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INTERNACIONAL | Macron quer saída da quarentena sem garantia sanitária para garantir o lucro dos patrões

Durante um discurso de 25 minutos, Macron se afogou em uma mistura de empatia e gratidão, mas dando informações muito limitadas sobre a estratégia de “desconfinamento” do executivo. Em suma, nenhuma garantia de saúde nem social para as e os trabalhadores. Mas, para os patrões estão anunciados montes e montes de dinheiro.

sexta-feira 17 de abril de 2020 | Edição do dia

11 de maio como ponte de inflexão; até lá o confinamento continua...

Está anunciado para 11 de maio a abertura das portas, trazendo o fim do confinamento. É muito longe e muito perto. A data está muito longe para uma população que não pode mais suportar os danos sociais, financeiros e psicológicos que são sentidos mais e mais a cada dia. Mas também está muito próxima se considerarmos os especialistas científicos, que afirmam que esse tempo é muito curto para ser capaz de se preparar boas condições sociais e de saúde, considerando todo o atraso acumulado.

Ao invés do discurso de Macron trazer alívios para os trabalhadores, ele apenas bajulou com palavras quem está lutando na linha de frente contra essa crise. Contudo, não apresentou nenhuma pauta concreta em benefício dos e das trabalhadoras, nem no presente e nem no futuro. Até o 11 de maio, a situação será como agora (provavelmente pior), após essa data serão reabertas as escolas, para um retorno “progressivo” das atividades. Em resumo: “business as usual”, frente a uma total incerteza sobre a saúde, Macron mostrou uma improvisação absurda.

Por enquanto, prevalecem o confinamento e as regras impostas por decretos e ordens. Mesmo que tenha demonstrado empatia com aqueles que sofrem, Macron alcançou um impasse cauteloso no isolamento dos idosos, no aumento da violência familiar, na precariedade que ocorre, nas situações financeiras dramáticas nas quais os mais precarizados são encurralados pelos bancos e começam a deixar de comer. Também não deu nenhuma resposta efetiva contra as desigualdades sociais que explodem entre os jovens estudantes, mas também entre os que enfrentam estudos à distância, sobre a escassez de moradia e o desaparecimento de recursos. Muito menos sobre os imigrantes ou os sem-teto ...

Diante desses dramas concretos há um silêncio ensurdecedor. Macron abandonou até a empatia ao revelar, de maneira dissimulada, sua tendência policial e bonapartista de administrar tanto a crise da saúde como o resto das crises sociais. Ele agradeceu a "disciplina" de seus concidadãos, para poder dizer que é "graças à vigilância de nossa polícia". Em outras palavras disse "eu tenho razão em usar a coerção". Ele também reafirma sua intenção nestes termos: "as regras não devem ser mais rígidas nem mais leves, mas aplicadas".

Mesmo que o Macron teve cuidado para não mencionar o "tracking" e a geolocalização, medidas que o presidente confia na assembleia para serem aprovadas, é evidente que sua lógica continua sendo a do autoritarismo e da polícia. Uma escolha política contrária à sugerida por muitos especialistas que defendem uma resposta na saúde para combater a epidemia: testes massivos, inclusive entre pessoas assintomáticas, para isolar e rastrear o vírus e quebrar as cadeias de contaminação. Macron não quer se comprometer com isso, é claro, preferindo limitar-se a testar apenas as pessoas que têm sintomas e, quanto ao resto, confiar na coerção da polícia e nas sanções.

O fim do confinamento, uma resposta às súplicas feitas por Medef

De fato, mesmo que foi muito curto e engasgado no centro do discurso, a mensagem essencial é aquela que Macron endereça aos patrões, em resposta direta à mensagem lançada há poucos dias pelo presidente do Medef, alegando a retomada imediata das atividades sob pena de desastre econômico - lê-se perda de lucros - e a necessidade de um rápido retorno aos "business as usual.” Macron diz que recebeu o sinal 5/5, dizendo que "os setores econômicos têm de poder produzir". O 11 de maio é a data mais próxima que ele conseguiu encontrar, sem causar grande tumulto entre os trabalhadores da saúde, disse Macron frente a uma grande patronal impaciente e que já imagina como recuperar os lucros, querendo impor 60 horas por semana de trabalho, pelas férias remuneradas... Uma medida sem data limite que não é mais nem menos que um rascunho do futuro do trabalho. Para finalizar, ele anunciou novos subsídios estatais que permitam religar os motores da máquina.

Além disso, é interessante notar que a primeira abordagem para sair do confinamento anunciada por Macron, na perspectiva da "progressividade" que ele propõe, é a reabertura das écoles (grandes escolas técnicas), faculdades e escolas de ensino médio, mas não a universidade... Como não ver nessa prioridade, que obviamente poderia esperar até setembro pelo menos, um vínculo com a volta ao trabalho dos pais “em todos os setores econômicos”. Mesmo que isso signifique jogar as consequências para professores, alunos e todos que se envolvem nesse ambiente, por causa das interações sociais que a atividade escolar gera. Os professores, assim como os pais dos alunos não se enganam, e já começam a reagir enquanto Blanquer teve que rapidamente colocar que a afirmação lunática do presidente vai ser reajustada.

