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SEMANÁRIO

Karl Marx e a importância da ação política para a classe trabalhadora

Gonzalo Adrian Rojas

Shimenny Wanderley

Karl Marx e a importância da ação política para a classe trabalhadora

Gonzalo Adrian Rojas

Shimenny Wanderley

Os 205 anos do nascimento de Karl Marx é um novo convite a revisitar seu legado teórico e político. Neste artigo, de forma breve, pretendemos destacar a importância da ação política para classe trabalhadora em alguma de suas obras

A partir da análise crítica da filosofia alemã, do socialismo francês e da economia política inglesa, como apresenta Lenin nas Três fontes e as três partes integrantes do marxismo, escrito na ocasião dos 30 anos de sua morte em 1913, consegue realizar uma superação dialética articulando economia, política, filosofia e história, entendidas como separações analíticas de uma realidade que faz parte de uma totalidade social.

Desta forma realizamos duas observações preliminares, quando nos referimos a importância da ação política para a classe trabalhadora em Marx é desde uma perspectiva revolucionária e se bem destacamos a política esta não pode ser entendida do ponto de vista epistemológico senão desde o ponto de vista da totalidade ou total social como assinalamos no parágrafo anterior.

Apresentaremos algumas observações sobre o tema que vão aparecendo em algumas de suas principais obras e que sempre tem relação com uma tática de intervenção na luta de classes do proletariado no marco de uma estratégia revolucionária. Esclarecemos como fizemos em outros artigos, que não é intenção esgotar o tema um temário por definição inesgotável já que cada livro de Marx mereceria uma análise específica. Realizamos um recorte em termos de teoria e filosofia política, desse modo, não abordaremos suas contribuições na crítica da economia política burguesa. Algumas das considerações mencionamos parcialmente em outros artigos de Ideias de Esquerda como neste

Entre dezembro de 1843 e 1845 escreve um conjunto de textos que buscam acertar contas com a filosofia clássica alemã, mas que tem uma clara importância política e econômica. Estes textos são Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, A questão judaica, os Manuscritos econômico-filosóficos, A ideologia alemã e as Teses sobre Feuerbach.

Na Introdução a Crítica da Filosofia do Direito de Hegel (dezembro 1843 - janeiro 1844) destacamos a relação entre a crítica religiosa e a crítica da política, a crítica irreligiosa, a crítica do Estado e é uma de suas primeiras menções ao proletariado como sujeito político da Revolução. Marx nos mostra a necessidade de ir além da crítica à religião, já realizada pela burguesia na sua luta contra a ordem cristã-feudal que em termos filosóficos tem seu ponto mais alto no materialismo de Ludwig Feuerbach com A essência do cristianismo. Aponta que devemos apresentar a crítica ao Estado diferenciando analiticamente entre Estado e Estado cristão, um Estado burguês “puro”, como seria o francês, do Estado Cristão, o alemão, que reproduz as relações sociais burguesas, mas que não é independente da religião.

A burguesia revolucionária francesa critica a religião, mas não faz a crítica da política nem de seu Estado. O objetivo de Marx é transformar a crítica do céu em crítica da terra, a crítica da religião em crítica do Estado e a crítica da teologia em crítica da política. Sobre as primeiras aproximações de Marx a sua concepção sobre o Estado sugerimos este artigo
Mas esta crítica da filosofia do direito não é uma crítica interna, só filosófica, mas que só se propõe tarefas que podem ser resolvidas pela atividade prática. Isto podemos vincular com as Teses sobre Feuerbach (1845), onde depois de criticar tanto o idealismo, que entende que é a atividade intelectual que cria a realidade como o materialismo empirista mecanicista que narra os fatos como eles se apresentam de modo imediato, diferenciando este do materialismo histórico-dialético.

Na Tese XI sobre Feuerbach Marx apresenta a filosofia da práxis, “Os filósofos têm apenas interpretado o mundo de maneiras diferentes; a questão, porém, é transformá-lo”, uma tarefa que está por fora da própria filosofia. Bem como afirma na Ideologia Alemã (1845) – as ideias dominantes de uma época são as ideias da classe dominante – é justamente uma práxis revolucionária o que muda as consciências e transforma a realidade, a prática como prova da verdade. Justamente nesta práxis aparece a uma primeira importância da política é a prática política a que muda a realidade, mas essa prática política não pode ser já realizada por um sujeito burguês-liberal a partir da categoria individuo senão por um sujeito político coletivo, a classe trabalhadora. Essa mudança na unidade de análise que passa do individuo a classe, é uma mudança epistemológica, em termos de critica a filosofia da ciência dominante, mas também é política.

Esse sujeito da ação política aparece na mesma Introdução, onde despois continuar com a crítica a concepção de Estado de Hegel, o maior filósofo da burguesia enquanto esta era ainda uma classe revolucionária, o teórico do Estado Ético, que entendia que o homem só poderia ser livre no Estado, ao qual Marx opõe que esse Estado é uma instituição de dominação de classe e também a esfera da alienação, a negação da liberdade. Este sujeito o proletariado tem sua possibilidade de emancipação do proletariado está na formação de uma classe politicamente consciente de sua missão histórica num terreno que não pode ser o da economia senão da política, “de uma classe da sociedade civil que não seja uma classe da sociedade civil, de um estamento que seja a dissolução de todos os estamentos, de uma esfera universal porque seus sofrimentos são universais, de uma esfera que não possa se emancipar sem emancipar ao conjunto da humanidade, que só pode se redimir redimindo totalmente ao homem”.

