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INTERNACIONAL | 3 chaves para entender os protestos na França

Contrarreforma trabalhista do governo de Hollande. Rechaço de 70 % da população. Amplo movimento juvenil nas ruas. 120 convocatórias no país. Sindicatos convocam paralisação nacional para 31/03.

sexta-feira 11 de março de 2016 | 00:00

1- Querem aplicar uma Reforma Trabalhista que ataca os trabalhadores

O Projeto de reforma da lei do trabalho ou "lei El Khomri" (pelo nome da Ministra do Trabalho Myriam El Khomri) foi apresentado pelo governo de François Hollande do Partido Socialista (PS). É uma reforma que aplica um duro golpe nos direitos trabalhistas. Atende à maioria das reivindicações das patronais, que querem imitar o modelo trabalhista da Alemanha, Itália ou Espanha, com maior flexibilidade e precarização.

A reforma Komri ataca quais direitos?

  •  Aumento da jornada trabalhista de 10 a 12 horas.
  •  Redução das indenizações por demissão improcedente.
  •  As empresas poderão demitir ou suspender se justificam mediante Expedientes de Regulação de Emprego (ERE) suas “perdas”.
  •  Redução dos salários e do complemento das horas extras por decisão unilateral da empresa (sem a intervenção dos sindicatos nem do estado) em caso de reestruturações, abertura de novos mercados ou “causas excepcionais”.
  •  Aumento da jornada dos aprendizes menores de idade até 40 horas semanais e 10 horas por dia. Fim do piso de 24 horas semanais para o contrato por tempo parcial.
  •  Descentraliza a negociação coletiva ao nível da empresa. Faz prevalecerem os acordos por empresa sobre o convênio coletivo por ramo econômico.
  •  Demissões coletivas que o projeto de lei contempla por “queda em pedidos ou cifra de negócios”, “mudanças tecnológicas” ou “reorganizações para manter a competitividade”.

    Ainda que mantém formalmente a lei da jornada trabalhista de 35 horas por semana, “a explode pela via dos fatos”, como diz o jornal El País (25/02).

    O presidente François Hollande afirma que a reforma flexibilizará a contratação, quando o certo é que possibilita a demissão livre e outorga poder aos empresários sobre sindicatos e convênios coletivos. Segundo o Ministro do Interior, frente ao estancamento da economia, a reforma melhorará a competitividade das empresas. O desemprego na França já alcança 10,5% da força de trabalho, e o dobro na juventude.

    “É um retorno de cem anos”, “é a França de ‘A taberna’ e de ‘Germinal’ (obras de Émile Zola)” se diz em alguns meios de comunicação. A contrarreforma foi qualificada pelo inspetor de trabalho e membro da ala esquerda do PS, Gerard Filoche, como “a mais importante contrarrevolução em um século”. Entre os principais setores que a apoiam está a associação de grandes empresas MEDEF, além da direita.

    2- Rechaço social e convocação foram amplos

    Segundo pesquisas, 70 % das pessoas rechaça a reforma. Uma petição de assinaturas no site “change.org” já superou 1.209.000 assinaturas. A plataforma propõe uma greve geral “por uma convergência da luta dos assalariados, precários, desempregados, aposentados, de todas as pessoas que sobrevivem com o mínimo”. Vídeo-artistas lançaram uma campanha chamada #OnVautMieuxQueCa (Valemos Mais Que Isso) que teve ampla repercussão nas redes sociais.

    O amplo rechaço se transformou na ação de dezenas de organizações juvenis às quais foram se somando os sindicatos e centrais sindicais mais importantes do país.

    CGT Jeunes, Solidaires Etudiant-e-s, UNEF, FIDL, SGL, UNL, DIDF Jeunes, Génération Précaire, JOC, Maison des Potes, MRJC, OLF, Sos Racisme, AL, Ensemble, Jeunes Ecologistes, Jeunes Socialistes, Mouvement des Jeunes Communistes, ND Campus, NPA Jeune, Réseau jeune du Parti de Gauche, UEC são algumas das organizações que assinam um chamado à mobilização.

    No comunicado público se diz: “Por meio do projeto da Lei do Trabalho, o governo desencadeou uma ofensiva sem precedentes contra a juventude e os trabalhadores. Com esta reforma, nós, estudantes secundaristas, universitários, jovens, que já temos condições precárias em nossa educação e para nossas possibilidades de conseguir trabalho, agora deveríamos aceitar seguir sendo precários por toda vida.” E denunciam o projeto de “trabalhar mais para ganhar menos”. Em seu comunicado destacam que 25% dos jovens está desempregado na França.

    Como assinalamos na rede internacional de que faz parte o Esquerda Diário, foram realizadas numerosas assembleias em universidades e escolas preparatórias. “Massificação, coordenação e convergência” começa a ser a consigna da juventude. O Sindicato Nacional de Ferroviários (SNFC) convocou a greve no setor, somando-se, assim, às manifestações. Muitos assinalam que é um clima que lembra as mobilizações do ano de 2006 da juventude contra o Contrato de Primeiro Emprego.

    Isto pressionou as principais centrais sindicais do país a rechaçar o projeto. No entanto, elas exigem mudanças radicais e não a retirada do projeto. Depois de uma reunião na segunda-feira (7) com o governo, convocaram a Paralisação Nacional para 31 de março.

    3- O governo “socialista” de Hollande tenta atacar os sindicatos

    Assinala o jornal El País: “A batalha não fez mais que começar, mas conta com todos os condicionantes para ser a maior do mandato de cinco anos de Hollande, a que mais consequências terá para o socialismo francês, para a disputa entre socialdemocratas e social-liberais e para o futuro do presidente e do primeiro-ministro.” (El País. 07/03)

    O projeto, que busca flexibilizar as formas de contratação e demissão, retirar direitos individuais e acabar com direitos coletivos dos sindicatos, outorgando amplo poder às empresas, representa o projeto mais polêmico do mandato de François Hollande. Para a grande patronal MEDEF que apoia o projeto, este “vai em boa direção”.

    Frente a uma onda de denúncia social, o primeiro-ministro Manuel Valls, adiou a apresentação frente ao Conselho de Ministros no dia 24 de março para “voltar a trabalhar” sobre o texto. Assim, o governo teve que retroceder depois que inicialmente tinha previsto sua apresentação para dia 9 de março, o que mostra a força que pode alcançar o descontentamento com a reforma, mostrando o temor a que se possa transformar em uma grande luta da juventude e dos trabalhadores.

    No próprio Partido Socialista começam a se abrir as primeiras fissuras de rechaço a uma reforma que, questionam, não se atreveu nem sequer o anterior governo direitista de Nicolás Sarkozy.

    Tudo parece indicar que a França se aproxima de um novo clima de mobilizações.




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