaduais, municipais e o federal muito debaterem para buscar impor a reabertura das escolas, fica evidente que pouco fizeram para viabilizar isso.
Os governadores mantiveram a mesma política que utilizam há décadas de manter as salas de aulas super lotadas. Em São Paulo, por exemplo, manteve-se a realidade de mais de 40 alunos por sala oficialmente, o que gerou rodízios de estudantes onde houve volta às aulas. No entanto, os trabalhadores da educação historicamente defendem que as salas de aula deveriam ter no máximo 25 alunos – o que, em meio a pandemia, mostra-se ainda um número muito alto, já que a maioria das salas de aula não tem ventilação adequada e nem espaço para o distanciamento físico.
Ethel Maciel deixa claro que o país está longe de uma reabertura segura hoje.
Segundo dados divulgados pela Fiocruz, o grau de transmissão é acima de 1, o que significa que 1000 infectadas transmitem o vírus para mais de outras 1000 pessoas. E quando falamos das escolas públicas e mesmo particulares – que não estão isentas de surtos virais, como vimos acontecer com a reabertura, em especial em grades estados e capitais, como tivemos em São Paulo e Brasil à fora – estamos falando de redes de ensino imensas, com milhões de estudantes, educadores e trabalhadores, além das comunidades escolares, como os familiares dos estudantes e todo o entorno das escolas.
Para o retorno das atividades presenciais é inevitável a vacinação de toda a população, tendo em vista que as novas variantes da covid vêm afetando cada vez mais os jovens. A política que o governo de São Paulo tenta implementar com o aval da APEOESP no estado, e de sindicatos como o SINPEEM no município de São Paulo, vacinando apenas uma pequena parte dos profissionais da educação e jogando a grande maioria aos leões, assim como todos os estudantes – que são a maioria esmagadora das redes de ensino – é uma medida extremamente limitada e insuficiente a partir das exigências básicas que fazem as comunidades escolares: de condições sanitárias para o retorno seguro, afinal, não aceitamos que deem continuidade às centenas de mortes de estudantes, trabalhadores da educação e terceirizadas do chão das escolas públicas de São Paulo, o que se mostra como uma realidade de todo o país.
Para isso é fundamental que o ângulo das entidades como os sindicatos já citados aqui, dirigidos pela CUT e CTB – as maiores centrais sindicais do país – rompam com seu imobilismo e paralisia e parem de atuar de fachada, desperdiçando propositalmente o potencial da classe trabalhadora brasileira e de categorias como a das trabalhadoras da educação, para se enfrentar diretamente com governos como Bruno Covas (PSDB), João Doria (PSDB), Jair Bolsonaro (sem partido) e Mourão (PRTB), que, apoiados em todo um regime golpista, diga-se de passagem, têm um objetivo em comum: nos fazer pagar pela profunda crise que vivemos e que foi agravada pela pandemia.
O PT e o PCdoB, à frente dessas centrais, cumprem, politicamente, um papel igualmente capitulador no Congresso, nos estados e municipais onde são governos. Buscam conciliar interesses inconciliáveis da classe trabalhadora junto aos partidos burgueses que viabilizaram todos os ataques contra os nossos direitos, escancarando sua grande estratégia: abrir caminho para eleição de Lula em 2022, perdoando os golpistas do impeachment e instituições como o Congresso, o STF, os militares, que de arbitrariedades com essa e da prisão de Lula sem provas, têm as mãos sujas de forma indiscutível e cada vez mais evidente.
Fica cada vez mais evidente que qualquer viragem no curso desse jogo, onde morremos aos milhares e perdemos cada um de nossos escassos direitos, só virá da nossa entrada em cena e, certamente, o papel das educadoras desse país nesse processo é indispensável. Atropelar a paralisia de grandes burocratas, como Bebel (APEOESP) e Claudio Fonseca (SINPEEM), da CUT e da CTB e derrotar a narrativa do golpe, levantando as demandas da nossa classe, como a vacina para todos, um auxílio emergencial suficiente, a revogação das reformas e grandes debates, como a necessidade de se construir uma Assembleia Constituinte livre e soberana, esses são os principais debates e inflexões que queremos fazer junto à nossa classe e ao conjunto da esquerda que defende uma perspectiva de independência de classe neste país, a fim de enfrentar narrativas como a que aponta a que, enquanto escrevemos esse texto, apenas na rede estadual de São Paulo, 51 vidas foram ceifadas pela irracional política de Doria, Covas e Bolsonaro.
|