Fim do confinamento sem medidas preventivas: um prato cheio para o coronavírus

Uma estratégia de desconfinamento progressivo, é efetivamente o que a equipe da Vittoria Colizza (Instituto Pierre Epidemiologia e Saúde Pública, Inserm et Médecine Sorbonne Université) recomenda. Tal equipe produziu um estudo aprofundado, realizado na ilha da França. A diferença entre o estudo e a fala de Macron está em como fazer essa retomada. Nisso, a fala de Macron está muito longe de ser acertada. A pesquisa mostra que a taxa de imunidade do grupo precisa, para ocorrer um declínio natural da epidemia, deve ser de pelo menos 60% da população, atualmente é de apenas 3%. Mesmo que progrida, obviamente não será suficiente até 11 de maio. Consequentemente, sair do confinamento sem progressividade controlada e medidas intensivas de apoio, seria correr o risco de quase 100% de um novo pico dramático da epidemia. Teria de ser pelo menos 40 vezes maior o número de leitos de reanimação do que existe hoje, indica a pesquisa para tal volta.

A principal hipótese, de certa forma mediana em termos de progressividade, apresentada pelo estudo seria a seguinte: manter o teletrabalho em 50%, interromper 50% das produções não essenciais, manter o fechamento das escolas e o confinamento dos idosos. Em um mês, isso reduziria o risco de propagação em 80%. Imaginamos o que poderia ser se parássemos 100% de produções não essenciais, como preconizado por nossa campanha. Mas obviamente não é isso que o cenário apresentado por Macron nos oferece, reabrindo as escolas como prioridade e autorizando o livre retorno a todas as atividades industriais - para aqueles que estão efetivamente parados hoje, o que está longe de ser o caso em setores com concentração significativa de trabalhadores, como aeronáutica - bem como atividades comerciais, com exceção de restaurantes e locais de lazer, colocando claramente os interesses capitalistas na frente da saúde pública.

Quanto aos meios que acompanhariam esta volta, nenhuma garantia séria é dada. O estudo citado insiste, no entanto, na necessidade de acompanhar o desconfinamento gradual, com testes em larga escala para isolar os infectados em hotéis. Conforme divulgado pela France Inter, com base no estudo de Inserm "apenas uma pesquisa intensiva para encontrar os portadores do vírus, a implementação de testes e a colocação em isolamento de pessoas contaminadas possibilitarão um relaxamento nas medidas de contenção. Uma ideia que o atual diretor geral de saúde, Jérôme Salomon, contestou ecoando o discurso de Macron, de que essa "não é uma necessidade específica". Outra necessidade absoluta é prover para os hospitais e para a população, todo o estoque necessário em termos de máscaras, géis, equipamentos respiratórios, etc.

Sair do confinamento sim, mas sob quais condições?

Macron não deu uma resposta séria às perguntas que a população coloca para o futuro. É certo que ele não é adivinho e não pode prever os ritmos da pandemia, mas é responsável pelo que está fazendo para erradicá-la. Enquanto a isso, ele simplesmente promete pontos regulares e se contenta em dizer que tudo será feito e que, eventualmente, venceremos.

Sobre as vacinas e tratamentos, estamos falando há vários meses como soluções eficazes, mas ele se contenta em dizer que tudo está sendo estudado e que estamos trabalhando nisso. Que medidas ele pretende tomar para colocar toda a atividade de pesquisa e o aparato produtivo a serviço da resolver a crise da saúde? O que ele está esperando para acelerar os processos de produção e requisitar, controlar, forçar os laboratórios privados a cooperar, e proibir as ofertas mercantis? A produção de máscaras de qualidade, cujas necessidade é inúmeras vezes mais altas do que aquilo que ele anuncia. Ele tem mais alguma coisa a nos oferecer, além do truque do "do it yourself" e do uso de boa vontade, ao invés de obrigar todas as fábricas capazes de produzir as máscaras, a reconverterem sua produção para isso? O mesmo vale para roupas de proteção, géis, equipamentos médicos, etc...

O que precisamos é de uma economia totalmente orientada para a proteção social e da saúde da população. A palavra de ordem de "Parem as produções não essenciais" será mais fundamental do que nunca no momento da saída do confinamento.

O retorno ao trabalho deve ser apenas para produções essenciais e sob o controle dos trabalhadores. Devem existir comitês de saúde e segurança, compostos por delegados eleitos e com plenos poderes para estabelecer as condições de proteção dos trabalhadores e interromper a atividade, se necessário, no caso de um surto epidêmico. Longe de produzir, por marcha forçada, para reabastecer as reservas e os lucros dos patrões, os trabalhadores devem reduzir e reorganizar as horas de trabalho, contratando desempregados.

Quanto aos que terão de permanecer confinados por mais tempo, que propostas de acomodação decente, que subsídios de subsistência ele oferece? Nada ... No entanto, terá que ser fornecido.

O fim do confinamento que precisamos é o oposto do que Macron está anunciando e, principalmente, do que já fez. Em fiel apoio a Medef, o presidente continuará entregando nossas vidas, assim como já vem fazendo. Ao invés de resolver a crise na saúde, Macron toma medidas que podem agravá-la em muito.




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