G De Poesia
o grito congolês me rasga
eu choro
como?
como que morre sem receber
dinheiro suado
Brasil é uma mãe?
abraça, acolhe?
"a gente sai da África pra trabalhar"
acolhe,
acolhe...
escolhe quem merece o mel
e quem merece o fel
e quem merece o ferro ardendo
nas costas
a madeira estala
ninguém reage
reage?!
reage!
como que morre assim
a paulada
porque ousou
querer receber uma diária
eu choro de ódio
o absurdo sempre me rasga
sempre me explode
como que pode
como que a gente não vira comunista
revoltado
como que a gente não revida
como que não vira um soco na cara de fascista
como?
como vou comprar a comida?
se tá tudo caro
como vou respirar mais um dia?
e mais um dia
tem um que não respira mais
a gente pira
lendo notícias dos jornais
como jorra o sangue negro
congolês
ardendo de vez
na areia dessa cidade
maravilhosa
o Rio de Janeiro continua lindo
e continua palco da escravidão
que as vezes nem se camufla
a bala dispara
o chicote estala
a madeira, a navalha
como a gente não surta nessas horas
Moïse, me desculpa
por esse acolhimento as avessas
esse encolhimento de humanidade
amontoado nos escombros da vaidade
e da ganância burguesa
como que não pira?
como que vira a página?
como que termina a rima
se ele não pôde terminar o dia?
o Rio de Janeiro
tem o cheiro
de sangue negro
africano
e congolês
e mais uma vez
não se pode respirar