A dissolução como classe particular é o proletariado moderno: aqui, aparece o proletariado como sujeito histórico, o que diferenciará o socialismo científico, o comunismo, das diferentes e heterogêneas versões socialistas utópicas. O “descobrimento” do proletariado como classe universal significa um avanço gigantesco que desenvolverá junto com Friedrich Engels no Manifesto do Partido Comunista (1848). O conceito de alienação será trabalhado nos Manuscritos Econômico-Filosóficos (1844) também por Marx, mais ainda sem o conceito de exploração. Sobre isto entendemos que é preciso diferenciar os conceitos, como realizará Marx, e não os opor.
Por fim, no livro A questão judaica (1843) é relevante na sua polêmica com Bruno Bauer a diferenciação conceitual entre emancipação política, defendida por Bauer, com emancipação humana. Bauer entendia que era preciso que o Estado Cristão alemão, um estado religioso, outorgasse os mesmos direitos aos judeus, direitos políticos. Marx expõe os limites da emancipação política mesmo constitucional na França, porque emancipação política numa sociedade dividida em classes continua sendo a expressão da desigualdade social, por isso a luta é pela emancipação humana no marco de uma luta anticapitalista sem exploração. O que destacamos em relação a nosso tema em este texto é que a igualdade de diretos políticos no campo da política, si bem abole a propriedade privada, a abole só nesse campo não no campo econômico onde a classe trabalhadora continua sendo explorada.

Será no Manifesto do Partido Comunista escrito junto com Engels em 1848 que apresentaram sua ideia de que o proletariado se transforma em classe na política e em particular quando se organiza em partido político.

Em 1847, a Liga dos Comunistas solicita a Marx e Engels a elaboração de um programa do partido, tanto teórico como político, para explicitar os conteúdos do comunismo pela própria voz dos comunistas, que já tinha que ser reconhecido pelos seus detratores como força política na Europa. O Manifesto do Partido Comunista será publicado em 1848 e terá como objetivo guiar o proletariado na luta de classes que entre 1848-1850 que se realiza na França e na Europa, durante a “Primavera dos Povos”.

O central é que o programa apresenta pela primeira vez a necessidade da independência política da classe trabalhadora. Até 1848 os proletários lutavam junto a burguesia contra os elementos da ordem cristã-feudal ainda existentes na Europa, a partir de 1848 os trabalhadores deixam de lutar contra os inimigos de seus inimigos para lutar contra seus verdadeiros inimigos: a burguesia.
Na primeira parte do Manifesto: “burgueses e proletários” depois de haver exposto a necessidade da independência política, os revolucionários explicaram por que o proletariado é a verdadeira classe revolucionária frente a burguesia e como toda luta de classes é uma luta política, no sentido de construção de relações de força contra o Estado. No plano econômico a organização política do proletariado em classe é destruída pela própria concorrência entre os operários para vender sua força de trabalho, mas sempre renasce com mais força no plano da política, colocando como sinônimos organização do proletariado em classe como partido político revolucionário.

A diferença de todas as revoluções anteriores, como as burguesas que foram revoluções de minorias em benefício de minorias a revolução proletária tem a caraterística de ser a primeira revolução de maiorias em benefício das maiorias. A sociedade burguesa esta numa guerra civil permanente mais o menos oculta até que explode uma revolução aberta, onde os trabalhadores devem tomar o poder política e a partir da destruição do Estado burguês impor sua própria dominação política, isso necessariamente de forma violenta.

Num conjunto de artigos enviados ao New York Tribune, e que são publicados com o título O 18 Brumario de Luis Bonaparte (1852) onde Marx realiza uma excelente análise histórico-política e do processo político que acabou no golpe de Luís Bonaparte. Destacamos principalmente a relação entre interesses materiais e conflitos, a existência de classes e frações de classe e que existe uma interação dialética entre economia e política, que os partidos políticos representam os interesses das classes e suas frações. Isto significa que a construção de um partido político pela classe operária, mantendo a independência política tem relação com seu conteúdo de classe. Sobre o impacto da luta de classe na concepção de Estado em Marx sugerimos leitura deste artigo de Gonzalo A. Rojas e André Acier

Do ponto de vista da luta pela organização política da classe trabalhadora Marx é um dos fundadores em 28 de setembro de 1864 em Londres, da Primeira Internacional. Si bem é uma internacional de composição heterogenea, Marx consegue impor seus pontos de vista inicialmente junto com os adeptos das Trade Unions (TU), sindicalistas, como os seguidores do anarquista francês, Pierre-Joseph Proudhon sobre os apoiadores pelos seguidores de Robert Owen, socialista utópico inglês, ou de Giuseppe Mazzini, um republicano nacionalista radical, líder da Jovem Itália (JI). A ideia de formar uma Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT) foi aprovada por unanimidade e apresentada de uma forma aceitável para os partidários das Trade Unions (TU) e os proudhonianos.

