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PSOL
Daciolo: PSOL expulsará seu "Bolsonaro"?
Leandro Lanfredi
Rio de Janeiro | @leandrolanfrdi

O bombeiro militar carioca Cabo Daciolo, líder de dois motins dos bombeiros contra o governador Sérgio Cabral, conseguiu esta semana mais um feito direitista em meio a um mandato parlamentar que tem poucas semanas, mas já está coroado de reacionarismo. A executiva do PSOL do Rio de Janeiro quer sua expulsão do partido.

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Dias atrás o deputado federal tomou a tribuna para defender os policiais, “injustamente presos” segundo ele, do caso Amarildo. Não dirigiu uma palavra de solidariedade a sua família ou aos milhares de parentes de outros “amarildos” do país. A reação da executiva do PSOL do Rio de Janeiro não tardou. No mesmo dia haviam anunciado sua separação dos quadros do partido por dois anos e solicitado à direção nacional que examinasse sua imediata expulsão.
Um mandato reacionário e polêmico

Antes mesmo de sua posse Daciolo já estava envolvido em uma polêmica. Polemizou com o governo Dilma por escolher um civil para chefiar o ministério da Defesa, exigia que fosse um general, brigadeiro ou almirante. Sem mencionar nada sobre o papel da alta cúpula das Forças Armadas na ditadura ou na dificuldade de obtenção dos mais elementares documentos para se conhecer a verdade do período, o deputado militar se colocava com este pleito à direita da tradição até mesmo da direita ocidental que aceita, faz séculos nos EUA, por exemplo, que um civil comande a Defesa.

Passados poucos dias surgiu uma nova polêmica. Seu partido estava participando de uma campanha midiática de declarações e selfies contra Bolsonaro que havia a poucos dias declarado que uma ex-ministra de Dilma “não merecia ser estuprada por ele”. Eis que minutos depois de participar de foto do PSOL criticando Bolsonaro o bombeiro deixa-se fotografar sorridente e abraçado com o próprio Bolsonaro.

Poucos dias atrás seu posicionamento público foi de inédito reacionarismo. Propôs uma emenda constitucional teocrática ao primeiro artigo da constituição brasileira. Ao invés de “todo o poder emana do povo”, como está escrito hoje, ele colocaria que “todo o poder emana de deus”. No dia seguinte surgiram vozes no PSOL do Rio pedindo que ele saísse do PSOL. No mesmo dia os parlamentares, com aparente protagonismo de Chico Alencar e Freixo chegaram a um acordo com ele: que retire seu projeto e continue defendendo o que quiser.

Agora a gota d’água foi com o caso Amarildo.

Este reacionarismo é uma surpresa?

Todos estes posicionamentos não são nenhuma novidade. Todos posicionamentos do líder do motim dos bombeiros em todos estes anos sempre foram expressamente militares, religiosos e de direita. Seu confronto com o governador Cabral nunca o levou a afirmar uma só frase contra o essencial da política de segurança: nunca criticou as UPPs, nunca criticou os autos de resistência, o racismo estrutural das polícias. E mais, nunca mencionou as milícias, e até as areias da praia sabem, no Rio uma boa parcela dos bombeiros está relacionada com esta força extra-oficial.

O principal programa do deputado sempre foi o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) 300, que equipara os salários de bombeiros e policiais militares de todo país aos de Brasília, multiplicando-os, tornando esta “profissão” assassina e repressora melhor remunerada.

Daciolo nunca se colocou como um “salvador de vidas” e que portanto poderia ser um civil, pelo contrário, mesmo na ausência da PM nos motins sempre se considerou um membro de uma só “família militar”, que passaria dos generais do exército, ao BOPE ao último guarda-vidas da praia.

Ninguém nunca se viu um só discurso de Daciolo que não terminasse em uma exaltação que tudo no mundo só acontece por obra de “Deus”.

