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Greve marcada | Lula vai privatizar o Trensurb de Porto Alegre?

É mais fácil conhecer a verdade sobre alguém a partir de suas ações do que a partir daquilo que a pessoa diz ou pensa de si mesma. Essa mesma lógica pode ser aplicada para a avaliação de governos e políticas em nossa sociedade, ou, como diz a máxima marxista, a prática é o critério da verdade. A resistência dos trabalhadores do Trensurb hoje é o principal obstáculo para a privatização, pois se depender da prática do governo, a empresa será vendida em breve.

sábado 6 de maio de 2023 | Edição do dia
Foto: Guilherme Almeida

A campanha eleitoral de Lula e Alckmin, no ano passado, foi marcada por um zigue-zague político. Ora criticava a reforma trabalhista, ora assegurava que iria manter. Ora criticava o teto de gastos, ora garantia que não iria revogar. O discurso duplo serviu para responder à base eleitoral e ao mesmo tempo acalmar os ânimos dos grandes empresários e mercado, os fiadores da Frente Ampla. A mesma coisa se deu com as privatizações. Lula chegou a retirar do Plano Nacional de Desestatização (PND) empresas como os Correios ou a EBC nesse início de mandato, mas manteve várias outras, como é o caso do Trensurb. São inúmeras áreas da economia que o PND abarca, como se pode ver aqui, e Lula apenas retirou do plano outras 6 empresas, mantendo dezenas a mais. Será que o Trensurb, de Porto Alegre, será a primeira empresa a ser privatizada pelo governo Lula-Alckmin? Se depender do governo, não há dúvidas. Mas a resistência dos trabalhadores está aí para construir um importante obstáculo.

Responsável por transportar cerca de 107 mil usuários por dia em 2022 e interligar a capital gaúcha com outras seis cidades da zona metropolitana, o Trensurb é um dos principais meios de transporte da região e sua venda seria um crime. São mais de mil funcionários, 22 estações e 38 anos de uma história que está vendo a ameaça da privatização mais próxima do que nunca. Como está ocorrendo com a Carris, a privatização significa a perda de empregos e precarização da empresa - tudo em nome do enriquecimento de um punhado de acionistas. Quem paga a conta somos todos nós, em especial os metroviários que estão com seus empregos ameaçados, e lutar em defesa do Trensurb é uma luta da maioria da população da zona metropolitana.

Lula sabe muito bem que o Trensurb está na lista da privatização. O caso do metrô de Belo Horizonte é categórico sobre esse tema, já que o governo não só não moveu uma palha para impedir o arremate que teve início no governo Bolsonaro, como autorizou a venda. Sobre os processos de privatização em curso, Rui Costa, ministro-chefe da Casa Civil, não deixou pedra sobre pedra: “Vamos modelar portos, aeroportos, projetos para atrair investimentos. Os que estavam prontos, como o metrô de Belo Horizonte, nós concordamos que ocorresse. Os outros, nós vamos ajustar a modelagem. Se é privatização, se é concessão, se é PPP, nós vamos identificar para cada projeto”. A frase foi dita no contexto da privatização do metrô de BH e se relaciona bem com o caso do Trensurb. Com o mesmo vocabulário neoliberal dos governos anteriores, o objetivo é "atrair investimentos". Já se passaram cinco meses desde a posse e mais de 6 meses desde que Bolsonaro saiu de cena, mas até agora o mesmo presidente escolhido a dedo por Bolsonaro, Pedro Bisch Neto, ainda segue no cargo máximo da empresa. Por que Lula não retirou esse neoliberal e privatista da empresa até agora?

Ações como essas mostram que o governo está decididamente disposto a privatizar o Trensurb. Não é desconhecimento da situação. Não é falta de tempo. Não é calma. Não existe “deixa o homem trabalhar”. São escolhas conscientes e, como a máxima do início do texto diz, a prática é o critério da verdade. Lula escolheu autorizar a privatização do metrô de BH, assim como manter o presidente bolsonarista no Trensurb e a empresa na lista do PND. E agora o processo segue. Isso ocorre devido aos compromissos que o governo travou com a burguesia desse país, como se vê em uma série de outras medidas do governo (como o neoliberal Arcabouço Fiscal de Haddad, a manutenção da reforma trabalhista e da previdência, os ministros bolsonaristas e pró CPI do MST, o apoio ao bolsonarista Arthur Lira, entre outras). Diferentemente do que pregam por aí, a história do PT não é uma história alheia a privatizações - a bem da verdade, as prefeituras do PT na década de 1990, como Palocci em Ribeirão Preto, foram pioneiras do neoliberalismo ao privatizar serviços públicos antes mesmo do FHC. Mas não é preciso ir décadas atrás para encontrar exemplos, Dilma privatizou portos, aeroportos, rodovias e o famigerado campo de Libras, enorme campo petrolífero entregue a iniciativa privada. Não seria a primeira vez de um governo petista, mas seria o primeiro do Lula 3.0.

O principal obstáculo à realização desse crime é a mobilização dos trabalhadores em aliança com os usuários, organizações e movimentos sociais. Os metroviários do Trensurb já marcaram uma importante greve para o dia 8 de maio, inicialmente de 24 horas, como parte de mobilizações que visam barrar o processo de entrega. É urgente que todas as organizações e entidades sindicais se comprometam com essa luta e façam parte ativa da greve, com apoio ativo nas ações e protestos que os trabalhadores estão organizando. Os e as parlamentares de esquerda possuem o papel importante de denunciar esse crime em curso, bem como de dar visibilidade a essa luta. A greve do metrô de São Paulo conseguiu derrotar Tarcísio a partir da unidade da categoria e da união com a população. É preciso se espelhar nessa vitória para pensar os rumos da luta em Porto Alegre e construir um caminho sem arrego para derrotar a privatização em curso e lutar por um transporte 100% estatal e sob controle dos próprios trabalhadores e usuários.




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