No seu preâmbulo considera a independencia política, que a emancipação da classe trabalhadora deve ser obra da própria classe trabalhadora, como já fosse apresentado por Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista, e que isso não expressa a prerrogativa de ter um privilégio de classe, mas o aniquilamento de qualquer domínio de classe.

Nos dois Primeiros Congressos a disputa no interior da AIT se expressa entre Marx e os anarquistas Proudhonistas da delegação francesa e posteriormente também o anarquista Bakunin.
No II Congresso em particular realizado em Lausanne, Suíça, em 1867, tem uma discussão política central: a necessidade ou não da luta política para a classe trabalhadora, defendida por Marx e rejeitada pelos anarquistas. Triunfa a posição de Marx e a AIT declara que as ações políticas têm que ter como objetivo a abolição dos exércitos armados e manter a paz para conseguir a emancipação da classe trabalhadora do jugo do capital. Algumas apreciações sobre a Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT) foram tiradas do capitulo 1 da dissertação de Shimenny Wanderley intitulada: O parlamentarismo revolucionário como proposta transicional: uma análise do caso do Partido de los Trabajadores Socialistas na Argentina.

Na Mensagem da Associação Internacional dos Trabalhadores, em A Guerra Civil na França de 1871, Marx analisa a Comuna de Paris, no marco da guerra franco-prussiana, a primeira experiência de tomada do poder político pelo proletariado, tanto conceitualmente opondo formas de Estado vinculadas a seus regimes políticos que remetem à regimes sociais diferentes como o Império e a Comuna, por exemplos, sendo a Comuna a antítese do Império, assim como suas propostas políticas que podem ser consideradas transicionais. Para destacar a importância que a política e luta de classes tinha para Marx, frente a visões economicistas como as estalinistas e reformistas, Marx para de escrever O Capital para se dedicar a escrever sobre a conjuntura política francesa.

Entre as propostas políticas da Comuna defendidas por Marx destacamos como exemplo: a dissolução do exército permanente e da polícia burguesa, que todo funcionário público recebesse o mesmo salário que um operário qualificado e que os juízes fossem eleitos e revogáveis. Tais medidas visavam abolir toda a casta privilegiada; pretendia-se a redução da jornada de trabalho, bem como a autogestão operária nas fábricas, entre outras. Marx desenvolveu a teoria de que todo Estado é produto da divisão em classes da sociedade; se há classes, há Estado, uma forma de organização política.

A partir da Comuna de Paris, identificará a ditadura do proletariado com a forma política da Comuna. Importante lição da Comuna apresentada por Marx é que não é possível simplesmente apossar-se do Estado burguês e colocá-lo para funcionar em benefício da classe trabalhadora. Marx defende a destruição do Estado burguês e sua substituição por uma nova forma de organização política, posto que depois de uma revolução não desaparecem automaticamente as classes.

Dito isto, é primordial diferenciarmos aparelho de Estado de suas formas políticas, o aparelho de Estado depende do regime social, mas pode ter uma variedade de formas políticas. Nos referimos ao sentido dado por Lenin no final do capítulo II do Estado e a Revolução:

“A transição do capitalismo para o comunismo, está claro, não pode deixar de dar enorme profusão e variedade de formas políticas, mas sua essência será inevitavelmente uma só: a ditadura do proletariado”

Uma das conclusões tanto de Marx, como de Engels, Lenin e Trotsky sobre a derrota da Comuna de Paris é que a ausência de partido revolucionário com uma estratégia revolucionária foi um dos elementos centrais e que não e possível construir o partido revolucionário no momento da crise revolucionária por isso a importância de toda uma ação política de construção anterior.

Esse período de transição, que na Crítica ao Programa de Gotha, escrito entre abril e maio de 1875 e onde polemiza com as ideias dos partidários de Ferdinand Lasalle, é denominado como primeira fase do comunismo ou socialismo. Essa nova forma de organização estatal – a “ditadura do proletariado”, que significa a máxima democracia para a imensa maioria da população – que tem como objetivo ir definhando na medida em que desaparecerem as classes. Como mencionamos mais acima neste mesmo artigo, pela primeira vez na história da humanidade que a maioria domina sobre a minoria. A preocupação de Marx de interver na luta política nesse processo de unificação dos dois partidos socialistas que estavam divididos na Alemanha e mais um indicador da importância que dava a política.

A necessidade da luta teórica e política pela independência da classe trabalhadora, dos patrões, dos governos e do Estado, se organizando em partido revolucionário para sua intervenção na luta de classes, na perspectiva da luta pelo poder político do Estado para destruir o Estado burguês, instaurar uma ditadura do proletariado como fase de transição necessária à sociedade sem classes, nem Estado.

205 anos depois do revolucionário de Trier é necessário recuperar comunismo como projeto político revolucionário, depois de décadas de usurpação stalinista do conceito e ofensivas neoliberais.


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