Então qual a surpresa dele agora querer colocar o que ele sempre falou em prática, na constituição, em projetos de lei, em posicionamentos que apontam para apoiar os PMs e não as famílias dos executados pelos mesmos?

O PSOL realmente o expulsará?

Alguns meses atrás em meio a polêmica para um militar assumir a defesa escrevíamos em um artigo que o PSOL encontrava-se em uma encruzilhada pelo problema colocado a si mesmo ao aceitar Daciolo. Por um lado deveria tomar medidas contra ele porque o principal eleitorado do partido são as classes média, a juventude e setores do proletariado que se identificam com as classes médias, o “progressismo carioca”. Por outro lado não poderia radicalizar nas medidas contra Daciolo pois este falava do alto de 49mil votos, muitos deles colhidos na capital, justamente a mãe de todas batalhas eleitorais do PSOL se concentra: Freixo 2016.

A executiva do Rio, onde a corrente Insurgência é maioria pronunciou-se pela expulsão. Curiosamente, não há nenhum relato público desta corrente ter se posicionado contrário à filiação do bombeiro. Apostavam que seu candidato a deputado Federal, o vereador carioca Renato Cinco, teria mais votos que o bombeiro e com esta ajuda dos votos do povo de “deus e da caserna” galgariam um posto em Brasília. Erram nas contas e antes aconteceu o contrário. Agora o próprio Cinco que assumiria o cargo caso fosse pedida a cassação de Daciolo apressa-se e clarificar que a posição do partido é pela expulsão mas que o cabo mantenha seu assento no parlamento, para não “alienar” seus votantes. Não querem desagradar o imenso contingente de bombeiros e militares visando 2016.

Nos motins de bombeiros e policias de 2011 e 2012 todas correntes do PSOL, e inclusive muitas fora deste partido, como o PSTU foram os mais ardentes defensores não só das reivindicações dos amotinados como de suas lideranças. O presidente regional do PSTU declarou publicamente, poucos meses atrás, como lamentava que Daciolo houvesse escolhido o partido de Luciana Genro e não o seu. Correntes internas do PSOL como a CST do agora vereador Babá, adotaram por muitos meses como uma de suas principais reivindicações a PEC 300. O mesmo pode-se verificar da corrente MES de Luciana Genro. “Curiosamente” estas duas correntes internas do PSOL, minoritárias no Rio, não emitiram nenhum pronunciamento sobre a expulsão de Daciolo. Votarão por sua expulsão, ou continuarão flertando, buscando se aproximar, dos muitos ainda que reacionários votos dele?

Luciana Genro que conquistou votos com seu confronto verbal com o reacionário Fidelix, que agora chegou a ser multado pelo que disse, permanecerá calada? Seu confronto na TV buscava somente angariar votos? Este Bolsonaro-Fidelix dentro do partido será confrontado?

Também não se conhece uma declaração pública de Freixo, grande interessado em que seu partido aparece como “progressista” mas não “radical”, para se mostrar alternativo, porém viável (do ponto de vista burguês) para 2016. A ala majoritária nacional, liderada por Randolfe Rodrigues (senador pelo Amapá) e Ivan Valente (deputado federal por SP) também não se pronunciou. Porém, esta mesma ala, já se contrapôs a resoluções da executiva do Rio, como a que expulsava ex-deputada estadual e a agora assessora de Daciolo, Janira Rocha.
Muita água pode ainda passar debaixo desta ponte, independente das diferentes variáveis sobre expulsão ou não maiores contradições se colocam para o PSOL.

Interrogações sobre os caminhos do PSOL

Há muitos atores em jogo que não gostariam de expulsar Daciolo, de Freixo a Ivan Valente e Randolfe a até mesmo, não se sabe que posicionamento podem ter Luciana Genro e o MES, além de cálculos sobre o perfil do partido, eleições do Rio se soma a disputa nacional por cargos, e enfraquecer a corrente majoritário do Rio pode ser um cálculo de diferentes grupos internos.

