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Independência de governo | UP-FENET vira conselheira na transição de Alckmin com a direita e os neoliberais

A Unidade Popular anunciou que Caio Said, ex-candidato a deputado pelo partido no Distrito Federal e tesoureiro da Fenet (Federação Nacional dos Estudantes do Ensino Técnico), será parte do conselho consultivo do GT de juventude na equipe do governo de transição. Por trás de todo seu discurso "radical" e "combativo", vemos a velha conciliação de classes stalinista. Bastou o PT oferecer um carguinho secundário de conselheiro do MDB para ver esse partido anunciando feliz sua entrada na equipe de transição com neoliberais e a direita.

Odete AssisMestranda em Literatura Brasileira na UFMG

quarta-feira 23 de novembro de 2022 | Edição do dia
Caio Sad em post da Fenet anunciando a participação no governo de transição

Seria esse o motivo do silêncio dessa organização quanto a presença de todo tipo de neoliberais, empresários e políticos de direita na transição? Na contramão de qualquer crítica a conciliação de classes, a presença dessa organização como conselheiro de uma equipe repleta da mais alta burocracia petista da juventude e até mesmo de um integrante do MDB, indica qual caminho que esse partido pode trilhar no futuro governo Lula-Alckmin. Conforme viemos debatendo, a composição da equipe de transição serve para confirmar algo que Lula fazia questão de deixar claro durante a campanha eleitoral: seu futuro governo será junto com os grandes empresários e políticos burgueses, defensores das reformas e dos ataques que tanto afetam nosso povo, e não vai revogar medidas implementadas ao longo dos últimos anos que foram nefastas para a vida da juventude e da classe trabalhadora como as reformas trabalhista, da previdência e do ensino médio - pelo contrário, conta, na transição, com os articuladores dessas reformas.

Depois de ficar em silêncio sobre a composição da equipe de transição, a Unidade Popular anunciou que será parte do Conselho Consultivo do GT de juventude. Que conselhos a UP tem a dar a uma transição repleta de inimigos da juventude? Ambiciona esse partido trilhar o mesmo caminho de integração ao regime que vem sendo feito pelo PSOL, aquele que a UP por vezes chama de "esquerda liberal"? Além de não defenderem demandas básicas da juventude como a legalização das drogas e a separação da igreja do Estado, a UP diz ser o "reencontro da esquerda com a periferia", mas na prática o que vemos é um discurso aparentemente combativo e popular encobrindo a velha conciliação de classes, aconselhando os que abrem espaço aos inimigos do povo pobre.

Ocupar a posição de conselheiro em uma equipe cujos representantes fazem parte das principais burocracias do PT e do PCdoB, que buscaram conter a juventude deixando passar terríveis ataques à educação nos últimos anos, conforme debatemos nesta nota, é no mínimo contraditório com o discurso que esse partido faz em algumas universidades pelo país. Quando disputam eleições de entidades estudantis em chapas separadas do PT e do PCdoB, eles discursam que são uma alternativa a essas burocracias majoritárias da UNE, sem nunca explicar por que em sindicatos importantes, como o dos Metroviários de SP, a UP saiu na mesma chapa que essas burocracias. Mas tudo sempre pode piorar e a equipe que a UP vai ser conselheira conta também com um membro da juventude do MDB, o mesmo partido de Simone Tebet e Michel Temer, que em 2016 sob as bombas e repressão ao movimento estudantil aprovou o teto de gastos, além de ter sido um promotor do golpe institucional e das nefastas reformas que atacam nossas vidas. Um pequeno detalhe que o representante da UP não mencionou ao anunciar sua participação como conselheiro dessa equipe.

Compreendemos quando muitos jovens quiseram expressar seu ódio a Bolsonaro pela via do voto, e inclusive estaremos na linha de frente diante de qualquer ameaça golpista, mas isso é diferente do papel que tem a participação de organizações como o PSOL e UP nessa equipe de transição, que na verdade só serve para alimentar ilusões de que é possível disputar a administração do Estado burguês. Algo que em si mesmo é impossível, como diria Marx, o Estado é o balcão de negócios da burguesia e não o terreno de combate dos revolucionários. Consequentemente a localização de conselheira, que a UP está se propondo a ocupar diante do governo Lula-Alckmin, também não é o caminho para fortalecer uma alternativa socialista em nosso país. É o oposto dele.

