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Privatização da Compesa em Pernambuco | Água é vida, mas quanto vale?

Nesta semana o secretário de Recursos Hídricos e Saneamento de Pernambuco do governo de Raquel Lyra (PSDB), Almir Cirilo, afirmou durante entrevista à Rádio Jornal de Caruaru, que a governadora está estudando projetos de privatização da Companhia Pernambucana de Saneamento, a Compesa.

Cristina SantosRecife | @crisantosss

domingo 23 de abril de 2023 | Edição do dia

Fonte Imagem: Jornal do Comércio / UOL

Aqueles serviços porcamente prestados pelo estado, estariam melhores se fossem colocados em mãos de empresas privadas? Se a lógica empresarial é o lucro, como isso seria possível?

Dentro da lógica neoliberal, o Estado precisa ser mínimo, com seus serviços (à exceção do que eles chamam de “segurança pública”, por que será né?) todos transferidos pela esfera privada. Segundo os especialistas neoliberais de plantão, um estado enxuto promove o combate à corrupção e uma “gestão eficiente” dos recursos.

Talvez lá no começo dos anos 90, alguém caísse nessa ladainha, mas após a experiência de privatizações como da Telebrás, Eletropaulo e Vale do Rio Doce, fica mais difícil convencer desse conto. A concorrência que tanto promoveria serviços de qualidade comprovadamente desembocou em grandes monopólios dos serviços de comunicação, a eletricidade é cada vez mais cara e inacessível, no último inverno tivemos inclusive um caso onde uma família inteira morreu carbonizada ao tentar se aquecer utilizando uma fogueira dentro de casa por conta dos valores da conta de luz; e a Vale do Rio Doce acumula tragédias humanas e ambientais de danos irreparáveis como de Mariana e Brumadinho. Quando o elemento principal é o lucro, a vida se torna um ativo de mercado, seja como mão de obra barata, seja como consumidores de péssimos serviços, seja como vítimas de tragédias totalmente evitáveis.

Aqui em Pernambuco atualmente existe um grande projeto de privatização dos serviços do Estado: do Metrô de Recife (pelo governo estadual, mas com o aval do governo federal de frente ampla de Lula, que manteve a CBTU dentro do programa de concessões públicas), de centros desportivos como o Geraldão pela prefeitura de João Campos (PSB) e a Companhia Pernambucana de Saneamento, a Compesa, pelo governo Lyra.

O problema do saneamento talvez seja o mais ilustrativo para mostrar a irracionalidade da relação entre privatização e acesso à recursos essenciais para a maioria da população.

Pegando o exemplo de Recife, estamos em uma cidade de abundantes recursos hídricos, cortada por rios por todos os lados, são 5: Capibaribe, Beberibe, Jordão, Pina e Tejipió. Quanto ao abastecimento, segundo dados de 2019 do Sistema Nacional de Informações Sobre Saneamento (SNIS), o município conta com 89,3% da população com acesso à água potável. Em relação ao acesso ao esgoto, menos de 44% tem acesso e desse total, menos de 75% é efetivamente tratado. A expressiva quantidade de recifenses sem acesso ao esgoto tratado desemboca em outro problema: a exposição contínua à doenças transmitidas por ratos e mosquitos ou pela mesma contaminação da água nos tantos pontos de vazamentos que colocam a cidade no ranking das que têm maiores perdas.

Em alguns bairros na periferia da cidade, como o Fundão, a irracionalidade é escancarada: parte do bairro fica literalmente colado a um dos principais reservatórios da Compesa, e em meados de 2022 a população chegou a ficar quase um mês inteiro sem uma gota de água na torneira. Infelizmente, situações como essa são recorrentes e atingem distintos bairros, mesmo aqueles que se encontram nos arredores dos reservatórios.

Longe de um problema que vai ser respondido com a entrega da empresa pública nas mãos de empresários sedentos por lucro, o problema do saneamento exige uma mirada desde os que realmente entendem do serviço, os trabalhadores, e daqueles que entendem da demanda, a população. Inclusive, no marco do próprio capitalismo em decadência, se olharmos as cidades do mundo mais “eficientes” em termos de saneamento, como é o caso de cidades como Berlim na Alemanha ou Aarhus na Dinamarca, ambas adotam a gestão pública dos recursos. Poderíamos nos perguntar por que os capitalistas nacionais e estrangeiros insistem em vender para a periferia do capitalismo soluções mágicas que eles não aplicam em seus países “modelos”, mas a resposta, já sabemos: não são soluções para os problemas reais da maioria do povo pobre e trabalhador, são negócios para seguir enriquecendo os capitalistas no Brasil e no exterior, a custo da saúde e da vida de milhões de seres humanos que seguem sem acesso a um bem essencial como é a água.

Resolver a questão do abastecimento e saneamento em Recife, passa pela garantia de uma Compesa 100% estatal, gerida pelos seus trabalhadores e controlada pela população.
São os trabalhadores da área do saneamento os que têm a real noção das necessidades para a entrega de um serviço de qualidade para a população, assim como é a população quem pode melhor responder onde estão e quais suas maiores demandas pelo serviço de água e esgoto.




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