O desejo de Freixo e da ala majoritária nacional é disciplinar Daciolo, buscar “entrar” em sua base de votos e minimizar as contradições de seus pensamentos com a imagem do partido. Seu pensamento é “maior” que Daciolo está focado é em prefeituras, câmaras, e de preferência a da segunda maior cidade do país.
Pode ser que por pressão dos fatos algumas destas figuras ou correntes mudem de posicionamentos e passem a defender a expulsão do militar. Isto significaria um passo à esquerda do partido?

Apesar de declarações à esquerda do que vinha sendo seus posicionamentos nos últimos meses o PSOL tem adotado um discurso independente da direita e do governo na crise política nacional. Este discurso ainda não tem se convertido na utilização de suas “posições”, como os parlamentares, no movimento estudantil, e mesmo que minoritárias, nos sindicatos a favor de que emerja um “terceiro ator”. A hipotética expulsão de Daciolo combinado a este novo discurso já desperta algum apoio de pessoas independentes nas redes sociais a favor deste partido. Porém, estes passos não poderiam significar uma mudança do PSOL para que se torne mais “identitário” e “militante”.

Na situação política nacional não há espaço para ficarmos somente nas declarações, há diversas e duras greves em curso, iniciais porém diversas mobilizações estudantis, uma politização massiva, e uma profunda crise do governo e seu partido, o PT. São tempos de “militância”. E justamente este é o acordo que unifica todas as correntes do PSOL, cada uma delas pode ter a sua militância, mas o PSOL não pode ser um partido militante, unificado, atuam como uma frente eleitoral de reuniões periódicas e consórcio de votos.

Não há nenhum passo sério sendo dado para tornar o consórcio, partido. Até mesmo onde a esquerda é majoritária, como no Rio, e houve votação congressual de criar “núcleos partidários”, esta votação ainda parece ter ficado ao vento. E qualquer passo “militante” também esbarra em um outro problema sem solução neste partido e suas correntes: militância do que? De cidadãos? De classe média? De jovens? De Trabalhadores? Como se articulariam? Todo um debate de estratégia e programa precisaria se instalar para dar passo mais firmes em “militância”.

Por outro lado além do debate “militante”, está ocorrendo um debate sobre a afirmação de um PSOL mais duro, com uma “identidade” clara sobre quem pode entrar nele ou não. Porém isto também afeta os cálculos de suas principais correntes e figuras. Querem um partido da “nova política”, talvez um PODEMOS espanhol como declara Luciana Genro. Lembremos a definição que a segunda principal figura deste partido espanhol faz de seu partido “nem de direita nem de esquerda”.

Os limites deste giro “identitário” se mostram no mesmo Rio de Janeiro, a mesma executiva do Rio de Janeiro que havia aceitado a filiação de Daciolo e recusado a do deputado estadual Paulo Ramos, ex-policial e com principal votação justamente nas policias, agora trabalha calmamente com o mesmo. Expulsa Daciolo mas Paulo Ramos não?

Expulsar Daciolo colocaria maiores pressões sobre cada figura pública do PSOL, haveria o que nenhum parlamentar reformista quer: vigilância da base sobre suas ações. Poderá este partido adotar este caminho que contradiz toda a militância de suas correntes, parlamentares a anos senão décadas?

Por outro lado não expulsar Daciolo, falando tanto do progressismo de seu partido, fazendo dezenas de filiações em comício em praça pública “contra a direita” como fizeram recentemente em Niterói, não implicaria também um desgaste dentro do partido e em seu eleitorado?

A encruzilhada do PSOL tornou-se maior. Tornar-se mais duro e militante e deixar de ser o que todas as suas direções buscam, ou tolerar o intolerável em nome do “realismo” de crescer e conquistar mais cargos? Todas soluções intermediárias adiarão a resolução desta contradição, porém acrescentando problemas a lidar hoje e mais ainda no futuro quando estes debates se cruzarem mais e mais com a crise política nacional, deterioração da situação econômica e os grandes desafios colocados à esquerda.

 
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