Apesar do inegável reacionarismo da extrema direita que já anunciou que vai fazer uma implacável oposição de direita ao futuro governo, existe uma grande movimentação das mais diferentes alas do regime para controlar os bolsonaristas e garantir uma “transição” bastante organizada. Buscando inclusive apagar qualquer papel que teria que ter a mobilização da classe trabalhadora, da juventude e dos movimentos sociais de forma independente do novo governo eleito. Ao ser conselheiro da equipe de transição, a Unidade Popular, vai mostrando também de fundo qual é a lógica por trás da sua política bastante adaptada de defesa da “democracia”, como vimos quando Leonardo Péricles posava para foto ao lado de reacionários como Kim Kataguiri e Joice Hasselmann, pedindo que o congresso comprado por Bolsonaro com o orçamento secreto aprovasse o impeachment. Ou mais recentemente na carta em defesa da democracia junto com a FIESP, a FEBRABAN e grandes representantes da burguesia. Essa localização de conselheiros se mostra como a continuidade da política que essa organização teve durante as eleições, que depois de apoiar candidatos do PT em vários lugares, fizeram uma campanha bastante acrítica no segundo turno, posando lado a lado de Marina Silva, Simone Tebet e toda frente ampla.

Ao tomar essa decisão, a UP comprova novamente como o stalinismo rompe com pilares básicos do marxismo, conseguindo, em menos tempo do que levaram para legalizar o partido, perder a pose de revolucionários radicais. Por isso, é sempre bom retomar a polêmica de Rosa Luxemburgo quando essa questão de um socialista estar no governo burguês se colocou pela primeira vez no movimento operário internacional:

Mas o gabinete ministerial não é, em geral, um campo de ação de um partido na luta de classes do proletariado. O caráter de um governo burguês não é determinado pelo caráter pessoal de seus membros, mas por sua função orgânica na sociedade burguesa. O governo do Estado moderno é essencialmente uma organização de dominação de classe cuja função reguladora é uma das condições de existência do Estado de classe. Com a entrada de um socialista no governo, o domínio de classe continua existindo, o governo burguês não se tornará um governo socialista, mas o socialista se tornará um ministro burguês. As reformas sociais que um ministro amigo dos trabalhadores pode realizar não têm nada de socialista em si mesmas, serão socialistas na medida em que forem obtidas através da luta de classes.

Como muito bem colocou Rosa Luxemburgo, o papel dos socialistas é lutar por construir uma força independente da administração do Estado capitalista, lutando também para que as entidades de massas da classe trabalhadora e da juventude tenham essa independência. O que no Brasil atual passa pela defesa de um programa que tenha como tarefa elementar a revogação integral de todas as contrarreformas, e busque atacar os lucros capitalistas, desrespeitando a reacionária Lei de Responsabilidade Fiscal e defendendo o não pagamento da dívida pública, sendo que este dois últimos elementos de programa sequer são defendidos pela UP. Passa também por enfrentar a precarização do trabalho e o desemprego com a divisão das horas de trabalho entre empregados e desempregados sem redução salarial e com o reajuste automático dos salários de acordo com o aumento da inflação. O que nos permitiria atacar mais profundamente esse sistema de exploração e opressão, que agora busca mascarar com um verniz “democrático” da transição “responsável” para manter os lucros e interesses capitalistas. Uma tarefa que nós do MRT e da juventude Faísca Revolucionária estamos batalhando em cada local de estudo e trabalho para que seja levada em unidade com outros setores que se colocam no campo da oposição de esquerda ao PT, apesar das inúmeras diferenças que existem entre as organizações. É justamente por isso que fazemos debates como esse, resgatando os fundamentos da tradição marxista para guiar a prática atual.

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